Fim de ano, tempo de listas sobre o mundo da música. Bem, aqui no Plano Crítico fugimos um pouco do clichê “Melhores Discos de 2014”, visto que muita coisa boa foi lançada esse ano e fica difícil rankear as coisas dessa maneira. Por isso, no clima das listas de filmes já feitas, aqui vai nossas opiniões sobre os álbuns mais surpreendentes e também os mais decepcionantes de 2014. Além desse que vos escreve, Handerson Ornelas, participaram com valiosos comentários nosso chefe, Ritter Fan, e a Eva do Plano Crítico, Melissa Andrade. Embarque nessas surpresas e decepções do mundo da música em 2014!
Os mais surpreendentes de 2014
“Music Inspired By The Life And Times Of Scrooge” – Tuomas Holopainen
Handerson Ornelas: Nenhum álbum conseguiu ser mais surpreendente que esse. Tuomas Holopainen, tecladista do Nightwish, em seu primeiro álbum solo e conceitual, contando a história da famosa HQ do Tio Patinhas, The Life And Times Of Scrooge, desenhada por Don Rosa. Me lembro da primeira vez que escutei o álbum, quando percebi o clima aventureiro do instrumental e a sinfonia perfeita de todas as faixas. Ver arranjos tão bem trabalhados e vozes tão afinadas como em To Be Rich e A Lifetime of Adventure fica difícil não se emocionar. Triste mesmo é ver como a crítica especializada perde tempo vendo muita coisa do mercado indie e se esquecendo de álbuns assim. Indispensável pra qualquer amante de música.
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“St. Vincent” – St. Vincent
Handerson Ornelas: Certamente o álbum de 2014 mais elogiado pela crítica. O grande acerto de St. Vincent é não ter medo de inovar. O experimentalismo certeiro de seu quarto disco é um modelo que cantoras pop deveriam seguir. A estranheza de Annie Clark aqui é madura e tem um objetivo claro de experimentar novos caminhos para a música, diferente da máscara comercial que muitas cantoras usam. Sintetizadores interessantes, ótimas distorções de guitarras e letras inteligentes formam um álbum que merece (e já figura) estar em toda boa lista de melhores do ano.
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“Quack” – Duck Sauce
Handerson Ornelas: Quack já figurava entre os melhores álbuns do primeiro semestre de 2014, mas só o escutei bem mais tarde. Um vacilo de minha parte. O duo eletrônico mostra que é possível nos dias de hoje fazer música de grande qualidade e continuar sendo “pop”. Quack surpreende pela diversão, pelo rítmo alegre cheio de influências do R&B e pelas ideias engraçadas (o duo chega até a gravar um trote que passam em uma academia). Pode não ser um disco perfeito, mas resgata um lado do house que anda sendo esquecido, lembrando clássicos como Discovery do Daft Punk.
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“Turn Blue” – The Black Keys
Handerson Ornelas: The Black Keys, assim como o Metallica, conquistou dois tipos de fãs, visto que ambas as bandas tiveram duas sonoridades diferentes e marcantes. No caso do Keys, o grande público que adquiriu desde Brothers e El Camino não se sentiu tão satisfeito com Turn Blue. Entretanto, para muitos fãs antigos do duo o álbum foi um prato feito, ainda mais com a surpresa que é a dose pesada de rock psicodélico. Não é possível agradar a todos, mesmo assim, Turn Blue se esforçou, pois tem de tudo: Blues, R&B, Country e Rock Psicodélico.
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“Encarnado” – Juçara Marçal
Handerson Ornelas: Representando o Brasil, escolhi um disco que talvez poderia estar entre os melhores da música brasileira. Juçara encontra um lugar especial na música fazendo uma obra de alto nível, consolidando toda sua experiência com música nesse seu primeiro álbum solo cheio de experimentalismo, clima bem brasileiro e uma temática forte como a morte. Lembro de ter escutado Encarnado dentro do ônibus, em uma viagem. Chorei durante aquela viagem, principalmente com a fantástica faixa Ciranda do Aborto. Álbuns assim são preciosidades que não se vê todo dia.
