Histórias em quadrinhos são a fantasmagórica fascinação daquelas pessoas de papel, paralisadas no tempo, marionetes sem cordões, imóveis, incapazes de serem transpostas para os filmes, cujo encanto está no ritmo e dinamismo. É um meio radicalmente diferente de agradar os olhos, um modo único de expressão. O mundo dos quadrinhos pode, em sua generosidade, emprestar roteiros, personagens e histórias para o cinema, mas não seu inexprimível poder secreto de sugestão, que reside na permanência e imobilidade de uma borboleta num alfinete.
Nós aqui do Plano Crítico, seguindo a publicação das LISTAS DE FAVORITOS, resolvemos esquematizar desta vez os nossas quadrinhos! A proposta segue exatamente a mesma da lista anterior: os escolhidos são 10 FAVORITOS e não necessariamente melhores (perceba a diferença, por favor!).
NOTA: Esta é uma versão 2.0 da lista. A primeira publicação aconteceu em 2015, com uma estrutura completamente diferente (para começar, era um TOP 5 e não TOP 10, como agora) e com muita gente diferente na equipe. Hoje, cinco anos depois, trago a versão atualizada e acrescida de novos comentários e indicações! Vocês também vão notar que fiz uma marcação na seção de comentários, separando visualmente as participações feitas pré e pós a publicação desta segunda versão. Não se esqueçam de comentar abaixo e deixar também a sua lista de 10! Divirtam-se!
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Ritter Fan
Achei que tiraria de letra a missão de escolher 10 HQs favoritas para colocar aqui. Quebrei a cara. Essa foi, até agora, de longe, a lista mais difícil que já fiz, mesmo considerando que são HQs favoritas e não as melhores que já li (pode até haver sobreposição, mas essa diferença é crucial, como já salientei outras vezes).
Minha primeira versão da lista tinha 45 HQs. 45! Se eu mandasse para o Luiz Santiago, responsável pela organização dessa postagem, ele faria seu costumeiro vodu e a coisa não acabaria bem…
Assim, para minha sanidade e para evitar conflitos eu me auto-impus restrições, que são as que seguem: (1) só poderiam haver, no máximo, duas HQs de super-heróis mainstream; (2) caso houvesse duas HQs de super-heróis mainstream, elas teriam que ser de editoras diferentes; e (3) não poderia haver repetição de autores, seja no roteiro, seja na arte.
Com base nisso, com ENORME sacrifício, cortei A Morte de Gwen Stacy, Batman: Ano Um, Demolidor: A Queda de Murdock e até mesmo escolhas óbvias como Watchmen e Reino do Amanhã. Essas são as que ficaram.
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O Combate dos Chefes
Le Combat des Chefs | René Goscinny, Albert Uderzo | ?? 1966 | Pilote
Asterix faz parte de minha vida de quadrinhos desde quando eu ainda não sabia ler. Meu pai me contava essas histórias e tinha todas da coleção. Herdei-a dele e continuei comprando os novos volumes que, hoje, tenho tanto em português como no original em francês em belíssimos álbuns com capa dura.
Dentre os até agora 38 volumes, aquele a que mais volto para me deliciar é, sem dúvida alguma, O Combate dos Chefes. E eu me escangalho de rir a cada nova leitura, seja pela hilária situação de Panoramix, que não para de gozar da cara de seus compatriotas, seja pela indignação de Obelix ou pela preparação ao combate do título, que coloca Abracurcix contra Tomix, o chefe de uma aldeia próxima que foi assimilada pelos costumes romanos. Sensacional do começo ao fim.
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Um Contrato com Deus
A Contract with God | Will Eisner | ?? 1978 | Baronet Books
A Saga da Fênix Negra
The Dark Phoenix Saga | Chris Claremont, John Byrne | ?? 1980 | Marvel Comics
Camelot 3000
Camelot 3000 | Mike W. Barr, Brian Bolland | ?? 1982 – 1985 | DC Comics
Falou em Lendas Arturianas, podem contar comigo! E, quando coloquei as mãos na publicação brasileira de Camelot 3000, lá na época de seu lançamento original por aqui [intervenção do Luiz Santiago: “no início do século XVI, quando eu era apenas uma criança de 2.670 anos“], não queria saber de outra HQ. Foi um desespero esperar até a minissérie acabar, mas não fiquei desapontado e eu a lia e relia incessantemente. Afinal de contas, como não amar uma HQ que lida com o Rei Arthur acordando de um sono profundo para cumprir uma profecia de que ele voltaria quando a Inglaterra mais necessitasse?
