Home Colunas Entenda Melhor | Featurettes Para Compreender Wes Craven

Entenda Melhor | Featurettes Para Compreender Wes Craven

Um panorama de curiosidades e reflexões sobre os bastidores dos filmes de Wes Craven.

por Leonardo Campos
611 views

Um bom diretor de cinema é aquele que rege narrativas cinematográficas diversas e mesmo que esteja dentro de um circuito sufocante de manipulação do material final, deixa de alguma forma, a sua marca registrada. Wes Craven não foi um diretor perfeito, mas quando acertou, entregou ao campo da história do cinema algumas das narrativas mais impactantes que já conhecemos. Mestre dos detalhes, flertou com temas mais brandos no curioso Música do Coração, mas a sua marca maior mesmo é o terror, gênero conhecido por debater questões constantemente conflitantes em nossa sociedade. Em sua trajetória, Wes entregou marcos consideráveis, tais como A Hora do Pesadelo e o sarcástico Freddy Krueger, o quase super-homem nietzschiano de Ghostface na franquia Pânico e o clã macabro e aterrorizante de Quadrilha de Sádicos, produções que nos permitem o perdão diante de narrativas menos interessantes ou prejudiciais ao seu legado, como por exemplo, Shocker – 100 Mil Volts de Terror e Amaldiçoados. Os featurettes a seguir não apenas deflagram características do jeito de filmar de Wes Craven, mas são também lições sobre o instigante processo de realização cinematográfica.

O Making-of de A Hora do Pesadelo

Quando criança, Wes Craven tinha muitos pesadelos. Em sua carreira, o cineasta trouxe diversos elementos de sua biografia para compor personagens e situações marcantes, dentre eles, um de suas criações mais icônicas, Freddy Krueger, antagonista da franquia A Hora do Pesadelo, assinada pelo diretor apenas no primeiro e no sétimo filme, ambos ótimos exercícios da linguagem cinematográfica, obras-primas do terror, clássicos memoráveis de um circuito de produção artística que vai muito além que apenas entreter. Faz refletir e debate temas que ainda são muito contemporâneos e subjetivos. O Making-of de A Hora do Pesadelo, em seus 45 minutos, desvenda diversos processos de composição do filme de 1984, num slasher de luxo que mesclava traços sobrenaturais, ponto algo para o subgênero que naquele ano, começava a adentrar por uma fase absurda de repetição de fórmulas sem muita criatividade, com poucos momentos de brilhantismo. A pergunta que o cineasta faz no documentário de bastidores é objetiva: “como sobreviver quando o mal que te persegue está em sua mente?”. Essa é a tônica de A Hora do Pesadelo, terror que vem para o circuito urbano e deixa de exercer o medo nos habituais acampamentos da época que tinha Sexta-Feira 13 como ponto de referência. Conhecido pelo exercício dos mecanismos que engendram o horror físico em simbiose com o psicológico em Aniversário Macabro e Quadrilha de Sádicos, Wes Craven veio para A Hora do Pesadelo com desejo de mudar alguns formatos, haja vista o fracasso de seus últimos filmes, inexpressivos se comparados aos clássicos supracitados.

Quase todos os seus roteiros possuíam sequências com sonhos e desta vez, ele resolveu situar uma história inteira dentro do campo onírico, um espaço discursivo não necessariamente fácil de se trabalhar. Elm Street, a rua do filme, é o mesmo nome do logradouro onde o presidente Kennedy foi assassinado. Isso mexeu com algumas pessoas, responsáveis por fazer associações políticas interpretativas relacionadas ao clássico. O rosto deformado, somos informados, foi criado com base em muita pesquisa. David B. Miller foi para a biblioteca da UCLA buscar livros sobre vítimas de queimaduras, tendo em vista alcançar o máximo possível de realismo para a composição de Krueger, um personagem violentamente atacado por pais sedentos pela boa e velha vingança. Assim, chegamos ao dia em que o maquiador Miller comia pizza com a família e teve a ideia de criar Freddy com base no queijo e na calabresa derretidos na bandeja. A busca pelo figurino do vilão, o suéter listrado, foi um trajeto detalhado também, nada aleatório, tal como o som da luva maligna, extraído com uma faca de cortar carne arranhando a parte inferior de uma cadeira dobrável de metal. Dentre outras curiosidades, temos a contratação do elenco, desde o excelente desempenho de Robert Englund ao posto de final girl de Heather Langenkamp. Ademais, temos das dificuldades de financiamento, a distribuição, o legado de Freddy Krueger e a presença estrelada de Johnny Depp em um de seus primeiros momentos na indústria, jovem que é literalmente despedaçado pelas artimanhas do vilão.

