A Fox precisava de uma série baseada em alguma fábula. Com base nesse raciocínio e nos nomes de Roberto Orci e Alex Kurtzman, famosos por revigorar Star Trek (ainda que o segundo filme tenha uma piores muletas cinematográficas que já vi) e por Fringe, que vieram com a ideia de “repaginar” a famosa – nos EUA – história de Ichabod Crane e a lenda do Cavaleiro Sem Cabeça, tornando-a mais “atual” e “modernosa”, a série recebeu a luz verde. Juntem a isso o showrunner Mark Goffman, que fazia parte do staff de roteiristas da excelente série West Wing e o diretor Len Wiseman de duvidosa fama por dois Anjos da Noite, Die Hard 4.0 e o reboot de O Vingador do Futuro e a fórmula do sucesso está pronta, não?
Não.
Definitivamente não.
Sleepy Hollow começa na Revolução Americana, com Ichabod Crane (Tom Mison) enfrentando um ser de outro mundo que não morre nem quando ele lhe corta a cabeça. As coisas acontecem assim mesmo, do nada, sem nem um pingo de explicação. Mas, como fazer uma série de época custa dinheiro e afasta os espectadores que, aparentemente, não gostam de ver coisas que se passam no passado, a cena, que leva algo como 10 segundos é cortada logo depois de vermos Crane ser mortalmente ferido. Quando o vemos novamente, ele está acordando em uma caverna, nos dia de hoje, ainda na cidadezinha de Sleepy Hollow. Bem conveniente, não?
Mas o Cavaleiro Sem Cabeça acorda também e começa a, bem, cortar cabeças, para desespero da policial Abbie Mills, que está a duas semanas de se mandar de lá para ir para o FBI. No entanto, seu mentor, o xerife August Corbin perde sua cabeça enfrentando o vilão e ela é obrigada a lidar com um Ichabod Crane que todo mundo acha que é doido (quem não acharia, não é mesmo?). Aliás, a escalação de Clancy Brown para aparecer no piloto por alguns minutos somente para ser degolado é o ponto alto da série. Afinal, ele viveu o vilão Kurgan no já clássico Highlander de 1986, cuja principal característica, como todos sabem, é uma certa quantidade de cabeças rolando…
Bem, a dupla Crane e Abbie começa uma interação que é até engraçada no começo, com Orci e Kurtzman fazendo de tudo para Crane, deslocado no tempo, soltar as maiores atrocidades, mas tudo com muita educação, especialmente quando ele fica surpreso por uma mulher e ainda por cima negra, ter sido aceita na polícia. As piadas funcionam até cansarem o espectador, algo que ocorre depois de 15 minutos de fita. O que resta são tramas e subtramas envolvendo feitiçaria para complicar o suficiente a narrativa para justificar ao menos uma temporada de degolas.
Len Wiseman consegue manter um clima de “cidade mal-assombrada” na série, mas tudo soa e parece muito derivativo, do tipo “já vi isso, já vi aquilo”. E o vilão descabeçado é, pela falta de uma palavra melhor, absolutamente ridículo. E mais ridículo ainda é a explicação apocalíptica para sua existência, explicação essa que, tenho certeza, terá camadas e mais camadas de complexidade que servirão para dar uma tentativa de estofo à história.
Sleepy Hollow seria bem interessante, talvez, como uma minissérie. Já como uma série regular e de TV aberta ainda por cima, ela perde todo o vapor já nesse primeiro episódio, pouco aguçando a curiosidade. Nem mesmo as atuações competentes da dupla principal segura a atenção, pois os personagens são básicos: o herói perdido e a heroína incrédula. Se era uma fábula que a Fox queria, poderiam ter escolhido ao menos uma que parecesse menos um típico filme de dupla disfuncional de policiais parceiros e mais alguma coisa com um significado maior, mais amplo do que corpos sem cabeça matando pessoas com machados em chamas.
Sleepy Hollow: 1X01 – Piloto (EUA, 2013)
Showrunner: Mark Goffman
Roteiro: Alex Kurtzman, Roberto Orci
Direção: Len Wiseman
Elenco: Nicole Beharie, Tom Mison, Orlando Jones, Katia Winter, Lyndie Greenwood, Lemuel Heida, John Cho
Duração: 42 min.