E se esse momento fosse muito no futuro, com a Terra sendo invadida por extra-terrestres comandados por Morgana Le Fey? E se Guinevere e os Cavaleiros da Távola Redonda fossem humanos contemporâneos que “despertassem” com o chamado de Arthur e do Mago Merlin não necessariamente na forma original?
E se, além disso tudo, Mike W. Barr e Brian Bolland lidassem, muito além de seu tempo, com questões como diversidade racial e sexual? Simplesmente não dá para parar de ler e só de escrever esse comentário aqui já me dá vontade de catar meu encadernado em inglês para reler essa maravilha!
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XIII
XIII | Jean Van Hamme, William Vance | ?? 1984 – 1999 | Dargaud
Batman: O Cavaleiro das Trevas
The Dark Knight Returns | Frank Miller, Klaus Janson | ?? 1986 | DC Comics
A história definitiva de Batman. A criação máxima de Frank Miller. A HQ que serviria de base para uma revolução dos quadrinhos até hoje seguida pelas grandes editoras, mas nunca verdadeiramente alcançada.
Isso é o que Batman: O Cavaleiro das Trevas significa para o mundo. Para mim, essa graphic novel, publicada originalmente em quatro partes é a razão pela qual eu leio quadrinhos de super-heróis. Impossível esquecer Bruce Wayne envelhecido, aposentado, voltado à ativa mais uma vez para lutar contra o mal usando meios extremamente violentos. Impossível esquecer Carrie, a Robin feminina. Batman à cavalo! A retratação de Jim Gordon! Oliver Queen sem braço!!! A morte do Coringa!!!! O épico espancamento de Superman por Batman!!!!! Ok, deixa eu parar por aqui, senão vocês vão achar que sou fanboy do Frank Miller…
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A Saga do Tio Patinhas
The Life and Times of Scrooge McDuck | Don Rosa | ?? 1992 – 1994 | Egmont
A Liga Extraordinária – Vol. 1
The League of Extraordinary Gentlemen | Alan Moore, Kevin O’Neill, etc. | ?? 1999 – 2000 | America’s Best Comics
A Liga da Justiça Vitoriana criada por Alan Moore e Kevin O’Neill não tem paralelo nas HQs. A quantidade de camadas que o escritor inglês conseguiu colocar em sua obra é impressionante, com citações tanto a obras literárias famosíssimas do final do século XIX como também a uma pluralidade de outras que exigem quase que uma escavação arqueológica para serem descobertas. O primeiro volume é um delicioso e vastíssimo baú de tesouros que merece – exige! – releitura anual para que novos detalhes sejam descobertos e outros sejam relembrados.
E o melhor é que ler A Liga Extraordinária incita a leitura das obras que serviram de inspiração. Desde a obrigatória releitura de 20.000 Léguas Submarinas e Drácula, como, também, o garimpo de todas as outras que estão lá, em cada página, em cada quadro.
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Building Stories
Building Stories | Chris Ware | ?? 2012 | Pantheon Books
Saga
Saga | Brian K. Vaughan, Fiona Staples | ?? 2012 – 2018 | Image Comics
Luiz Santiago
Eu comecei a ler quadrinhos muito cedo, a partir das histórias do Maurício de Sousa. De vez em quado pegava os gibis da Disney, mas gostava mesmo era dos Almanaques do Cebolinha, das histórias do Louco, da Turma da Mônica e do Chico Bento. Na adolescência, fui um viciado (daqueles bem viciados mesmo) nas histórias do Homem-Aranha e dos X-Men. Depois as trevas de Gotham entraram na minha vida e o passo seguinte foi a procura de “quadrinhos que não tivessem super-heróis“, com um novo mundo dentro dessa arte se abrindo para mim. O corte final da lista abaixo foi terrivelmente difícil. Terrivelmente. Obras que amo de paixão como Astro City, Usagi Yojimbo, Dylan Dog, A Queda de Murdock, Blacksad, Dreadstar, Bone e tantas outras acabaram ficando de fora da lista, sem contar que Watchmen acabou perdendo lugar nesse meu TOP 10 da vida, dando lugar a um outro xodó que conheci há poucos anos, a mais antiga citação dentre as HQs abaixo. E agora vou parar de escrever, senão começarei a lamentar por que esta não é uma lista de 50 favoritos… Vamos lá.
