Esta lista NÃO é apenas de leituras de obras lançadas em 2024, seja no Brasil, seja no exterior. Claro que podem aparecer obras lançadas neste ano, mas a proposta é apenas ranquear as melhores leituras ou releituras de janeiro a dezembro, independente de quando o volume em questão chegou ao mercado. Clique nos links dos títulos para ler as críticas! Já deixo também o convite para vocês compartilharem nos comentários as suas listinhas de 10 melhores leituras de livros em 2024! E caso queiram ver as nossas outras listas sobre o tema, clique aqui!
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FERNANDO JG
Todo ano, tenho como meta a leitura mínima de 12 livros. Seja poesia ou romance. Mesmo que acabe lendo um pouco mais do que isso, gosto de manter o parâmetro para que eu me atualize daquilo que foi produzido ou está sendo. No entanto, enquanto um estudante de Literatura em tempo integral, acabo me perdendo entre o que é lazer e o que é compromisso – e talvez essas categorias se misturem, apesar de ter de cumprir prazos. É comum que passe mais tempo lendo algo teórico a algo literário em si, o que não me incomoda de todo, afinal, vou conhecendo muitas obras através da leitura de crítica literária. Ano após ano, tenho a impressão de me repetir nas justificativas. Devo mudar para os próximos. No que diz respeito à literatura, há algum tempo tenho otimizado aquilo que consumo, isto é, penso metodicamente no quanto aquilo que escolhi para ler vai me ajudar de alguma maneira na minha vida. Acaba que precisei encontrar minha diversão literária não mais na leitura prosaica do dia a dia, mas no índice de contribuição que aquilo me traria. Isso não significa que tenha deixado imediatamente de ler aquilo que tenho muita vontade de ler, mas tenho reduzido e ponderado. Para este ano, comecei com Thomas Mann, um dos meus autores favoritos, passei por Clarice, Agatha Christie, Barthes, e mesmo autores não tão consagrados assim da Literatura Contemporânea, encerrando com Novalis, o príncipe do Romantismo alemão.
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10º – Modern Love
Daniel Jones | EUA | 2019
Este livro foi um grande problema para mim. Ao mesmo tempo em que tive excelentes momentos assistindo à série da Amazon – me emocionando episódio a episódio, em meio a temáticas de encontro e desencontro tão dolorosas -, tive momentos não tão agradáveis assim ao ler o livro. Claro, está no meu top 10 do ano porque, aliás, foi uma boa leitura e que desejei, por muito tempo, concretizar, mas que só consegui ter tempo hábil para fazê-la agora. Me emocionou menos, me identifiquei pouco mas ainda assim continua com sua beleza na narração cotidiana a respeito do amor. “Amor”: afinal, o que é isso? O conceito é explorado e investigado desde que a linguagem passa a figurar no centro da vida humana. Em Modern Love, o amor é lido à luz das mais variadas formas de amar e emociona por encontrar o ato amoroso no cotidiano mais prosaico, por vezes destituído de Romantismo. Modern Love é uma coletânea interessante, mas não leria de novo. Se tivesse de rever, veria a série, que é impecável.
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9º – As Cartas Portuguesas
Mariana Alcoforado | França | 1669
O quanto a ausência e o abandono podem anular alguém? Cinco curtas cartas nos jogam num abismo de amor pelo qual atravessa Mariana Alcoforado. Desespero de amor do pior tipo, daquele que faz querer morrer a não viver ao lado da pessoa amada; o desvario de não conseguir esquecer e o desencanto da ruptura. São as cartas de amor de uma freira a um soldado francês que a engana no alto do seu poder de sedução e depois desaparece, relegando Alcoforado na miséria de uma paixão desaplaudida e renegada. As cinco cartas, que têm como destino o próprio Marquês de Chamilly, vão se tornando cada vez mais carregadas e tristes com o tempo, e a cada nova carta, maior o tom de desesperança.
Altamente recomendável.
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8º – Fragmentos de um Discurso Amoroso
Roland Barthes | França | 1977
Fragmentos de um Discurso Amoroso, publicado em 1977, é uma obra essencial da filosofia dos afetos. Nela, Barthes investiga o tema do amor a partir de fragmentos literários, como no Werther, no Tristão e Isolda etc., buscando interpretar o sentimento amoroso e seus efeitos de felicidade, solidão e abandono. É uma obra singular, afinal, Barthes não se furta de ir na psicanálise e na filosofia para aprofundar conceitos que, vividos no dia a dia, podem se tornar obscuros pela falta de uma compreensão maior daquilo que se sente. O livro funciona como fragmentos e pode oferecer uma sensação de incompletude – podendo ser lido sem uma linearidade evidente -, mas entrega um resultado satisfatório ao fim ao evidenciar a complexidade da experiência de amar.
