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Lista | Os Melhores Filmes de 2024 – Luiz Santiago

Contos substanciais de aprendizado.

por Luiz Santiago
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Foram elegíveis para esta lista, apenas: o que foi OFICIALMENTE lançado nos cinemas brasileiros em 2024; o que foi lançado nos streamings e VODs OFICIALMENTE acessíveis no Brasil em 2024 (ou seja, HBO Max, Hulu e iTunes com conta americana estão fora); o que foi exibido OFICIALMENTE em Festivais brasileiros em 2024 ou filmes de festivais que foram OFICIALMENTE acessível a partir do Brasil.

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Chegou o momento mais aguardado: a hora dos melhores filmes do ano. Compilar uma lista como esta tem se tornado uma experiência cada vez mais curiosa para mim, especialmente porque, à medida que o tempo passa, os critérios que considero importantes vão se transformando, assim como meu olhar sobre o cinema. Este ano, essa mudança ficou particularmente evidente. 2024 foi um presente para nós, em termos de cinema (só isso mesmo, né). Minhas vivências enquanto espectador e crítico foram marcadas por descobertas emocionantes e sessões memoráveis (com uma maldita exceção: a tumultuada exibição de Moana 2, onde a bagunça de seis adolescentes na fileira de trás quase me fez perder o réu primário).

Como sempre, há aquela sensação de que poderia ter explorado mais filmes. Alguns desses, tenho quase certeza, teriam entrado na lista caso eu tivesse conseguido assisti-los. No entanto, o tempo é um recurso finito, e por mais que eu quisesse fabricar algumas horas extras no dia, resta apenas aceitar essa limitação. Baseado nas experiências cinematográficas que vivi em 2024, apresento agora os filmes que, para mim, brilharam mais intensamente. Bons filmes para todos nós!

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10º – Conto de Fadas

Aleksandr Sokúrov | Rússia, Bélgica | 2022

O Conto de Fadas que Sokúrov cria aqui é, na verdade, uma fantasia de caráter filosófico e historiográfico, com afirmações e presenças polêmicas e a determinação de um status social preocupante, de adesão das massas a figuras com mãos de ferro para “colocar ordem nas coisas todas“. Um filme relevante e importante em tudo, com contrastes e provocações que farão muita gente pensar, discordar e assentir a cada pedaço trilhado do Purgatório das ideias que nunca morrem.

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9º – Bruxas

Elizabeth Sankey | Reino Unido | 2024

Elizabeth Sankey entrega uma obra inventiva e corajosa sobre o tema, mesclando arte e autobiografia com precisão histórica, informações médicas e muita emoção. Bruxas é uma convocação para enxergar o poder nas histórias que escolhemos contar (no nosso tempo e espaço), para as mãos que precisamos segurar no meio do caminho e nos laços que construímos enquanto o mundo ao redor julga e condena quem precisa de ajuda.

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8º – Rivais

Luca Guadagnino | EUA | 2024

Ao retomar para a partida de tênis inicial e fazer disso a sequência do seu último ato, Guadagnino brinda em Challengers o ápice da tensão depois de filmar com tanta intencionalidade cada curva do seu trio de protagonistas; seja os músculos tensos de Faist, os pelos espalhados no corpo de O’Connor e toda vez que Zendaya usa um creme hidratante, o cineasta italiano quer se certificar que audiência está com os ânimos a flor da pele. Afinal, o tênis aqui é um relacionamento e sua câmera não foge da provocação, e filma cada momento erótico como uma disputa e cada partida em quadra como uma foda em que os personagens competem por seus desejos e satisfações.

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7º – Anora

Sean Baker | EUA | 2024

Ela tenta encobrir seus sentimentos e traumas através do sexo banal, mas com Igor, isso não é possível, existe uma barreira que ela não consegue ultrapassar. E então é forçada a olhar para dentro e colocar para fora o que estava guardado. Sean Baker deixa para o final a real manifestação da alma da personagem principal, retirando dela o véu do confronto, da força, deixando-a completamente desarmada diante do silêncio honesto, após a perda de uma vida de luxo e a possibilidade do encontro de um verdadeiro parceiro para a vida. Talvez o único momento de honesta realização que Anora teve em muito tempo. Uma realização diante da qual faz todo sentido chorar.