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Valérian e Laureline
Valérian | Pierre Christin, Jean-Claude Mézières | ?? 1967 – 2013 | Pilote, Dargaud
Esta fenomenal série da dupla Pierre Christin e Jean-Claude Mézières entrou na minha vida em 2017, quando a Sesi-SP Editora lançou o primeiro volume das histórias compiladas aqui no Brasil. Antes desse momento, eu só tinha ouvido falar que a saga de Valérian e Laureline havia influenciado até o tutano do desenho de produção de Star Wars, mas ainda não tinha lido nada deles. E quando li, foi amor à primeira vista. O princípio tecnológico proposto pelos autores e a soberba forma como eles criaram toda uma linha de exploração do Império da Terra no vasto Universo é coisa para se encantar a cada página virada. Aos que curtem esse traço de abordagem na ficção científica e não conhecem a obra, só digo isso: coram atrás o quanto antes!
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A Trilogia Nikopol
La Trilogie Nikopol | Enki Bilal | ?? 1980 – 1992 | Les Humanoïdes Associés
O sobrenome sérvio do quadrinista Enki Bilal faz qualquer brasileiro (povo que nunca sairá da 5ª série. Nunca!) rir de forma sacana. Eu não conhecia o autor até ler na internet a notícia de que iam lançar A Trilogia Nikopol aqui no Brasil, isso lá por 2012. Ao ler a sinopse da história, me interessei pela ideia de uma distopia nos moldes mais amplos de organização social e geopolítica que se possa imaginar. E fiquei ainda mais impressionado com a sagacidade do autor em emprestar de eventos históricos reais (antes ou em andamento entre os anos 1980 e 1992) para criar a sua aventura.
Eu li os três volume da trilogia em três dias, me segurando para não acabar tudo de uma vez. Cada página era uma surpresa, um ataque, um deus egípcio antropomorfizado, uma sátira a grandes estadistas americanos e europeus, uma busca do indivíduo por ele mesmo em um mundo tenebroso… A trilogia funciona como um retrato exagerado de um futuro fantasioso da Terra, onde muitas coisas parecem ser possíveis. E isso torna tudo ainda mais assustador.
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O Incal
L’Incal | Alejandro Jodorowsky, Moebius | ?? 1981 – 1988 | Les Humanoïdes Associés
O Incal é, sem sombra de dúvidas, o maior épico sci-fi dos quadrinhos. O que Jodorowsky e Moebius fazem com a concepção de tempo, viagens espaciais, humanismo, misticismo, filosofia, magia, religião, tarô e inúmeras outras manifestações culturais e comportamentais aliadas à ficção científica é algo simplesmente inesquecível. Já no primeiro volume da saga, O Incal Negro, eu entrei em um estado de graça que durou a leitura de todos os outros tomos. E o final, com a fixação de um loop temporal, me deixou de queixo caído. Sabe quando você lê o final de uma série e fica rindo sozinho, com cara de besta, olhando para o nada, com o livro na mão? Então, eu estava exatamente assim (ao cubo) quando terminei a leitura do sexto livro do Incal, o que me fez reiniciar a leitura da mesma edição, para não deixar escapar nada e reviver tudo de novo. Que viagem!
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Os Companheiros do Crepúsculo
Les Compagnons du Crépuscule | François Bourgeon | ?? 1984 – 1990 | Casterman
Fui apresentado (quase forçado a ler) a Os Companheiros do Crepúsculo em um momento bastante propício, durante a pesquisa e escrita de um trabalho sobre a Guerra dos 100 Anos na faculdade. Meu recorte era para produções que retratassem o momento e eu acabei ficando apenas com o cinema. Mas foi aí que comecei a ler essa saga de Bourgeon e, quando terminei o primeiro livro da trilogia, O Sortilégio do Bosque das Brumas, deixei o cinema de lado e fiz um trabalho apenas sobre esta saga, tamanha a riqueza e excelência com que o autor constrói sua história dentro desse período.