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7º – O Cão Sem Plumas
João Cabral de Melo Neto | Brasil | 1950
O Cão Sem Plumas, de JCMN, é a virada de chave da sua poética. O Cão Sem Plumas, seguido de O Rio e Morte e Vida Severina formam uma espécie de trilogia social na sua obra, cuja temática gira ao redor dos problemas socioeconômicos de Pernambuco do século XX, com todos eles tendo o rio Capibaribe como seu principal agente. Em O Rio, a descrição é menos emotiva, mais racional, geográfica e tem importante papel ao desenhar uma determinada forma da cidade por onde o rio atravessa. João guarda seu canto de miséria para o Cão Sem Plumas e Morte e Vida Severina, esta última obra que encerra o ciclo. O Cão Sem Plumas é a tentativa cabralina de descobrir um universo sociogeográfico por meio de uma simbiose que une a decadência humana à natureza. O livro é dividido em quatro partes: Paisagem do Capibaribe I e II, onde há uma descrição da miséria (não só, há o exemplo da crítica aos casarões dos tempos do açúcar) dos lugares pelos quais o rio atravessa; A Fábula do Capibaribe, na qual mostra como o rio vai construindo a cidade, e o Discurso do Capibaribe, onde todas as purezas da poesia cabralina são postas ao chão. A terra, o rio e o homem fundem-se no poema. A descrição do rio é também a descrição do povo o qual ele banha. Essa fase de Cabral restabelece o diálogo com o leitor, algo que fora mais dificultado em suas primeiras obras devido ao hermetismo da geração de 1945. Cabral nivela a linguagem do poema à linguagem da rua e com isso retoma diálogos de um primeiro modernismo que inventa, à sua maneira, uma linguagem coloquialmente brasileira de acordo com a maneira como o povo fala. Com isso, intenta-se unir forma e conteúdo, descritivismo e realismo, isto é, por em evidência uma outra imagem de Brasil que não a excessivamente festiva dos modernistas de 1922. A linguagem social dá voz ao problema social. É portanto a desalienação da linguagem e uma maior participação poética, como num lirismo participativo. O Cão Sem Plumas traz Cabral ao cenário real e às preocupações sociais de seu tempo.
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6º – Faróis
João da Cruz e Sousa | Brasil | 1900
Obra seminal da Literatura Brasileira, Faróis é o exemplo prototípico das tendências penumbristas e crepusculares que desabrocharam no fim do século XIX. Faróis, de Cruz e Sousa, é uma de suas obras mais carregadas pelo tom da melancolia e do decadentismo. O título do livro dialoga com o poema de Charles Baudelaire Os Faróis. Aqui, a arte aparece como a representação de abismos, do horror, mas também como espaço de um reino desejável, espaço de fuga e de escapismo. Cruz recupera antigos preceitos românticos no estabelecimento da sua literatura e confere-lhe uma nova roupagem. Por isso muitos chamam a estética simbolista de “decadente”, isto é, herdeira de um romantismo envelhecido. A maldição, aspecto tão comum no movimento, é reinterpretada à luz das problemáticas nacionais: ser negro numa sociedade escravista e ser um artista negro numa sociedade que rejeitava artistas num geral. Seria natural que sua poesia simbolista se fechasse num hermetismo sombrio, como se uma nuvem de cor negra que encerra o dia, trazendo negatividade, recaísse sobre a sua poesia. Os temas expõem sua misantropia: a noite, a caveira, a amada gélida, pálida, figuras mortas e apodrecidas, o cadáver, o pranto, enfim, a morte. Situando-se do lado macabro da coisa, a voz lírica remete a um profundo lamento agônico de quem molha a pena com lágrimas. Atual, pois o sofrimento humano nunca deixa de ser parte inerente à nossa subjetividade, Faróis encerra em seus poemas os anseios mais primitivos do homem, como o amor e a liberdade, e por ser sempre universal em seus afetos, será para sempre atual enquanto existir.
