Curitiba e o Olhar de Cinema
Entre os prós e contras de todo festival de Cinema, metrópoles como São Paulo (Mostra de SP), Rio de Janeiro (Festival do Rio) são bem diferentes de cidades pequenas como Cannes ou Tiradentes. Enquanto o segundo tipo parece respirar em sinergia com o festival, vivendo em prol dele, no primeiro é preciso lidar com a realidade de que há outras milhões de pessoas vivendo a sua vida cotidiana paralelamente ao evento cinematográfico. Por isso, seria até injusto cobrar que Curitiba estivesse com “um clima de festival” de Cinema.
Apesar disso, a organização do festival Olhar de Cinema fez o possível para proporcionar esse clima gostoso, afunilando o seu perímetro ao propor uma triangulação entre seus três principais Cinemas (Cine Passeio, Cinemark do Shopping Mueller e Cinemateca de Curitiba), todos localizados muito próximos um do outro e também do hotel em que estão hospedadas as pessoas ligadas ao evento (críticos, realizadores, júris, convidados, imprensa em geral, etc.).
Adotando como ponto central da bússola o Cine Passeio, cada um dos outros pontos (contando também o hotel) dá uma caminhada de aproximadamente 10 minutos em direção a Norte, Leste e Oeste, além do fato de que há uma van com horários fixos que leva os convidados entre esses pontos. Em adição, há outras duas localizações mais distantes desse núcleo de cinema, o Museu Oscar Niemeyer e o Teatro da Vila, que se expandem para outros lugares da cidade, mas que não foram frequentados por mim durante essa cobertura.
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Shopping Mueller, Cine Passeio e Cinemateca de Curitiba
Entre esses locais de exibição, vale destacar, por conta de seu simbolismo e efeito prático, principalmente a presença do Cinemark no Shopping Mueller. O fato de um festival de Cinema conseguir adentrar em um shopping, saindo de uma reclusão aos espaços cinéfilos e permitindo que um público casual que foi dar um passeio possa se deparar com eles ao acaso ou só pelo fato de já estar ali, é um grande feito. E que esses espaços possam estar passando filmes completamente alternativos, e aqui digo em lato sensu, seja geograficamente (filmografias diferentes), em formato (uma sessão de curtas exibida em um shopping!) ou tematicamente (filmes LGBTQIA+ ou raciais), também é uma grande oportunidade de ocupação. Objetivamente falando, o Cinemark do Shopping Mueller é igual a qualquer cinema multiplex, com a exceção de que para o festival foram colocados banners do festival e uma equipe de voluntários ajudando.
Já o Cine Passeio possui duas salas de Cinema, uma em cada andar, além de um café com boas opções de lanche (pessoal, aqui é o Luiz falando: na primeira versão deste In Loco, o Sr. crítico Michelitto enviou a foto do lanche — algo imensuravelmente colossal, capaz de alimentar uma família cazaque inteira! — mas provavelmente ficou com vergonha e não adicionou a foto do lanche na segunda versão. Podem cobrá-lo nos comentários!) e também sendo o lugar em que se faz a retirada dos ingressos e do credenciamento para crítica, mais um estande que é a “lojinha” oficial de produtos do Olhar, com produtos como camisas, catálogos e ecobags. É neste espaço que parece existir o maior “ambiente de festival de cinema“, por sua capacidade de concentração, que reúne em um pequeno espaço diversas pessoas, muitas saindo de um filme e outras esperando a entrada de outro. Inclusive, perto do Cine Passeio, há a disponibilização de uma sala de imprensa, que não foi particularmente utilizada por mim, mas fui uma vez para conhecer e pode ser vista nas fotos abaixo.
