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Crítica | Doctor Who – 7ª Temporada (2012/2013)

por Ritter Fan
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Quando comecei a assistir a 7ª Temporada para preparar essa crítica, fiquei incomodado com a estrutura episódica imposta pelo showrunner Steven Moffat. Afinal, tinha alguma coisa errada no que aprendi a esperar do trabalho dele, considerando as e Temporadas, que formaram, juntas, um grande arco narrativo, além de introduzir mais do que organicamente a companion Amy Pond.

No entanto, como vimos no episódio The God Complex, da temporada anterior, o Doutor decidiu não mais ter os Ponds ao seu lado, por considerar que os está expondo ao perigo. Essa desculpa soou um pouco esfarrapada, considerando o passado dos outros companions do Doutor, mas vamos por um momento fingir que a aceitamos sem maiores complicações.

O problema é que Moffat, na 7ª Temporada, faz, na verdade, duas meias temporadas. Os primeiros cinco episódios funcionam de maneira estanque para resolver a questão dos Ponds e os oito finais, com tons sombrios, apresentam uma nova companion e uma nova saga para o Doutor. Com isso, pela primeira vez, uma temporada de Doctor Who foi literalmente quebrada em duas e televisionada em anos diferentes (2012 e 2013) e o especial de Natal, já tradicional, não só foi deslocado para o meio das “semi-temporadas”, como passou a fazer parte integrante da narrativa da segunda parte, tornando-o nada menos do que um episódio mais longo.

Com essas mudanças todas, assim, estava preparado para destruir a temporada em minha crítica.

Mas foi impossível.

Tão impossível quanto a impossible girl. Talvez mais até.

A conclusão que chego é que Steven Moffat – que muitos fãs não gostam – é um cara extremamente ousado e corajoso. Ele não faz aquilo que esperamos e sim aquilo que ele acha que pode funcionar, mesmo errando aqui e ali. Quer uma temporada inteira? Tome duas metades! Adorou Amy Pond e Rory Williams? Pode dar tchau aos dois. Não acha que o futuro do Doutor pode ser mais tenebroso do que já vimos? Melhor repensar tudo o que você viu sobre o último sobrevivente de Gallifrey. Uma coisa não tem ligação com a outra? Espere só para ver.

Assim, para facilitar o entendimento e, imitando Moffat, dividi essa crítica em dois momentos (ou três…):

Parte 1: Como se livrar de companions queridos e, de quebra, introduzir uma nova narrativa.

O primeiro episódio da temporada – Asylum of the Daleks – é, de certa forma, extremamente nostálgico, pois Moffat nos arremessa para o planeta natal dos Daleks, Skaro, onde o Doutor (Matt Smith) tem que descobrir o que vem apavorando tanto seus maiores inimigos. Descobrimos, também, que Amy (Karen Gillan) e Rory (Arthur Darvill) estão com seu casamento estremecido. O que parece ter acontecido é que uma nave caiu no planeta e uma jovem chamada Oswin Oswald vem fazendo transmissões que saem do coração do sanatório dos Daleks, onde exemplares da raça de saleiros gigantes estão internados por terem sofrido irreversivelmente os horrores das guerras e das lutas contra o Doutor.

Ao mesmo tempo que Moffat faz um desfile de todo o tipo de Dalek que já apareceu na série em seus 50 anos de vida, começando com os horrorros Daleks coloridos que ele próprio criou, mas passando pelos clássicos na cor de bronze até os primeiros, lá do longínquo ano de 1963, ele não nos deixa esquecer sobre a Time War, a tal guerra que dizimou tanto os Daleks quanto os Time Lords, graças às ações – criminosas? – do Doutor.

Mas aí o episódio acaba. O Doutor descobre quem na verdade é Oswin Oswald, que morre tragicamente dizendo Run, you clever boy… And Remember e os Ponds fazem as pazes. Nenhuma consequência para a linha temporal do Doutor, certo?

Certo?

(inserir, aqui, risada maquiavélica de Moffat)

Deixando em banho-maria, pelo momento, a situação acima, os três episódios seguintes – Dinosaurs on a Spaceship, A Town Called Mercy e The Power of Three – são completamente desamarrados da continuidade e têm Amy e Rory como coadjuvantes de luxo, considerando, na verdade, que eles têm intervalos temporais enormes no que se refere à linha temporal dos dois. Isso significa que o Doutor vem passeando por aí e só em casos específicos arregimenta a ajuda dos companions.