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Menções Honrosas
Guardians Of The Galaxy: Awesome Mix Vol. 1
Handerson Ornelas: Apesar de ser uma coletânea, a trilha de Guardians Of The Galaxy pode ser chamada de um dos melhores lançamentos de 2014. Mais do que o próprio filme, sua trilha foi uma grande surpresa, chegando até a conseguir o topo da Billboard. Resgatar o rock setentista e a melhor aura do soul merece ser chamado de um trabalho genial (mais um ponto para James Gunn, que selecionou a trilha a dedo). Guardians Of The Galaxy: Awesome Mix Vol: 1 é o tipo de álbum que você não cansa de ouvir e que, a todo momento, vai cantarolar suas canções.
Ritter Fan: O que é esse álbum? Geralmente, só levo fé em trilhas sonoras de filmes compostas por músicas pré-existentes quando quem escolhe é Quentin Tarantino. Por isso, não levava a menor fé nessa compilação. Mas, no momento em que a primeira música toca no filme, determinando o ritmo da película, o que veio em seguida foi um bombardeio musical extremamente agradável. E o álbum é daqueles que você escuta e recomeça, escuta e recomeça, escuta e recomeça em um loop incessante que sempre – literalmente sempre – traz um sorriso no rosto, um estalar de dedos e um gingado na cintura.
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“Cheek To Cheek” – Lady Gaga e Tony Bennet
Handerson Ornelas: Lady Gaga conseguiu enganar muita gente com essa história de “salvadora do pop”. Pura balela. Pegue seus álbuns e vai ver que não é diferente das tantas outras cantoras atuais do mercado pop. No entanto, é preciso dizer que a cantora tem seus dons artísticos, e ela mostrou como eles são excelentes nesse álbum dueto com o grande nome do Jazz, Tony Bennet. Aqui, ela demonstra o que é cantar de verdade, sem abuso de Auto-Tune, sem gritos ou performances exageradas. A música no seu formato mais simples e sincero. É bom que a cantora saiba que é possível, sim, seguir esse modelo seja cantando jazz ou pop.
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“Rose Ave.” – You+Me
Melissa Andrade: Quem poderia imaginar que aquela artista mais conhecida pelas suas músicas irreverentes e performances artísticas no palco, algumas dignas de Cirque du Soleil, teria esse lado tão folk e suave? Pink ou Alecia Moore, que é como ela escolheu assinar o album em parceria com Dallas Green, se entrega de corpo e alma mostrando um lado desconhecido, porém igualmente talentoso para os fãs. Rose ave. é aquele tipo de álbum que você consegue ouvir repetidas vezes, pois nem sente passar de tão gostoso que é de ouvir.
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Os mais decepcionantes de 2014
“Aretha Franklin Sings The Greatest Divas Classics” – Aretha Franklin
Handerson Ornelas: Essa aí doeu no peito. O retorno de uma diva da música após ter enfrentado câncer e passado anos sem lançar material novo tinha tudo pra ser uma surpresa. Depois de lançar um dos singles mais comentados do ano – sua versão de Rolling In The Deep da Adele – a expectativa era que a coisa poderia ser muito boa, tal como o single. E a coisa não foi. O single é uma das poucas boas faixas do disco, o resto você pede para que Aretha pare de gritar nos seus ouvidos. A cantora perde muito tempo com melismas, gritos e outras firulas vocais desnecessárias tentando passar a falsa impressão que sua voz está como nos seus dias de ouro, o que é uma mentira. Além disso, fica claro o uso de edição e Auto-Tune pra dar uma “ajudinha” no vocal da cantora. Ver o arranjo “moderno” (uma tentativa frustrada de unir eletropop com soul) que colocaram em I Will Survive e You Keep Me Hanging On é de acabar com a felicidade de qualquer um que admira a soul music. Pena.
