Avaliação da temporada
(não é uma média)
- Há spoilers.
Ninguém poderia imaginar que o que Star Wars precisava mesmo era de uma aventura infantil com piratas espaciais protagonizada por quatro crianças, mas Skeleton Crew é exatamente isso, uma espécie de inesperado alívio que retorna às raízes da franquia, despe-se completamente de cronologia e de personagens estabelecidos, foca no lado infantil como um filme oitentista da Amblin de Steven Spielberg e entrega algo que é capaz de agradar com facilidade seu público alvo, mas também os fãs de todas as idades que, claro, não tiverem deixado seus corações ficarem empedernidos pela passagem do tempo ou decepções anteriores. Em breves oito episódios, a série comandada por Jon Watts e Christopher Ford é a fusão perfeita de divertimento com qualidade, seguindo muito a linha de obras como Os Goonies, E.T. – O Extraterrestre, a franquia Indiana Jones e, claro, Star Wars clássico.
Um idílico, mas misterioso planeta protegido por uma barreira esverdeada que o esconde da galáxia é o pontapé para quatro crianças se juntarem depois que uma delas encontra uma nave há muito tempo enterrada em uma ravina e que, claro, uma vez despertada, é lançada ao espaço desconhecido com o jovem grupo, acompanhado do androide pirata SM-33 (uma sigla que referencia o Sr. Smee, de Peter Pan), tendo que se virar sozinho por um tempo, até se depararem com o ainda mais misterioso – e simpaticamente maquiavélico – Jod Na Nawood que, além de pirata, sabe manipular a Força. Temos a relação de mestre e pupilo sendo trabalhada, a sensação constante de descoberta e de deslumbramento a cada novo planeta e a cada nova criatura, de uma desconfiada gata-coruja até um prestativo rebento de Cthulhu que gosta de escutar histórias, passando por um pirata lobisomem grosseiro e gigantescos e esfomeados caranguejos de lixo. Há até um sabre de luz!
Como meu colega de site Davi Lima comentou, Skeleton Crew tinha qualidade suficiente para até mesmo ser um filme da franquia a ser lançado nos cinemas, algo com que tendo a concordar com vigor, ainda que, no mundo cínico em que vivemos atualmente, eu tema que ele acabasse sendo recebido com desdém por boa parte das pessoas que acham que Star Wars é algo exclusivamente definido pelo que eles acham que Star Wars é, virando o rosto para qualquer tentativa de se desviar do padrão. Seja como for, mesmo que a série não seja renovada para uma nova temporada, o que ela proporcionou, pelo menos para mim, mais do que justificou sua existência e reacendeu a vontade de – Andor à parte, claro – continuar, de tempos em tempos, assistindo Star Wars assim, verdadeiramente focado em um público “entrante” na franquia, sem grandes conexões com a mitologia maior que, muito sinceramente, poderia descansar em berço esplêndido por pelo menos mais uma década.
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Como fazemos em toda série ou minissérie que analisamos semanalmente, preparamos nosso tradicional ranking dos episódios para podermos debater com vocês. Qual foi seu preferido? E o que menos gostou? Mandem suas listas e comentários!
8º Lugar:
Não Posso Dizer Que Me Lembro de At Attin
1X04
Apesar de ter gostado de todos os aspectos acima e também do fato de At Achrann ser quase que uma versão de história alternativa sombria de At Attin, um verdadeiro “o que aconteceria se a localização do planeta tivesse sido revelada muito tempo antes” e de ter apontado para a tela como as várias referências visuais da franquia, esse foi o primeiro roteiro que, para mim, pecou na simplificação exagerada da narrativa e na solução por demais conveniente do conflito central. Como minha primeira crítica da série deixou evidente, reconheço e aplaudo o foco da série no público infantil, algo que Star Wars raramente fez de verdade em seu material live-action, mas, até o episódio anterior, essa pegada mostrou-se esperta, alguns degraus acima do paternalismo que obras com esse alvo demográfico costumam exibir, menosprezando a inteligência dos pequenos.