Tudo em Os companheiros do Crepúsculo transpira História (factual, crítica ou fantasiosa). O trânsito entre a mentalidade medieval (com todos os seus medos, lendas e imaginário popular) e a nova era vinda com o fim da Guerra é mostrada tanto em detalhes visuais — e a riqueza dos desenhos é tão absurda que choca. Bourgeon era artista de vitrais de catedrais, só para vocês terem uma noção — quanto em elementos que de fato aconteceram ou fizeram parte de uma literatura e narrativa oral da Idade Média. A trama tem gnomos, batalhas, vilas e feudos, laços de suserania e vassalagem, viagens épicas e por aí vai! É a abordagem mais criativa em HQ sobre a Idade Média que eu já tive a oportunidade de ler!
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O Monstro do Pântano de Alan Moore
The Saga of the Swamp Thing | Alan Moore, etc. | ?? 1984 – 1987 | DC Comics
Três dos meus personagens de quadrinhos favoritos só entraram de verdade na minha vida por causa do meu velho parceiro Ritter Fan: Dreadstar, Monstro do Pântano e Homem Animal, sobre o qual falarei logo abaixo. Foi no final de 2012, e Ritter estava escrevendo este compilado aqui, a primeira vez que o PC publicava análises rápidas para vários quadrinhos numa única postagem. A gente conversou bastante sobre os títulos, se deveríamos escrever ou não sobre essas séries, e ele me sugeriu que eu lesse a revista do Pantanoso e a do Homem Animal, pois elas “tinham coisas estranhas que eu ia gostar“. Maldito Ritter! Eu nunca tinha lido nada de nenhum dos dois personagens e para mim foi inacreditável ver tanta coisa diferente em personagens de uma editora que eu achava que conhecia tão bem. Imediatamente comecei a catar todo o baú das revistas clássicas do Musguento e foi uma paixão que só cresceu com o passar das leituras, cristalizado-se de modo indescritível nesta obra-prima que é a fase de Alan Moore à frente do personagem. Uma inesquecível revolução.
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O Homem Animal de Grant Morrison
Animal Man | Grant Morrison, Chaz Truog | ?? 1988 – 1990 | DC Comics
E aqui vamos ao complemento do comentário acima. Enquanto eu lentamente acompanhava as mensais do Homem Animal dos Novos 52, Ritter me preparava uma outra armadilha. Dessa vez, uma ainda mais mortal. Ele me deu de presente o calhamaço The Animal Man Omnibus, que compila toda a fase de Grant Morrison à frente do personagem. Como tinha pouquíssima coisa do Bichoso publicada antes dessa fase, fiz o serviço de casa completo, li e escrevi sobre as primeiras aventuras do herói, e entrei logo em seguida nessa jornada incrível iniciada por Morrison em 1988. Minha sensação foi a de redescobrir os quadrinhos mais uma vez, e acho que temos esse tipo de choque toda vez que lemos algo que gostamos tanto e que provavelmente entrará para a nossa lista de favoritos dali para frente. Foi o meu caso aqui. Uma jornada que me levou a ler todo o material solo do personagem e nutrir por ele um carinho que o coloca no meu panteão de favoritos, sendo esta fase, a minha adorada dentre essas aventuras.
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Tex Willer: Série Especial
Speciale Tex | Nizzi, Boselli, etc. | ?? 1988… | Bonelli
Eu gosto muito de Tex, e dele, leio as várias séries publicadas aqui no Brasil, não tendo nenhuma da qual eu desgoste. Tinha, porém, que escolher apenas uma linha editorial para constar na lista, pois estaria burlando as regras (e sendo sacana com meus colegas) se citasse apenas o personagem no título, como se ele tivesse apenas uma base de publicações, o que não é verdade. Então consegui chegar à minha favorita: uma linha de álbuns especiais também chamados de “Texone” ou “Albo Speciale“. É uma série fantástica, com tramas que mergulham no Velho Oeste trazendo as mais diversas situações para o ranger. Me faz lembrar bastante do meu avô, que foi quem me apresentou ao Tex. Toda vez que leio algo do personagem há um prazer duplo durante a leitura: o fato de estar com uma história de qualidade em mãos e o fato de estar diante de um personagem que me lembra um dos meus heróis da vida.
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Júlia Kendall: Aventuras de uma Criminóloga
Le Avventure di una Criminologa | Giancarlo Berardi, etc. | ?? 1998… | Bonelli
Minha descoberta de uma série de quadrinhos em uma antiga coleção de família, nas férias de 2017, me colocou em contato com inúmeros títulos da Sergio Bonelli Editore que eu ainda não conhecia, e Júlia estava entre eles. A saga dessa criminóloga é uma das coisas mais instigantes, medonhas, interessantes e bem escritas que eu já acompanhei a longo prazo em uma HQ, um giallo que mescla psicologia, crimes dos mais diversos tipos e uma protagonista que nos encanta e nos surpreende a cada edição. Uma verdadeira pérola que merecia muito mais reconhecimento.