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“Recess” – Skrillex
Handerson Ornelas: Foi escutando EPs como More Sprites And Sprites que conheci o Skrillex. Achei sensacional seu house e dubstep que fugia do estilo de tantos DJs “falsos” que existem por aí. Quando Recess, seu primeiro álbum, saiu esse ano, qualquer admiração caiu por água a baixo. As participações desnecessárias e a vibe cheia do pior lado do hip-hop fez com que o DJ perdesse toda sua originalidade. Recess coloca em dúvida o conceito de melodia e ruído, uma prova que experimentar musicalmente nem sempre gera música boa. Pelo menos a capa é ótima.
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“.5: The Gray Chapter” – Slipknot
Handerson Ornelas: O Slipknot é uma das poucas bandas que salvam o nu metal, gênero que dominou o cenário do metal desde o início desse milênio. Passaram mais de 5 anos sem gravar e deixaram seus ouvintes acumularem uma expectativa enorme em cima do novo trabalho. Mas depois da morte do baixista, Paul Gray, e do baterista e uma das cabeças da banda, Joey Jordison, ficou difícil cumprir com as expectativas. .5: The Gray Chapter tenta compensar com peso e crueza nos arranjos, se esquecendo de qualquer teor melódico neles. Um divisor para a banda, seja para o bem ou para o mal. Acredito bem mais que é para o último…
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“Songs Of Innocence” – U2
Ritter Fan: As canções da inocência do U2 são as canções da mesmice, da repetição, do cansaço de um grupo outrora grande e inovador. Hoje, Bono e companhia parecem estar deitados em berço esplêndido, valendo-se de músicas “reserva” e estratégias de marketing furadas para parecer que venderam muito. Uma pena, considerando que esse é o grupo que compôs hinos como Sunday Bloody Sunday, Where the Streets Have No Name e One, dentre tantos outros. Songs of Innocence era minha esperança de um U2 reinventado. Mas nada feito…
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“Nação Zumbi” – Nação Zumbi
Handerson Ornelas: O Nação Zumbi não lançou um álbum ruim esse ano, na verdade, seu novo disco é um bom resultado. Mas não dá pra passar despercebido pela mudança da banda e a expectativa que o álbum acumulou depois de um dos seus melhores discos, o excelente Fome de Tudo. O álbum homônimo é muito menos Manguebeat e mais pop rock. As alfaias já não são mais usadas como antes e a banda já parece bem diferente da época de Chico Science. Toda mudança é bem vinda, mas aqui o que foi perdido era a marca da banda, a troco de um estilo comum no mercado. Afinal, uma das coisas que o cenário da música brasileira menos precisa é mais uma banda de pop rock.
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Menção Desonrosa
“The Endless River” – Pink Floyd
Handerson Ornelas: The Endless River só recebe essa “Menção Desonrosa”, pois nem chega a ser uma decepção. Estava claro que não seria nada extraordinário essa sobra de estúdio de The Division Bell dita “homenagem a Richard Wright”, retirada do baú depois de mais de 5 anos da morte do tecladista e justamente no tempo que David Gilmour diz que lançará um novo álbum solo e turnê. Tudo aí é um jogo de interesses, não se engane com esse papo de homenagem. O resultado foi um disco descartável, bastante mediano e que cairia muito melhor como extras de uma edição de aniversário de The Division Bell. Ainda assim, preciso dizer que, mesmo com um de seus trabalhos mais fracos, é muito bom ver o Pink Floyd nas paradas novamente.
Ritter Fan: O Floyd Rosa é magnífico, sensacional. Sempre foi. Mesmo em seus momentos considerados mais fracos. Mesmo sabendo que o novo álbum seria um álbum de “sobras”, lá no fundo espera algo no mínimo acima da média. Talvez minha expectativa lá no alto tenha gerado minha decepção profunda, não sei. Mas tenho para mim que The Endless River não acrescentou em nada na mitologia do grupo. Uma grande perda de tempo e de excitação…