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6º – Harvest

Athina Rachel Tsangari | Reino Unido, Alemanha, Grécia, França, EUA | 2024

A relação dos indivíduos com a terra, de maneira prática ou mesmo espiritual, também se insere no filme, e toda a base cultural é igualmente posta na mira dessa mudança repentina, a começar pela adequação secular de Mestre Kent, deixando suas vestes (do tipo túnica) para adotar a camisa e a calça com babados, como mandava a ordem masculina. Os cânticos, as danças, as máscaras, os saberes e a forma de viver e conviver dos camponeses perdem significado com a chegada do primo empreendedor, o proclamado “herdeiro legítimo” daquelas terras. A colheita, aqui, transforma-se na despedida de uma Era e início de uma nova fase que nunca mais seria barrada. Um cenário que recebe nomes diferentes, justificativas diferentes, mas, a rigor, é dominado pelo mesmo grupo social… em detrimento do mesmo grupo social de sempre.

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5º – A Substância

Coralie Fargeat |EUA – Reino Unido – França | 2024

O que potencializa ainda mais a forma criativa com a qual Fargeat dirige, é a maneira com que Moore e Qualley são filmadas, sendo a primeira um retrato de vulnerabilidade, insatisfação e auto-desprezo, e Qualley representando o olhar hipersexualizado que recebe por atender aos padrões que são impostos pela sociedade – mas ainda traçando uma sátira ao fetichismo do olhar masculinl – e no caminho, desrespeita os próprios limites para manter esse status – o que reflete a geração atual que recorre a inúmeros processos estéticos e Ozempic. Encerrando a genialidade de sua fábula monstruosa moderna, é como se, no final, Fargeat virasse o espelho para o público/sociedade que, depois de acompanhar tudo o que Elizabeth Sparkle, atriz rejeitada pela indústria fez, devolvesse o resultado por toda busca sua busca pela aparência perfeita.

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4º – Memórias de um Caracol

Adam Elliot | Austrália | 2024

A animação abrange um processo de pensamento que está acima da história dos gêmeos, da vida sofrida e da felicidade do encontro que termina por fechar o ciclo de Grace e Gilbert. Estar vivo é estar sujeito a dissabores que não podemos controlar, porque viver, como disse Guimarães Rosa, é muito perigoso. O adestramento e o escape desse perigo é que gerará as inestimáveis bolhas de felicidade nas quais entramos temporariamente, deixando de fora a angústia, a ansiedade e a vontade de morrer, fortalecendo o espírito, o corpo e a mente para a formação de mais um muro, de mais uma casca, de mais uma armadura para uma próxima fase. Um cerco ao entendimento das impermanências da vida que, só assim, conseguimos ver “de fora” e apreciar sua real beleza.

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3º – Eu vi Três Luzes Negras

Santiago Lozano Álvarez | Colômbia, México, França, Alemanha | 2024

Eu Vi Três Luzes Negras nos encanta por sua beleza estética (a fotografia de Juan Velásquez é um verdadeiro espetáculo); pela sua força narrativa — com a questão da terra, do trabalho e das almas em evidência –, e pela mensagem humanista, mística e crítica aos arranjos sociais. É uma obra que nos faz refletir sobre a fragilidade da vida e a importância de encontrarmos a paz em meio ao caos, condenando os abusos, unindo forças para gritar contra os exploradores e nunca se esquecendo que, individualmente, somos apenas um elo numa realidade múltipla, cujas forças físicas e imateriais jamais podem ser ignoradas.

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2º – Mário de Andrade, O Turista Aprendiz

Murilo Salles | Brasil | 2024

Mário de Andrade, O Turista Aprendiz é fruto de um genuíno cinema autoral, capaz de nos fazer viajar, mergulhar nos sentimentos e na atmosfera de um dos grandes ícones da nossa literatura; e então nos retirar do enlevo e nos jogar na realidade vergonhosa de um Brasil que ainda não sabe quem é; ainda não se curou das feridas da escravidão; ainda não se reconheceu como uma fera que se disfarça de cordial, nem como uma genial e rica nação que não consegue se soltar dos grilhões das etiquetas, das mentiras da propaganda e das ideias autoindulgentes dos menestréis, messias, mecenas e mestres que controlam o país de norte a sul… desde as Capitanias Hereditárias.

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1º – Emília Pérez

Jacques Audiard | França, Bélgica | 2024

Emilia Pérez é, portanto, uma experiência audiovisual inesquecível do começo ao fim que funciona sem engasgues como thriller de crime, como musical, como drama, como crítica social, como aprendizado e como plataforma para quatro atrizes se reinventarem. Jacques Audiard criou algo único e que renova aquela sensação de que o Cinema é para ser, no fundo, um instrumento disruptivo, tão destruidor quanto criador e que existe, acima de tudo, para fascinar.

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