No primeiro, que literalmente trata de dinossauros em uma espaçonave, 10 meses se passaram desde Asylum of the Daleks quando o Doutor reaparece para chamar seus companions. Só que, por um erro de cálculo, além de Amy e Rory, o Doutor traga para sua aventura o pai Rory, Brian (Mark Williams). Juntamente com ele, vemos ninguém menos do que a Rainha Nefertiti (Riann Steele) e o explorador John Riddell (Rupert Graves) como outros dois companions, totalizando cinco no final das contas. Um certo exagero, mas que acaba funcionando bem em um episódio que coloca o Doutor contra um mercador inescrupuloso em uma arca espacial Siluriana.

A Town Called Mercy se passa no velho oeste e o Doutor e seus companions (só Amy e Rory, dessa vez) têm que lidar com um pistoleiro androide que quer se vingar das atrocidades cometidas com ele e seus colegas. O bacana do episódio é o cuidado da produção com construção do cenário, que emula de forma muito convincente uma cidadezinha perdida no meio-oeste americano.

Finalmente, em The Power of the Three, Chris Chibnall, o roteirista, inverte o ponto de vista narrativo e conta a história de uma invasão alienígena (a chamada slow invasion ou “invasão lenta”) sob o ponto de vista de Amy e Rory, para tratar, assim, da relação de interdependência deles com o Doutor, sem deixar de dar leves alfinetadas na sana consumista de novidades que hoje nos abate. A invasão em si é completamente inconsequente e desimportante, ainda que original e crítica de nossa sociedade. O foco é efetivamente na relação dos três – vide o título – e a decisão dos companions em finalmente embarcarem de olhos fechados na vida do Doutor. No entanto, qualquer um acostumado com a série sabe que esse tipo de episódio deixa um gosto amargo na boca, pois ele é claramente a proverbial “calma antes da tempestade”.

E, de fato, a tempestade vem logo em seguida, no fatídico The Angels Take Manhattan em que temos de volta os Weeping Angels, talvez a melhor criação de Moffat, ainda na Era Russell T. Davies, e River Song em uma aventura noir na Nova Iorque dos anos 30. É aquela coisa: se tem River Song, quer dizer que o episódio é importante e que, provavelmente, não acabará bem.

Pervertendo novamente o conceito genial dos Weeping Angels, Moffat cria uma trama fortemente calcada em viagem no tempo e paradoxos temporais que, ainda que funcione em sua maior parte, tem as partes melhor do que o seu todo. O grande problema do episódio é que não esperamos por ele. Se Moffat se notabilizou por alguma coisa, foi criar tramas amarradas cuja silhueta vemos desde o primeiro episódio da temporada, mesmo que não a entendamos. The Angels Take Manhattan parece ter como único e exclusivo objetivo retirar Amy e Rory da vida do 11º Doutor e isso é estranho, já que ambos entraram tão organicamente na série que o natural seria vê-los sair da mesma maneira.

Mas Moffat – talvez aí fazendo justamente o que não esperamos de propósito – arranca tragicamente os companions do convívio do Doutor, ajudando a despedaçar seus dois corações e todos os nossos no processo. É o fim de uma era que durou duas temporadas e meia.

E eu não via como Moffat poderia reerguer seu trabalho. The Angels Take Manhattan, para mim, significava que o showrunner havia perdido a mão.

Interlúdio: Winter is coming.

Eu sabia que The Snowmen, o especial de Natal que, pela primeira vez, dividiu as duas metades de uma temporada de Doctor Who não seria nada mais do que 60 minutos de uma trama completamente separada, sem maiores consequências para o Doutor.

E foi isso mesmo que eu vi: mais um episódio de Natal bonitinho, eficiente, mas que não me diria nada. O futuro, porém, provaria o quanto eu estava errado.