Sobre Benção Mortal e As Criaturas Atrás das Paredes: Breves featurettes Sobre Efeitos Especiais e Maquiagem 

O curto featurette sobre Benção Mortal traz o supervisor de efeitos especiais John Naulin para falar sobre a criação da entidade Íncubo, criatura sobrenatural monstruosa que aparece no desfecho da narrativa. Foi uma solicitação dos produtores, pois até o fim das filmagens, a cena não tinha sido inclusa no material. O supervisor conta sobre os bastidores, sobre o processo de criação da maquiagem, o refinamento da fórmula de látex para espuma, perucas com pelo de camelo, importadas na época, bem como outros elementos importantes para a construção de traços convincentes no estabelecimento do clima de horror da narrativa. Este é um featurette para nos fazer compreender a importância que tais setores possuem na condução de histórias que se deslocam do realismo e inserem elementos fantásticos em suas estruturas dramáticas. Indo além do cinema de Wes Craven, o material promocional é uma abordagem mais geral do “fazer cinema”. Fala-se até de David Lynch em O Homem Elefante e das máscaras icônicas do hiato de Michael Myers em Halloween 3 – Dia das Bruxas. Já no featurette sobre maquiagem em As Criaturas Atrás das Paredes, temos Greg Nicotero e a equipe de efeitos da produção a falar sobre as aplicações, esculturas e demais processos de composição deste filme sobre criaturas que não tinham acesso a luminosidade e viviam na escuridão de uma casa com moradores donos de hábitos bem bizarros. Os olhos com enormes pupilas negras, os cabelos ao estilo jovem masculino dos anos 1980 a aparente desnutrição e palidez, dentre outros aspectos, constroem a sensação de horror desta história macabra e insana sobre medo, morte e apodrecimento de uma sociedade fincada nas falsas aparências.

Filmagens Proibidas: Discutindo as Sequências Mais Controversas de Aniversário Macabro

Releitura parcial do sufocante A Fonte da Donzela, de Ingmar Bergman, Aniversário Macabro é um dos filmes mais controversos dos anos 1970, um autêntico fruto de sua época, fase conhecida por clássicos absolutamente violentos e assustadores, tais como O Massacre da Serra Elétrica, Quadrilha de Sádicos, etc. A trama retrata a vingança que envolve uma família e os algozes de sua filha, numa perspectiva crua de pessoas que se entregam aos seus instintos mais primários quando a ordem social perde a estabilidade.  O featurette começa com o atordoante trailer da produção, um material ousado que traz no desfecho, letreiros com a afirmação de um coro a dizer “isso é apenas um filme”. As vozes num tom cavernoso, os metais da trilha que acompanha o material e as cenas repletas de violência física e psicológica reforçam o tom ainda impactante da narrativa. Wes Craven e Sean S. Cunningham, diretor e produtor, respectivamente, contam em detalhes algumas cenas cortadas pela censura, em especial, os projecionistas ou os grupos religiosos. A passagem com a vítima obrigada a urinar diante dos seus algozes é uma das mais comentadas, cortadas em várias versões do filme que para cada cópia encontrada na posteridade, tinha um corte diferente e prejudicial para a versão original da história nua, crua e intensa. A atriz interpreta dessa cena conta que diferente das bolsas de sangue para os momentos de horror, não havia bolsa de urina. Foi preciso realizar o ato de verdade diante de todos. Imaginou? Tudo em prol do realismo. Para Wes Craven, Aniversário Macabro foi a sua oportunidade de lidar com a violência interpessoal e os seus desdobramentos perigosos. Era uma abordagem acadêmica da questão, reflete o diretor, expor como vivemos numa sociedade que transforma o corpo em glamour. E quando esse mesmo corpo é apresentado pelo avesso, com as suas vísceras expostas? É um debate intrigante que avança em sua cinematografia.