7º Lugar:
Isso Pode Ser uma Aventura de Verdade
1X01
Isso Pode Ser uma Aventura de Verdade começa forte, vistoso, excitante e também reverente à sequência inicial de Guerra nas Estrelas, com um excelente prólogo em que vemos um ataque pirata a uma nave espacial que leva a tripulação corsária a amotinar-se contra seu capitão mascarado depois que apenas um crédito é encontrado dentro do cofre. Esse começo “bem Star Wars tradicional”, porém, logo abre espaço para algo ao mesmo tempo diferente e muito mais prosaico, focado em quatro crianças em um idílico planeta que replica subúrbios e cidades tipicamente americanas. Wim (Ravi Cabot-Conyers) é sonhador, não liga muito para a escola e adora brincar de boneq… digo, figuras de ação, e fingir que é um Jedi com duelos imaginários com seu amigo Neel (Robert Timothy Smith) de uma raça elefantina azul que parece prima da de Max Rebo e que é seu oposto, todo certinho e obediente. Fern (Ryan Kiera Armstrong) e KB (Kyriana Kratter) completam o grupo heterogêneo, a primeira uma motoqueira rebelde e a segunda uma humana de cabelos brancos com um visor (à la Geordi La Forge) ligado a um implante cibernético na nuca (à la Lobot). Apenas com as descrições, vê-se muito claramente e, lógico, propositalmente, ecos misturados de Luke Skywalker, Han Solo, Princesa Leia e até C-3P0 e RD-D2 (além de Bob Falfa, de Loucuras de Verão), o que imediatamente coloca o público mais velho – que assistirá diligentemente a série, tenho certeza – em uma situação de conforto.
6º Lugar:
Muito Interessante, Como um Problema de Astronavegação
1X03
E o que falar de Kh’ymm, “amiga” de Jack? Não só vemos ecos da chegada de Han Solo e companhia em Bespin, sendo recebidos por Lando Calrissian, como aquela coruja-gata (corugata? gatoruja?) é uma deliciosa criação animatrônica com ajuda de CGI que Alia Shawkat imediatamente dá vida com seu excelente trabalho de voz. Toda a sequência em que a vemos enrolar Jack para que as X-Wings cheguem para capturá-lo é como um fascinante mergulho em um microcosmo muito bem vivido, como a franquia Star Wars sempre soube fazer (com algumas exceções, eu sei e lamento), já que seu habitat, por assim dizer, é uma completa bagunça ao mesmo tempo atordoante e perfeitamente compreensível, com o tempo investido por ali sendo utilizado para que os diálogos possam relevar mais sobre At Attin e seu peculiar status de “planeta escondido” que, como já havia ficado mais ou menos claro anteriormente, vive sem contato com o mundo exterior, ainda na época da Velha República. O que isso significa, ainda é muito difícil de conjecturar, mas o que posso dizer é que esse é um mistério que pode até decepcionar quando ele for finalmente revelado, mas que é uma premissa excelente, não tenho dúvidas de que é.
5º Lugar:
Nenhum Amigo De Novo
1X06
A lição de vida, aqui, é bastante clara, mas diria que o roteiro de Myung Joh Wesner foi feliz em desviar-se do didatismo excessivo. Ele está lá, não tenham dúvida, sobretudo nos diálogos entre KB e Wim, mas existe toda uma lógica boa por trás, já que Wim não conhece nada de KB e ele, junto com o espectador, ganha contexto para o passado dela, em que um acidente tornou os implantes necessários e que esses implantes precisam de manutenção constante, algo que conversa muito bem com o fato de KB ser uma particularmente boa mecânica. E, nessa linha narrativa, o “ser diferente” é, então, devidamente discutido e construído, com as duas duplas separadas chegando às mesmas conclusões por caminhos literalmente diferentes. Aos adultos que estiverem rolando os olhos para minha apreciação do que foi feito aqui, lembrem-se: trata-se de uma série infantil, o que faz com que seu público alvo seja formado essencialmente de crianças. Se fossem roteiros do tipo paternalistas, que retiram da criança qualquer chance de ela preencher os espaços em branco, eu seria o primeiro a reclamar, mas não é o caso de Skeleton Crew como um todo, que realmente faz como Os Goonies – sim, aqui estou eu de novo fazendo menção ao clássico oitentista – e costura o “ser criança” em uma narrativa de amadurecimento com viés de pura aventura imaginativa.