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Daytripper
Daytripper | Fábio Moon, Gabriel Bá | ?? 2010 | Vertigo
De todas as favoritas desse TOP 10, Daytripper é a que mais apelo pessoal/sentimental tem para mim. Ela não só é favorita porque é uma excelente história. Mas também porque toca em questões particulares específicas de muitos dos meus anos de vida, quase como a história do narrador/personagem que acompanhamos ao longo das edições. E isso é tudo o que eu consigo escrever sobre ela. Muito amor por essa história.
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A Arte de Charlie Chan Hock Chye
The Art of Charlie Chan Hock Chye | Sonny Liew | ?? 2015 | Epigram Books
Um quadrinho sobre a arte de fazer quadrinhos. Esta é uma das coisas mais criativas, em termos de metalinguagem, que eu já li em HQ. Comprei o volume em uma promoção e deixei na estante por um tempo, enquanto diminuía uma pilha grande de outras obras. Foi no finalzinho de 2019, uma semana antes de fechar as minhas escolhas para As Nossas Melhores Leituras em 2019: Quadrinhos, que eu li, embasbacado, essa preciosidade — por sinal, ficou em 1º lugar dentre as minhas leituras do ano passado. Grande variedade artística e narrativa, uso da dinâmica dos quadrinhos para contar uma história original e ainda trabalhar a História de um país + a engenhosidade de manipular o leitor sobre aquilo que ele está vendo formam a base desta obra-prima. Um daqueles volumes que você tem vontade de pegar para reler só de começar a falar ou pensar sobre ele.
Davi Lima
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Spider-Man!
Amazing Fantasy #15 | Stan Lee, Steve Dikto | ?? 1962 | Marvel Comics
Acho que todo fã de quadrinho devia ler essa edição escrita por Stan Lee. Não apenas por ser a origem de um dos maiores super-heróis do século 20 até hoje, mas por toda a dramaticidade, toda a construção social engajada em um ser humano que não teria apenas poderes, mas caráter para saber suas responsabilidades. Se Dikto consegue propor emoções e agilidade no desenho, Stan sabe fazer a novelinha básica que impacta de uma só vez. Desde que Sam Raimi colocou o Homem-Aranha nas telas de cinema, o fascínio por saber a origem do Aranha nas HQs me levou a essa edição primária, sendo extremamente viciante de se admirar. Uma obra histórica.
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Capitão Britânia
Captain Britain | Alan Moore, Alan Davis | ?? 1982 | Marvel Comics
Simplesmente perturbado e frenético, foi isso que me fez apaixonar pelo Capitão Britânia, fora seu visual que Alan Davis criou. Na verdade, isso é mais culpa do pouco espaço das poucas 8 páginas, sobre ser louco e psicodélico. Chris Claremont pode ter ajudado na definição do personagem, mas foi Alan Moore, com sua cabeça inventiva, quem encontrou a normalização patriótica que tornou a aventura do Bretanha uma completa loucura medieval, de magia e de frases filosóficas sobre a sociedade. No começo é bem ruim, mas Moore vai matando seu herói e renovando-o em poucas páginas para acrescentar a suas ideias mirabolantes. Contendo: Marvel Super-Heroes #377 – 388, The Daredevils #1 – 11 e The Mighty World of Marvel Vol.2 #7 – 13.
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A Piada Mortal
Batman: The Killing Joke | Alan Moore, Brian Bolland | ?? 1988 | DC Comics
Até hoje a risada final, a piada mortal em si entre o Batman e o Coringa fica na minha mente como um final ambíguo e poderoso. É isso que torna o trabalho de Moore tão forte para os olhos de quem lê. A mente do vilão extrapolada para a resolução da história, em que há a origem do Coringa e a violência de sua mente, promove indignação que Batman se submete a chantagem e nós leitores nos impressionamos em como o mundo desenhado Brian Bolland se torna assustador pelo aspecto realista do traço. De fato, quando se lê fica difícil não ficar assustado com a capacidade que uma história em quadrinhos poder chegar a um alto nível de violência sem ser tão gráfica.