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5º – O Guardador de Rebanhos
Fernando Pessoa | Portugal | 1926
Num impulso, acabei lendo os poemas completos de Alberto Caeiro, heterônimo de Fernando Pessoa. Nunca fui leitor de Pessoa, mesmo apreciando suas temáticas, nunca tive a chance de vê-lo sistematicamente. O Alberto Caeiro é muito diferente de tudo que o Pessoa já produziu (inventou?). Heterônimo centrado no real, sem abstrações melancólicas, crítico da metafísica e fiel ao aqui-e-agora. Por vezes bucólico, campesino e sobretudo o menos atormentado das invenções pessoanas. No Guardador de Rebanhos, Caeiro se apresenta como pastor de rebanhos, vivendo uma vida pacata em meio a contemplação da natureza e daquilo que ela lhe oferece. Com linguagem simples e direta, efeito mimético da própria humildade cenográfica, o eu lírico reflete sobre a experiência da vida, rejeitando explicações vistas como “alucinatórias”, buscando sempre encontrar no real uma resposta para questionamentos cotidianos.
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4º – O Belo e o Disforme: Álvares de Azevedo e a Ironia Romântica
Cilaine Alves Cunha | Brasil | 1998
Livros de teoria literária são sempre magníficos e têm a capacidade de elevar alguma obra ou mesmo de ser melhor do que determinado livro a que se dedica analisar. O Belo e o Disforme é, provavelmente, um dos melhores a respeito de Álvares de Azevedo e a razão da afirmativa se deve ao seu pioneirismo analítico sempre atrelado ao desvendamento de uma certa obscuridade que paira sobre a poesia azevediana. Cilaine Cunha revela um movimento de dualidade existente na Lira, mas que respinga em outras obras como Noite na Taverna e Macário. A pesquisadora passa em revista a tradição crítica, rebatendo autores como Mário de Andrade e mesmo Antonio Candido, cujas análises são colocadas em cheque, revelando sempre uma fragilidade na argumentação de ambos. O trabalho com as categorias estéticas do período é simplesmente magnífico e nos compraz por completo ao ler. O texto, que é resultado da sua dissertação, me parece ser o caminho mais óbvio e menos tortuoso para se iniciar em A.A, e talvez o percurso mais completo na poesia romântica brasileira ao abordar mecanismos poéticos que regem a literatura do século XIX. Critério e seriedade é como caracterizaria o rigor da análise.
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3º – Hinos à Noite
Novalis (Georg Philipp Friedrich von Hardenberg), Alemanha, 1800
Hinos à Noite, de Novalis, é a obra seminal do Romantismo. É onde a morte e o anseio pelo infinito se cruzam numa atmosfera mística, cuja noite e o mistério são refúgios para a alma inquieta da voz lírica que, desencontrada do mundo diurno, vaga melancólica pelo indefinido. Na escuridão, o espírito se solta das amarras da realidade, ansiando pela união com o divino. É ali, no silêncio profundo da noite, que o poeta encontra a verdade que transcende o tempo, e o amor cósmico surge como uma chama que guia além da morte, em um abraço místico entre o humano e o eterno. Contido de apenas 5 poemetos, Hinos à Noite contém todo o programa idealista dos românticos e será sempre o protótipo da lírica da alma desajustada.
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2º – A Paixão Segundo G. H.
Clarice Lispector | Brasil | 1964
Clarice Lispector é, de longe, a minha escritora mais íntima, isso porque toda vez que escreve parece que fala diretamente a mim. São poucos os escritores que compreendem de maneira umbilical a essência das inquietudes que permeiam a subjetividade humana. Acredito que parte de uma determinada iluminação interna ou uma espécie de sensibilidade plenamente desenvolvida. Dostoievski, Kafka, Hermann Hesse são alguns que se perdem, como Lispector, no labirinto indecifrável a que chamamos de abstração. Esta abjeta obra de Clarice me revisitou depois de 6 anos de uma tentativa fracassada de leitura. Desta vez insisti, afinal, oras, a resposta de todo o tormento que apavora a sua obra do início ao fim está inscrita neste detestável enredo intitulado A Paixão Segundo G.H. Obtuso, o livro permeia o instante de um confronto rápido, mas que dura uma eternidade dentro do tempo psicológico, entre G.H e uma barata encontrada no quarto da empregada. Animal epifânico, ele é o objeto responsável por trazer à tona inquietações que fervilham no íntimo desta personagem única do enredo. É mais ou menos quando a gente vê um objeto e lembra de algo que havíamos esquecido e então elaboramos isso. Ou quando surgem respostas para questões que já havíamos nos perguntado antes mas que, do nada, tudo ficou nítido de uma vez. O livro inteiro é sobre uma iluminação repentina que a GH tem quando vê a barata. Iluminação microscópica do funcionamento da vida enquanto macrossistema. A cosmovisão da personagem perpassa a compreensão do infinito particular que ela carrega em si. Profundamente filosófico e cheio de aporias, A Paixão Segundo G.H não poderia deixar de figurar no panteão das melhores obras lidas neste ano.