Em Londres, em 1893, o Doutor vive nas nuvens – literalmente – com sua TARDIS estacionada no topo de uma escada espiral invisível. A perda de Amy e Rory o fizeram aposentar a chave de fenda sônica e nada o faz voltar ao trabalho. Nem mesmo as constantes súplicas da inusitada dupla de detetives Madame Vastra (Neve McIntosh), uma siluriana lésbica casada com Jenny Flint (Catrin Stewart), uma humana, além do “faz-tudo” delas, o esquisito e beligerante Strax (Dan Starkey), um membro da raça clone dos Sontaran. Os três (oriundos do episódio A Good Man Goes to War, da 6ª Temporada) aparecem em dois prelúdios do especial de Natal fazendo de tudo para atrair o Doutor de volta, mas sem sucesso.

No entanto, o fortuito encontro do Doutor com uma garçonete chamada Clara (Jenna-Louise Coleman) e o aparecimento de um sinistro boneco de neve logo em seguida, acaba fazendo com que a moça não desgrude mais do Doutor até que ela é interrogada por Vastra e, uma palavra que ela diz – pond – reativa o interesse do Doutor pelo mundo. O que se segue, a partir daí, é o surgimento do Great Intelligence, um vilão não-corpóreo com a voz de Galdalf, digo Ian McKellen, e uma resolução trágica novamente. O Doutor acabara de perder os Ponds e, agora, Clara.

O que raios Moffat estava pensando? Não se mata ninguém no Natal!

Parte 2: Como Moffat me enganou e, no processo, me fez respeitá-lo profundamente.

Ainda sem entender o que diabos havia acontecido, assisti ao primeiro episódio da segunda metade da 7ª Temporada em que o Doutor, juntamente com Clara, enfrenta uma ameaça escondida nas redes wi-fi do mundo. Além do capítulo ser uma excelente crítica ao nosso vício por conectividade, ele é um total mind fuck. Afinal de contas, Clara não acabou de morrer? Como ela está aqui novamente? O que está acontecendo? – meu cérebro perguntou aos berros.

A “garota impossível” como o Doutor a chama, é mesmo Clara. Mas é a mesma Clara?

E, no meio do turbilhão de perguntas, essa Clara usa como forma de lembrar a senha da rede wi-fi (RYCBAR) a seguinte frase: “Run you clever boy, and remember”. E, nesse momento, meu mundo começou a andar em câmera lenta.

Ela não só é a mesma Clara (será que é?) de The Snowmen, como ela é a mesma jovem que vemos se sacrificar lá atrás, em Asylum of the Daleks. A garota do suflê, a garota impossível. Ah, Steven Moffat, você é um sacana.

Um sacana FANTÁSTICO.

Por duas vezes, ele conseguiu inserir uma companion organicamente em Doctor Who. E, dessa vez, ele tem um ás na manga, algo completamente sem precedentes que ele usa em The Name of the Doctor, o fechamento da temporada. Mas eu chego lá!

O Doutor compartilha de nossa dúvida sobre quem é Clara. Como exatamente ela é possível. Essa dúvida permanece em The Rings of Akhaten, em que Clara se mostra como essencial para a vida do Doutor, ao arriscar tudo para salvá-lo (guardaram bem essa frase: “arriscar tudo para salvá-lo”?) de um “deus” engolidor de histórias de vida.

A dúvida deixa de ser tão saliente no excelente The Cold War, em que o Doutor e Clara se materializam dentro de um submarino nuclear russo em plena Guerra Fria. Moffat desenterra, pela primeira vez na Nova Série, um representante da raça marciana Ice Warrior, que aparece pela primeira vez em 1967, na era do 2º Doutor. Misturando o conceito de Alien com a tensão criada pela guerra fria, que ganha dimensões literalmente interplanetárias, Mark Gatiss, o roteirista, faz um dos melhores episódios soltos da temporada.

Mas a dúvida persiste e volta em Hide, o 9º episódio, em que o Doutor e Clara, juntamente com os “caça-fantasmas” Alec Palmer (Dougray Scott, de Hemlock Grove) e Emma Grayling (Jessica Raine, de Call the Midwife), têm que lidar com um espírito em uma casa extremamente mal-assombrada na década de 70. É claro que a trama – genial, aliás – é resolvida, mas a grande razão para o Doutor ter ido para lá é para ouvir a opinião de Emma (uma sensitiva) sobre quem exatamente é Clara, somente para Clara, inadvertidamente, ouvir o que não quer de Emma sobre o Doutor. A trama se complica…

E continua se complicando quando uma tentativa de salvagem espacial faz com que a TARDIS seja quase que inteiramente destruída com Clara perdida em seu interior, no episódio Journey to the Centre of the TARDIS. Nele, não só finalmente vemos a verdadeira extensão da espaçonave do Doutor, como vemos a piscina que ele tanto menciona em temporadas anteriores. É um episódio claustrofóbico e tenso, em que Clara descobre o maior segredo do Doutor, somente para ter sua mente apagada – será? – ao final.