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Inconcebível
Fantastic Four: Unthinkable | Mark Waid, Mike Wieringo | ?? 2005 | Marvel Comics
Sempre admirei a família Quarteto Fantástico de longe. Nunca havia lido HQs ou acompanhado a história na Marvel. Porém, com ajuda da Salvat e suas compressões de grandes histórias em encadernados, esse arco de magia X ciência, ou magia & ciência, escrito por Mark Waid, soa profundamente atemporal por não só desenvolver Reed Richards e Victor Von Doom numa batalha filosófica, como atemporalmente distribuir em um arco uma resolução para a relação que o vilão tem com a família. Se Victor não tem família, ou tem uma paixão não concebida, Reed tem tudo isso. Parece clichê, mas dentro dessa dinâmica da magia que absorve energia e a ciência que transforma, narrativamente Waid vai refletindo sobre como Reed precisa cuidar dos seus e Victor precisa saber viver em sua realidade. Sem dúvida, com esse arco respeitou minha admiração pela família Marvel.
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Asa Noturna Vol.3
Nightwing Vol.3 (New 52) | Kyle Higgins, Eduardo Barros | ?? 2011 – 2014 | DC Comics
Em geral, os Novos 52 não é um projeto muito bem visto, pois cai naquela lógica de que após um reboot já será exigido uma novo reboot. Para muitos leitores, porém, isso foi um começo de algo. Para mim, foi a paixão pelo Asa Noturna. Se ele já era um personagem muito legal nas animações, especialmente em Young Justice, na HQ a personalidade de Dick Grayson é muito bem descrita por Kyle Higgins, tendo numa edição a descrição do por que Grayson sempre foi e sempre será a opção mais sensata para ser um futuro Batman, mesmo que Bruce e Dick sejam bem diferentes quando se trata de entender a morte dos pais. Para alguns, pode ser uma chatice que nem o desenhista brasileiro consiga empolgar com a ação da série, mas para outros, ver como o Asa Noturna se tornar herói em Chicago, nas últimas edições da série, e se sacrificar para o heroísmo, é de se admirar.
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Cavaleiro da Lua: Scarlet
Moon Knight Vol.7 #5 | Warren Ellis, Declan Shalvey | ?? 2014 | Marvel Comics
Não é por ignorar todo o volume que Warren Ellis reinterpretou o personagem “batimesco” da Marvel, mas sim por valorizar demais a capacidade que Ellis deu ao Cavaleiro da Lua em ter um caráter refinado e desapegado, misantrópico como um todo. Sua figura vestida de paletó e gravata, um ser estiloso completamente branco que chega a um prédio com um limusine. Essa edição em especial é inesquecível, e destaco como Declan parece exercitar um filme desenho, onde nada mais importa que a ação e a forma inesperada que o protagonista vai derramando sangue. São andares e mais andares que o Cavaleiro vai enfrentando de capangas, alcançando seu objetivo de maneira empática, até mesmo usando uma máscara. Fica difícil descrever o quão silenciosa e barulhenta é essa edição.
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Gavião Arqueiro Vol.4
Hawkeye Vol.4 | Matt Fraction, David Aja | ?? 2012 – 2015 | Marvel Comics
Lembro bem de ver as indicações anuais de HQs no Omelete e li a descrição sobre uma série premiada com Eisner sobre o Gavião Arqueiro. Intrigou-me profundamente ser sobre aquele personagem, e quando comecei a ler toda a banalidade de tratar um herói sem poderes com uma estilização simples de David Aja, vi no texto de Fraction um misto de imersão social do cotidiano de Clint Barton misturado com uma comédia de erros sobre lutar contra a máfia. E no processo defender um prédio recheado de pessoas, acompanhar uma edição em Língua Americana de Sinais, uma outra com a percepção de um cachorro e ainda conhecer a parceira Bishop, a Gaviã Arqueira. Sem dúvida é difícil parar de ler. Nos dramas e no humor sagaz de Fraction ou você se apaixona por Clint Barton, ou lê o suficiente para entender é uma HQ muito indie para leitores de grandes Sagas.