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1º – Os Buddenbrook
Thomas Mann | Alemanha | 1901
É difícil falar em Thomas Mann sem ressaltar a grandiosidade da sua obra. Não à toa é constantemente referido como o maior romancista do século XX, uma vez que toda a tradição do gênero se encontra trabalhada na sua obra, dos Buddenbrook ao perfeito Doutor Fausto – e perfeito no sentido mais estrito da palavra: o mais próximo que a literatura chegou do acabamento formal, psicológico e temático; talvez o mais próximo que o Homem chegou de Deus. Sem maiores explicações pedantes, sinto que Os Buddenbrook carrega algo de especial nele, mesmo numa leitura desinteressada, o romance prende a nossa atenção e nos comove profundamente. Pela temática, é possível que alguns leitores se afastem com receio de se tratar da narração monótona da empresa da família e da organização interna do clã familiar, mas é um erro. Thomas Mann aprofunda ao máximo a noção de estudo de personagem e de espaço, fazendo emergir um enorme e complexo drama coletivo e individual. Para os curiosos, talvez uma cena pequena desperte o interesse: há um capítulo específico sobre a febre tifóide que acomete a família Buddenbrook, mas ainda não sabemos ainda o porquê de tal descrição. Mann destrincha magnificamente, com muita melancolia e morbidez, o problema da febre. Alguns capítulos depois, como num assalto, se descobre quem é o personagem doente e então inevitavelmente Mann desmonta o seu leitor por completo com artifícios muito requintados da arte narrativa. Ou mesmo uma cena em que Mann descreve toda a psicologia de um personagem a partir de um raivosa e ressentida Aria tocada no piano da sala de estar por Hanno Buddenbrook, como na Sonata de Outono de Ingmar Bergman. A família se desintegra pouco a pouco, juntamente da empresa, corroída por dívidas e os personagens, pela doença. Obra-prima indispensável. Palavras e análises nunca serão o bastante para louvar o romance de estreia de Thomas Mann; talvez seja esta a razão de eu ter ensaiado escrever sobre o romance inúmeras vezes ao longo do ano e nunca tenha conseguido materializar.
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GABRIEL ZUPIROLI
Ler livros inteiros é um processo árduo, especialmente se você trabalha com literatura. Lê-se muito, porém com muitas interrupções, desvios, pelas margens. Trabalhar com literatura é ler sobretudo fragmentos, pedaços, restos. Nesse sentido, é normal chegar ao fim do ano tendo lido, de fato, poucos livros até o fim. E foi, novamente, o caso de minha experiência ao longo de 2024, que consegui finalizar com 20 livros lidos.
No entanto, o que importa nesses processos é justamente o que se retém pelo caminho. Mais do que o quanto se lê, o que se lê e sobretudo como se lê é, no fim, o que mais importa. E foi um ano de experimentações: uma dedicação a ler mais mulheres, ler mais livros antigos e ler em outros idiomas são coisas que compõem minha experiência literária deste ano. E são esses fragmentos que valem a pena. Sem mais interrupções, vamos à lista.
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10º – Paixão Simples
Annie Ernaux | França | 1992
Recentemente vencedora do Prêmio Nobel de Literatura, a obra de Annie Ernaux transita entre textos de uma potência enorme contida na delicadeza e outros que são menos interessantes, como meros exercícios. Paixão simples pertence ao primeiro grupo, pois se trata de um texto no qual Ernaux consegue traduzir em linguagem certas demandas da espera e da relação com o Outro que desenham com brutalidade o processo de apaixonamento. E a maneira de realizar essa tradução se dá em capturar o desejo daquele que escreve e do descrito em um andamento das mais belas frases não por sua complexidade, mas por sua precisão.
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9º – A Arte de Produzir Efeito Sem Causa
Lourenço Mutarelli | Brasil | 2008
Mutarelli realiza um processo de ir aos poucos desarticulando a condução narrativa e a linguagem para ir conduzindo o leitor cada vez mais profundamente à instância da loucura. Nesse sentido, o romance passa da narratividade mais tradicional – mas sempre esperta e cômica – para uma explosão descomunal cada vez maior ao narrar o processo de enlouquecimento de seu protagonista – e, de quebra, inserindo um diálogo genial com William S. Burroughs.
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8º – O Tribunal da Quinta-feira
Michel Laub | Brasil | 2016
Com uma narração extremamente neurótica e obsessiva, O tribunal da quinta-feira discorre sobre as paranoias do segredo, da conspiração, da instância do privado e suas violações ao narrar justamente sobre uma doença cuja recepção foi paranoica, a SIDA. É no controle obsessivo do narrador pelo que acontece ao seu redor – e pelos efeitos da vida em si e em seu corpo – que se estrutura o retrato do que fazer quando a dinâmica do segredo é quebrada e a neurose se expõe.