The Crimson Horror é importante porque é o 100º episódio da Nova Série de Doctor Who e por reintroduzir a Gangue Paternoster (Madame Vastra, Jenny e Strax). Mas, infelizmente, esse capítulo tem uma trama mal escrita e aleatória que não só não impulsiona em nada o arco maior, como não diverte.

O penúltimo episódio da temporada, Nightmare in Silver, reúne Clara às duas crianças que ela cuida – Angie (Eve de Leon Allen) e Artie (Kassius Carely Jonhson) – em uma aventura em um parque de diversões espacial abandonado e infestado de Cybermen. A trama, porém, é apressada e somente serve de prenúncio para o último capítulo, já que o controle mental do Doutor pelo Cyber-Planner faz com que nós, espectadores, revisitemos momentos chaves da série, com diversas encarnações antigas aparecendo e com o 11º Doutor imitando os e 10º Doutores, incluindo suas famosas frases Fantastic! e Allons-y!. Mas nós só descobrimos que é um prenúncio depois de assistir a The Name of the Doctor.

E tudo acaba – ou não, na verdade – no último episódio que reúne Madame Vastra, Jenny, Strax, Clara e River “Episódio Importante” Song em um teleconferência espiritual muito bem bolada, que passa a ser assombrada por seres mascarados e com dentes afiados (os Whisper Men). É a volta da entidade Great Intelligence do especial de Natal, o que dá um perfeito movimento circular à segunda metade da 7ª Temporada.

O episódio, porém, é lúgubre. Tenebroso mesmo. O Doutor e todos os seus amigos vão para o planeta Trenzalore, mencionado pela primeira vez em The Wedding of River Song, da 6ª Temporada: On the fields of Trenzalore, at the fall of the Eleventh, when no living creature can speak falsely or fail to answer a question will be asked—one that must never be answered. And Silence must fall when the question is asked. Sim, é o local onde o Doutor – depois de morto – é enterrado. E sim, a River Song que vemos é a River Song de depois dos eventos de Forest of the Dead, da 4ª Temporada, quando ela morre e tem sua consciência guardada pelo Doutor n’A Biblioteca.

Steven Moffat tinha um plano. E esse plano ia muito além de suas duas primeiras temporadas ou de tudo que escreveu antes. Seu plano era incinerar nossas mentes com constantes reviravoltas e retornos à momentos chave do passado remoto que mal lembrávamos e que, quando lembramos, é como se um choque elétrico passasse por nós.

Assim, promovendo o maior retcon (retroactive continuity, muito comum em quadrinhos, quando histórias posteriores inserem retroativamente eventos em histórias anteriores) da história das artes, o showrunner sinônimo de coragem e ousadia nos revela exatamente quem é a garota impossível e sua importância para o Doutor. E, sem pestanejar, ele ainda consegue acabar o capítulo com um cliffhanger que certamente já entrou para a história whoviana como um dos mais surpreendentes já feitos.

Falar mais é estragar o prazer de ver a temporada. Basta dizer que a narrativa parece longe de acabar e ela continua tanto no curta The Night of the Doctor quanto em The Day of the Doctor. O que começou de forma falha, acabou inacreditavelmente bem.

Moffat, seu garoto esperto, corra e nos conte a história!

Doctor Who – 7ª Temporada (Reino Unido, 2012/2013)
Showrunner: Steven Moffat
Roteiro: Vários
Direção: Vários
Elenco: Matt Smith, Karen Gillan, Arthur Darvill, Alex Kingston, Mark Williams, Jenna-Louise Coleman, Dougray Scott, Neve McIntosh, Jessica Raine, Kassius Carely Jonhson, Ian McKellen, Eve de Leon Allen, Kassius Carely Jonhson, Dan Starkey, Catrin Stewart
Duração: 60 min. (especial de Natal), entre 44 e 47 min. (os demais)

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