A Cinemateca de Curitiba possui o bônus de poder visitar seu hall, que reúne alguns artefatos históricos, principalmente câmeras, que estão em exibição, assim como revistas antigas de Cinema que são uma nostalgia à parte. No entanto, fazer uma sessão dupla ou tripla no local (o que é normal em festival) não se mostrou uma boa opção, pois ele só possui um banheiro individual e, principalmente, a única opção de bebida ou alimentação é um mísero de um bebedouro, com seu ao redor parecendo completamente vazio — o que ficou pior ainda no meu caso em específico, em que decidi pegar uma sessão tripla no Domingo. Com tudo deserto, desisti das duas últimas sessões justamente pela impossibilidade de lugar para tomar café e lanchar depois da primeira sessão e antes das outras.
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Exibições dos filmes e programação
Em termos de exibição dos filmes, todas as salas dos três lugares são perfeitamente adequadas, seja em conforto de cadeira e qualidade de imagem/som. Vale destacar o cuidado especial com toda a sessão, pois antes delas há sempre um dos curadores do festival (às vezes creio que eles usam o vira-tempo de Hermione Granger em Harry Potter e o Prisioneiro de Azkaban para estarem em mais de um lugar ao mesmo tempo) dando uma contextualizada no filme e localizando em qual Mostra ele faz parte.
Além disso, algumas sessões contam com trechos de vídeos de entrevista com o diretor sendo exibido na tela (como foi o caso de Kiro Russo e Su Friedrich, dois homenageados), enquanto outras contam com a presença física dos próprios envolvidos nos filmes, que também dão suas palavras (é o caso da maioria dos filmes brasileiros, como a presença de Rodrigo de Oliveira e Johnny Massaro na sessão de Os Pequenos Soldados; Marcello Lordello e Marco Ricca em Paterno; Marcus Curvelo e Murilo Sampaio em Garotos Ingleses etc.). Vale destacar brevemente também a preocupação do festival, em sua sessão de abertura, que contou com a palavra do diretor do evento, a presença de um tradutor de libras simultâneo.
Cada filme é exibido duas vezes e, a não ser por raras exceções, a grade do Festival parece programada para que uma pessoa consiga fazer no máximo quatro sessões por dia (esse é o número de ingressos que a crítica recebe, por sinal), com os quatro horários começando na faixa de: 13h45-14h30 (primeiro horário); 16-17h (segundo horário); 18h-20h (terceiro horário); e 21h-21h45 (quarto e último horário). Pela proximidade já mencionada entre os locais, não é impossível fazer as quatro sessões por dia em cinemas diferentes, ao invés da concentração em um só cinema, ainda que seja preciso andar a passos rápidos e chegar em cima das sessões, o que faz absolutamente parte da aventura de cobrir um Festival.
Ainda assim, caso alguém decida ver os seus quatro filmes do dia em um único lugar, vale destacar como o Olhar de Cinema possui o dedo da curadoria muito forte em sua montagem, o que é completamente diferente de um festival como o do Rio de Janeiro, com suas sessões montadas aleatoriamente. Há um exímio trabalho a ser exaltado aqui; um trabalho de pensar as exibições dos filmes como “um única grande sessão”, de modo que diálogos sejam criados pela ordem entre os filmes exibidos. Por exemplo, dois filmes da Mostra Competitiva, Freda e A Ferrugem, em suas duas chances de vê-los, foram colocados um seguido do outro, de modo que qualquer um que assisti-los pode pensar em diversos paralelos entre os dois filmes — e claro, quem assistir só um, terá a experiência normal do filme em si.
No mais, histórias de viagem, relatos cômicos e trágicos, encontros fortuitos maravilhosos, percepções pessoais do festival Olhar de Cinema, curadoria dos filmes e muito mais aventuras e desventuras de um crítico trabalhando em um evento como estes estarão em um texto que publicarei aqui no Plano Crítico logo após o encerramento do Olhar, cabendo aqui apenas uma aproximação mais objetiva, até para um público que não conhece como é a a dinâmica de um festival. Espero que tenha dado para sentir um gostinho, pelo menos. Nos vemos no Fora de Plano sobre esse evento. E não deixem de ler as críticas que estão entrando no site durante a cobertura! É só clicar aqui!