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Guerras Secretas
Secret Wars | Jonathan Hickman, Esad Ríbic | ?? 2015 – 2016 | Marvel Comics
Infelizmente não acompanhei a construção de Guerras Secretas em Vingadores e Novos Vingadores, com intrigas históricas durante a cronologia dos heróis da Marvel, desenvolvendo uma cisão no cosmo, no tecido da realidade alterado pelas incursões da equipe de Vingadores durante seus atos no espaço e na terra. Aqui, a arte de Esad Ríbic a grandiloquência shakespeareana do texto de Hickman tomam cada splash page ou fisionomia dos personagens. Uma guerra do Multiverso acontece fora do castelo do poderoso Doutor Destino, enquanto Reed Richards precisa recuperar sua esposa. Como se não bastasse a trama palaciana paralela e reviravoltas na guerra com o Coisa gigante, Pantera Negra com Manopola do Infinito e Thanos fragilizado, Hickman ainda circunda seu texto com um linguajar filosófico, talvez com citações a Hamlet. Não parece pedante graças a arte das edições, com capas de Alex Ross, que vão tornando esse texto um bálsamo bem casado. Poderia ser só uma destruição da realidade, um mero reboot de grandes sagas reaproveitando o nome de outra comercialmente efetiva, mas Hickman valoriza a grandiosidade como uma narrativa, não apenas a imagem ou a ação.
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Viúva Negra Vol.6
Black Widow Vol.6 | Mark Waid, Chris Samnee | ?? 2016 | Marvel Comics
Quando eu li uma primeira edição que era basicamente Natasha caindo com estilo de um porta-aviões, eu percebi que Mark Waid tinha planos realmente inventivos com a Viúva Negra. Ao longo das edições não era sobre a história que era boa de fato, mas como Waid e Samnee tinham uma harmonia vindo de outras HQs, em como cada quadro da página contava bem mais que vários diálogos, e cada cena de ação parecia sair de uma cena de filme com uma montagem quase perfeita. A história em si é como a de James Bond, mas à maneira introspectiva de Natasha. Chega a um topo absurdo, porém não perde a forma articulada de entregar cada parte da saga.
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Pouco Pior Que Um Homem, Pouco Melhor Que Um Animal
Vision: Little Worse Than A Man, Little Better Than A Beast | Tom King, Gabriel Hernadez Walta | ?? 2016 | Marvel Comics
Não lembro se vi o filme Beleza Americana antes ou depois de ler essa quase obra-prima de Tom King, mas é difícil não relacionar as duas produções artísticas. A cada página desenhada por Gabriel Walta o sentimento de calma e simplicidade contrasta com o roteiro objetivo e constantemente cínico. Não é nem um suspense, nem um drama, soa como um Universo alternativo de uma família de robôs que tem muita emoção. Inexplicável como Tom King articula tanta raiva de personagens frios, tanta paixão por imaginação e brutalidade na realidade. Lembro bem que chorei ao ler a edição que remonta o mundo do Visão paralelo ao seu passado com Wanda Marximoff, a Feiticeira Escarlate. A falta em meio a tanto complemento visual é o que torna essa crítica clássica e clichê ao American Away of Life algo inevitavelmente doloroso de se acompanhar como reflexo de uma boa história.
Rodrigo Pereira
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Watchmen
Watchmen | Alan Moore, Dave Gibbons | ?? 1986 – 1987 | DC Comics
Provavelmente o quadrinho que mais tive vontade de ler em toda a vida, e o que mais esperei para conseguir acesso a uma edição definitiva e em português. Após desistir de conseguir uma cópia em português, investi em uma no idioma original por não aguentar mais a ansiedade para ler. Não preciso dizer que foi uma escolha acertadíssima, não é? É até difícil expressar em palavras a grandiosidade dessa obra. Alan Moore não é referenciado à toa e Watchmen é a prova mais do que cabal disso.
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Homem Animal: O Evangelho do Coiote
The Coyote Gospel | Grant Morrison, Chaz Truog | ?? 1988 – 1989 | DC Comics
Lembro que foi Luiz Santiago (o tirano, digo, editor-chefe deste humilde site) o responsável pelo meu interesse nessa história. Já tinha ouvido falar vez ou outra do personagem, não mais do que isso. Afinal, o que haveria de tão interessante nas histórias de um super-herói que se transforma em animais? Grant Morrison torna isso muito mais do que interessante e traz debates até mesmo sobre a própria nona arte, com direito a metalinguagem e tudo. Essencial!
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Demolidor: Diabo da Guarda
Guardian Devil | Kevin Smith, Joe Quesada | ?? 1998 – 1999 | Marvel Comics
Essa foi a primeira história que li de nosso querido Homem Sem Medo. Toda a trama cheia de dúvidas e ambiguidades, que desafia até mesmo os sentidos extremamente apurados de nosso herói, e os dilemas religiosos e morais que o acometem são maravilhosos. Isso sem falar naquela incrível cena da igreja. Quem leu, sabe. Quem não leu, leia e se deleite.
