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Fora de Plano #15 | O HOAX nosso de cada dia

por Luiz Santiago
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Ultimamente eu tenho me deparado com inúmeros textos bastante raivosos na internet — de redes sociais a blogs e canais do youtube — que lembram as consequências da minha detenção fictícia na adolescência. Pessoas que muitas vezes esbarram com um HOAX, com imagens montadas pelos revolucionários de sofá que militam em redes sociais com teorias, denúncias e supostas constatações que uma pesquisa básica faria qualquer um derrubar as tais ideias facilmente. Mas as pessoas têm escolhido acreditar. E pior: reproduzir as tais ideias falsas como se fossem verdade.

Sabe quando você está no primeiro ano da faculdade e tem aquela disciplina chamada Metodologia do Trabalho Científico? Então. Trata-se de uma disciplina que deve te ensinar ao menos o básico sobre princípios de ciência, de História da Ciência, de pesquisa científica e métodos científicos. Qualquer pessoa que tenha passado dessa fase ou que tem um enorme bom senso ou leu bastante sobre o tema, deve ter o mínimo de ideia como se faz análise e divulgação de dados, produção e leitura de conhecimento. Isso dá base para um indivíduo saber lidar com a dissonância cognitiva de forma que não precise recorrer a migalhas pinçadas do facebook e parágrafos aleatórios de uma tese escrita em sindarin e traduzida para o élfico arcaico atestando segredos que só se sabem às portas fechadas em alguma alcova de Mordor.

lua

Hum… esse jornal aí, sei não, hein! Não parece verídico…

Existem visões de mundo e interpretações de dados que as pessoas simplesmente viajam em suas paixões pessoais (ou fazem isso só pra trollar mesmo) e criam ou acreditam em versões duvidosas que supostamente foram comprovadas por fotografias, vídeos, professores de várias Universidades do mundo inteiro e anos e anos de pesquisa em um lugar tal. Vamos a alguns exemplos?

Que tal aquele documentário que passou no Animal Planet sobre as sereias encontradas em vários oceanos pelo mundo? E aquele teste, comprovadíssimo pelos mais conceituados psicólogos, que se você responder que “a jovem matou a irmã esperando que o cara que ela conheceu no enterro da mãe voltasse a aparecer” você pensa como um psicopata? E o alzheimer de Jack Nicholson? E os seis dedos da Daniella Cicarelli? Os deuses astronautas? O design inteligente? As linhas aliens nos milharais? A homeopatia e a recusa de qualquer “químico burguês capitalista”? As comprovações mais que evidentes de que o III Reich não era racista e que o holocausto jamais existiu? E a chegada do homem à Lua, então? Os crânios gigantes de aliens que os cientistas escondem sabe-se lá por que? A evidente e comprovada contaminação que as pessoas (especialmente crianças e adolescentes) têm ao ver duas pessoas do mesmo sexo se beijando?

[Bom, pelo menos nesse caso eles podem se descontaminar vendo duas pessoas de sexo oposto se beijando. Mas é preciso tomar muito cuidado para não deixá-las ver dois gatos se lambendo, dois cachorros se cheirando, senão vão querer imitar também…].

hoax

Uma foto verídica de Elvis montado em um Monstro do Lago Ness, com seu amigo Pé Grande, vigiado por um disco voador.

A forma mais conhecida do HOAX é a do boato massivo. Mas muitas vezes ele ganha estruturas pseudo-científicas e passa a guiar a vida das pessoas a partir desse ponto. Tem gente assistindo mockumentary e achando que o que vê é verdade. Tem gente que não checa informações que recebe, que não questiona dados positivos ou negativos sobre qualquer coisa, que não analisa contextos e se recusa a entender o processo de produção, checagem ou descoberta de qualquer dado, especialmente em ciência. Quer fazer um teste? Pegue um documentário qualquer sobre temas polêmicos e pesquise o nome dos professores, cientistas e outros profissionais entrevistados e o nome das Universidades ou Instituições onde eles trabalham. Você terá surpresa atrás de surpresa.

Ler, comparar dados, pesquisar fontes diferentes daquelas que você sabe que vai dizer o que você gostaria ouvir ou ler, usar o princípio da explicação mais simples para dados que comportam eventos empíricos (Navalha de Occam neles!) e ter cuidado ao compartilhar coisinhas na internet podem ser passos iniciais para você não pautar seu cotidiano por achismos ou realmente acreditar em coisas que lhes foram vendidas como ciência, verdade política ou “caminho certo da vida” mas na verdade é história para boi dormir.

livros

Dois livros para expandir suas ideias a respeito deste tema: O Mundo Assombrado Pelos Demônios (Carl Sagan) e Por Que As Pessoas Acreditam em Coisas Estranhas (Michael Shermer).

Ler e pesquisar dá trabalho? Não tá muito a fim? Tem preguiça maligna no seu corpo? Veja, ninguém é obrigado a agir como um indivíduo crítico se não quiser. Todo mundo pode achar o que quiser sobre tudo, compartilhar ou divulgar o que quiser a respeito de qualquer coisa. Só que esse padrão te dá uma passagem só de ida para a terra da alienação. Porque você acaba não tendo assunto pra discutir sobre o tema com ninguém, ainda mais defender tais ideias com unhas e dentes, porque elas são baseadas em achismos, reducionismos, visões parciais, ausência de dados, etc. Nessa situação, é melhor pegar sua cestinha de cetim rosa e colher tulipas para seu unicórnio. Afinal, a gente sabe que ninguém acredita em pseudo-ciência, em pseudo-informação ou em escabrosas teorias da conspiração por maldade. Como já dizia alguém (Hanlon, dentre estes), Nunca atribua à maldade o que pode ser adequadamente explicado pela burrice.

  • A propósito, vocês sabiam que os vikings não usavam chifres nos capacetes, pelo menos até 1876, com a montagem de O Anel dos Nibelungos, ópera de Richard Wagner, cujos figurinos tinham capacetes com chifres? E aí, vai acreditar ou checar a informação?

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