4º Lugar:
A Gente Está Muito Encrencado
1X07
A chegada do grupo silencioso em At Attin foi puramente visual, já que o que houve de texto foram breves diálogos entre Jod e os androides de segurança, com a equipe de direção de arte e efeitos visuais criando belas sequências com muita movimentação e muita coisa para observar, desde a forma como a “pista de pouso” é revelada, passando pelos trens de pouso da Onyx Cynder sendo bem presos ao chão e todo o elevador que revela um novo mundo no interior do planeta, mundo esse com riquezas inimagináveis que fazem de Jod um pirata muito, mas muito feliz e, diria, um tantinho quanto ensandecido, algo que aquela sequência em que ele quase faz como o Tio Patinhas e toma um banho de ouro só vem reiterar. Agora é esperar para ver quem é supervisor (será ele o lendário pirata Tak Rennod?), o que afinal são esses planetas escondidos por barreiras e, claro, como será o embate final.
3º Lugar:
Os Verdadeiros Mocinhos
1X08
E a primeira (talvez única) temporada de Skeleton Crew chega ao seu delicioso final exatamente da mesma maneira que começou, ou seja, entregando uma ótima e refrescante aventura infantil no estilo Os Goonies como se a produtora por trás fosse a Amblin de Steven Spielberg como há muitas décadas não se via no lado live-action de Star Wars, provavelmente desde que o segundo telefilme da duologia Caravana da Coragem que, vamos combinar, nem conta de verdade. A criação de Jon Watts e Christopher Ford finalmente faz pelas crianças aquilo que Rogue One: Uma História Star Wars, Star Wars: Os Últimos Jedi e Star Wars: Andor fizeram pelos adultos, mostrando que, nessa sempre expansiva franquia, há espaço para todos os gostos e idades, mesmo que alguns ditos fãs (muitos deles curiosamente da minha geração, o que torna tudo ainda mais hilário) teimem em bater o pé no chão e dizer que só aquilo que está na cabecinha deles pode existir nessa galáxia muito, muito distante.
2º Lugar:
Muito, Muito Além da Barreira
1X02
Eu realmente não esperava o começo promissor de Skeleton Crew e, quando ele veio, fiquei muito feliz, mas também receoso de que o nível cairia muito rapidamente. Mas eis que Muito, Muito Além da Barreira revela-se ainda melhor, com um passo mais aprumado já que não há a necessidade de se introduzir os protagonistas e seu planeta e com mais daquilo que faz de Star Wars a franquia que é, uma sensação de fascinação composta pelos mais variados elementos, como cenários que dão aquela inestimável impressão de serem realmente vividos e uma miríade de personagens criados (e recriados) com o uso de efeitos práticos e muita prótese, além do conforto da familiaridade e de uma pegada “velha guarda”, realmente inspirada, mesmo que a história em si não seja de outro mundo.
1º Lugar:
Vocês Têm Muito o Que Aprender Sobre Piratas
1X05
Depois de um episódio menos do que ideal, mas ainda bom, Skeleton Crew retorna completamente à forma com um episódio que mergulha com ainda mais afinco em sua inspiração em Os Goonies e na franquia Indiana Jones, mais precisamente, aqui, em A Última Cruzada, além de, claro, no clássico literário A Ilha do Tesouro que é uma constante no pano de fundo. É um prazer notar o quanto Jon Watts e Christopher Ford não têm nenhum receio em realmente arregaçar as mangas para criar algo focado no público bem jovem, mas que entrega aquela “alegria de ser criança” também àqueles que há muito passaram desse estágio na vida, lidando com momentos propositalmente bobinhos que servem de aperitivos para abordagens mais sombrias e sérias com o uso da violência bem pensada, que em nenhum momento precisa chegar perto de ser explícita, mas que está lá, bem presente, criando aquela sensação de perigo para os personagens que uma série dessas precisa ter mesmo que dificilmente alguma das crianças será mais do que levemente ferida ao longo dessa jornada de amadurecimento.