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Quem é o Pantera Negra?
Who is the Black Panther? | Reginald Hudlin, John Romita Jr. | ?? 2005 | Marvel Comics
Se em Uma Nação Sob Nossos Pés temos elementos políticos como parte central da trama, Quem é o Pantera Negra? também traz isso, mas com mais espaço para demais questões. Por exemplo, a origem tanto do Pantera Negra quanto de T’Challa são abordadas de formas bastante interessantes. Isso sem contar a moto voadora incrível pilotada pelo herói. O Batman que me perdoe, mas o batmóvel não tem nem chance.
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Guerra Civil
Civil War | Mark Millar, Steve McNiven | ?? 2006 – 2007 | Marvel Comics
Uma das grandes sagas, talvez até a maior, da Marvel Comics. Com uma qualidade igualmente gigante. Se os embates que aconteceram nos filmes já foi tido como algo grandioso, Guerra Civil nos quadrinhos toma proporções indescritivelmente maiores, colocando frente a frente boa parte dos personagens tão queridos da editora. Um prato cheio para quem, assim como eu, adora essas histórias.
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Homem-Aranha Noir
Spider-Man Noir | David Hine, Sapolsky, Giandomenico | ?? 2009 | Marvel Comics
Essa é disparada a minha história favorita do Amigão da Vizinhança. Achei sensacional o trabalho realizado pelo trio Hine, Sapolsky e Di Giandomenico de levar todo o universo do aranha para as primeiras décadas do século passado e reimaginar toda a origem do personagem no período das Grandes Guerras Mundiais. Além da roupa bastante diferente e dos poderes terem uma explicação mais mística, essa é uma versão mais adulta, amargurada e brutal de Peter Parker, em que vemos ele (assim como outros personagens) matar a sangue frio sem grandes rodeios. Simplesmente sensacional.
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Daytripper
Daytripper | Fábio Moon, Gabriel Bá | ?? 2010 | Vertigo
Daytripper é uma obra-prima. Mesmo que não o fosse, eu já teria um grande apreço pelo livro porque a edição que tenho foi um presente de uma pessoa muito querida e importante para mim. Mas o que Fábio Moon e Gabriel Bá fizeram não pode ser definido de outra forma que não obra-prima. Devorei a história inteira em poucas horas de uma tarde de domingo e até hoje tenho vontade de relê-la, algo que não o faço pois foi a primeira e única obra literária que me fez chorar. Muito. Lerei novamente, com certeza, mas só quando estiver pronto para isso.
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Deadpool: Meus Queridos Presidentes
Dead Presidents | Brian Posehn, Duggan, Moore | ?? 2013 | Marvel Comics
De todas as histórias da lista, essa é, sem dúvidas, a que mais me faz rir. Gente, é o Deadpool sendo completamente sem noção (ou seja, ele mesmo) enquanto mata versões zumbis de presidentes dos Estados Unidos. Eu realmente preciso dizer mais alguma coisa?
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Pantera Negra: Uma Nação Sob Nossos Pés
A Nation Under Our Feet | Ta-Nehisi Coates, Stelfreeze, Sprouse | ?? 2016 – 2017 | Marvel Comics
Se Diabo da Guarda foi o primeiro quadrinho que li do Demolidor, Uma Nação Sob Nossos Pés foi o primeiro que li de nosso rei wakandiano favorito (sim, comecei a ler quadrinhos há não muito tempo). E só posso dizer que é minha história favorita do personagem. Coates traz elementos políticos e morais de forma que muito me agradam e casam especialmente bem com o Pantera Negra, fazendo com que reflita sobre diversas questões pessoais e sobre quais rumos uma nação deve tomar.
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Contos dos Orixás
Contos dos Orixás | Hugo Canuto | ?? 2018 | Independente
Uma obra que traz toda a divindade dos orixás para os quadrinhos com uma arte absolutamente encantadora e que presta uma digníssima homenagem a Jack Kirby. É sobre isso que se trata esse grande trabalho desenhado e roteirizado de forma totalmente independente pelo artista Hugo Canuto. Sério, quem puder, leia essa história. É maravilhosa e nos deixa demais com gosto de quero mais.