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7º – Saia da Frente do Meu Sol
Felipe Charbel | Brasil | 2023
Um romance que se estrutura na dimensão das imagens, que se propõe a ser uma investigação sobre a figura do tio, mas que constantemente implode as noções de biografismo e autoficção para ao apagar as fronteiras entre o falar de si e o falar do outro. É por esse procedimento que Charbel procura confundir completamente ambos os processos para criar um distanciamento de si mesmo em função de se compreender. E é nesse movimento que o narrador parece poder também compreender a figura outra: o tio, seus segredos, sua persona, suas imagens. Um romance de procedimentos muito sólidos e que procura desarticular o sentido para, na instância final da ficção, procurar restaurar sua possibilidade.
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6º – Fugitiva
Alice Munro | Canadá | 2004
A contista canadense Alice Munro faleceu no meio desse ano que se encerrou. Em meio às polêmicas suscitadas após sua morte, o que restou de fato foi uma obra completamente única. Fugitiva é um livro que transita por contos que se conectam ou não, mas que não deixam de tratar sobre temas similares como o desejo e a impossibilidade de concretização do mesmo – e de localizar o sentido. Na narração de contos longos e calcados no que não é dito, a escrita de Munro procura falar daquilo sobre o que não se pode falar utilizando justamente o que está aí, diante do olhar.
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5º – Prisão Perpétua
Ricardo Piglia | Argentina | 1988
Diferentemente de como foi publicado no Brasil, a edição em espanhol de Prisão perpétua possui dois contos que compõem o texto. Neles, Piglia transita por temas que já eram e viriam a ser ainda mais centrais em sua obra ao longo do tempo, como as formas de narrar a experiência, as distinções entre ficção e realidade, o “tornar-se outro” através da ficção. Em ambos os textos, faz uso da forma diário e da escrita fragmentária para solidificar um texto-teoria que viria a jogar luz sobre todas essas questões de uma forma brilhantemente paranoica.
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4º – O Caminho de Ida
Ricardo Piglia | Argentina | 2013
Outro romance de Piglia – ossos do ofício -, este é ainda mais paranoico, trazendo a condição como tema do texto. Último romance publicado em vida pelo autor, trata-se de um texto que sintetiza muitos dos pontos desenvolvidos por ele em toda sua obra. Além disso, fagocita as influências norte-americanas de forma a criar uma espécie de romance próprio quase paródico, mas de uma profunda seriedade ao aliar a paranoia com a campus novel, política, os limites da ficção e romance policial.
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3º – Mrs Dalloway
Virginia Woolf | Reino Unido | 1925
A brasileira Clarice Lispector, por exemplo, é uma das representantes do estilo semelhante ao tecido pela britânica na escrita, autora canônica que deixou como dos traços mais notáveis de suas composições, a postura desafiadora diante das convenções narrativas de sua época. Além de Mrs. Dalloway, podemos considerar como marcos da escritora, as seguintes publicações: Orlando, de 1928, narrativa que atravessa séculos na vida do personagem-título, mudando de gênero ao longo do tempo, se estabelecendo tanto como uma biografia ficcional quanto como uma reflexão sobre identidade e liberdade, e As Ondas, de 1931, uma de suas produções mais experimentais, que nos apresenta uma série de monólogos internos dos seus personagens que se entrelaçam, criando uma espécie de sinfonia literária complexa. Além dos livros mencionados, a escritora deixou um rastro considerável de ensaios e crítica literária.
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2º – A Partilha do Sensível
Jacques Rancière | França | 2000
Trata-se de uma entrevista com o filósofo francês Jacques Rancière no qual ele discorre sobre sua visão da estética a partir da noção de “partilha do sensível”, que desenvolve. Ainda que seja um livro teórico em si, me parece ser um dos trabalhos mais importantes na filosofia estética recente, assim como uma ótima introdução para o resto de sua obra.
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1º – Hamlet
William Shakespeare | Inglaterra | 1599 – 1601
Sabidamente uma das maiores obras da literatura ocidental, sendo inclusive peça fundamental para se pensar o conceito e a ideia de cânone. Uma peça que captura certas questões humanas de tal forma que há aqueles que a consideram como fundadora de maneiras de se pensar essas questões. No entanto, o que mais me impressiona é os modos de se traduzir o trabalho dessa temática através da linguagem e da estrutura. Impossível não ser o texto em primeiro lugar dessa lista.