Voo Noturno, Wes Craven e Um Novo Tipo de Suspense

O featurette sobre o dinâmico e intenso suspense Voo Noturno, protagonizado por Rachel McAdams e Cillian Murphy, nos reforça o talento de Wes Craven na direção de atores e na captação de sutilezas. Em tantas produções lançadas desde os anos 1970, o cineasta trabalhou com a vulnerabilidade dos corpos, sendo o suspense com segundo ato todo desenvolvido dentro de um avião, uma representação do que ele chama de vulnerabilidade da alma. Depois de ter encerrado as filmagens de Amaldiçoados, Craven decidiu dar um tempo, haja vista o estressante processo de produção, finalização e distribuição do malsucedido filme sobre lobisomens, apresentado numa perspectiva contemporânea e sob a assinatura do texto dramático de Kevin Williamson. Sua equipe lhe enviou o texto de Voo Noturno e tudo que Wes queria eram as suas benditas férias. Depois de alguma insistência, leu o roteiro e ficou fascinado. Decidiu se entregar ao projeto e o resultado é este thriller excitante, bem coreografado e com entretenimento inteligente, cheio de reflexões sobre a atual cultura do medo, dentre outros temas da cultura estadunidense que em sua dinâmica imperialista global, se ramifica pelas sociedades. Dos planos mais detalhistas aos momentos de câmera mais aberta, aprendemos que o estilo de filmar de Wes Craven é peculiar e bastante respeitado pelo elenco que se deixa levar pelo gerenciamento deste mestre das imagens.

Por Que as Pessoas São Tão Fascinadas por Filmes de Terror?

Eis um questionamento debatido constantemente, em especial, na franquia Pânico e suas reflexões metalinguísticas ao longo de quatro filmes, uma série em três temporadas e todo legado deixado por Kevin Williamson e Wes Craven. Para o cineasta conhecido como Mestre do Terror, os filmes nos levam a uma viagem psicológica única e direcionam os medos que nós já temos. Eles pegam as nossas fobias e você sabe que vai expurgar os seus medos, mas não vai se machucar, pois é apenas uma instância de representação. Linda Blair, a famosa garotinha do clássico O Exorcista, aponta que a sensação de adrenalina é o que mais move as pessoas diante dos filmes de terror, opinião que coaduna com o exposto pela produtora Marianne Maddalena ao delinear que diante destes filmes, testamos os nossos medos e sobrevivemos. Para Neve Campbell, interprete da final girl Sidney Prescott, os filmes de terror são narrativas que nos expõem a situações que não são rotineiras, além de retratar o lado obscuro da mente humana, algo que é campo de estudos da psicanálise. Em suma, ao reunirmos todas as opiniões, o que temos é a reiteração dos filmes de terror como material de entretenimento que funciona como uma espécie de viagem terapêutica, rumo aos espaços mais abissais de nossas mentes, num retorno garantido, com a segurança e o conforto da posição de espectadores.

Sobre Pânico

O featurette começa com a famosa cena de Drew Barrymore nos primeiros momentos de Pânico. Há o conhecido flerte com o próprio cinema de Wes Craven, quando o assassino questiona A Hora do Pesadelo pelo telefone e a personagem alega que o primeiro foi bom e os demais uma “porcaria”. Entre uma pontuação e outra de membros do elenco, o material de cunho genético do filme expõe o caráter metalinguístico que é marca registrada de toda a franquia Pânico. David Arquette reforça que é um suspense que “te prende e te assusta”, enquanto Courteney Cox delineia que é uma história “para não se confiar em absolutamente ninguém”. Ao longo do conteúdo de duração breve, acompanhamos excertos do filme com as regras básicas do slasher, expostas por meio de trechos irônicos que criticam as convenções do gênero, ao mesmo tempo que abraçam tudo. Fazer sexo, jamais. Sexo é morte, diz Randy, personagem cinéfilo de Jaime Kennedy que logo adiante, afirma que a polícia está sempre atrás porque não assistiu ao clássico A Morte Convida Para Dançar, uma trama onde “todos são suspeitos”. Ademais, nesta história em que os jovens se encontram nas próprias situações clichês encontrados nos filmes que assistem, Kevin Williamson, responsável pelo roteiro, conta como foi o seu elogioso primeiro contato com Wes Craven, cineasta elogioso diante de seu material dramático. Outro ponto interessante do featurette é a declaração de Neve Campbell sobre sua personagem, um modelo que a fez se aprofundar e seguir além do roteiro, dando complementos aos contornos de Sidney Prescott, final girl da franquia Pânico.

Qual o Seu Filme de Terror Favorito?

Presente nos extras de Pânico, o featurette em questão é uma interessante abordagem do processo metalinguístico que envolve a franquia do antagonista Ghostface. É uma oportunidade para observarmos os interesses cinéfilos de quem está por detrás de uma saga envolta numa malha extensa de referências ao próprio cinema. Wes Craven, como sabemos, o diretor do projeto, conta que O Inquilino, Repulsa ao Sexo e os primeiros filmes de horror de David Cronenberg são alguns de seus favoritos. São tramas, em seu ponto de vista, que fornecem alivio a psiquê, tramas terapêuticas que nos fazem sentir o medo posicionados no conforto do posto de espectadores. Para Kevin Williamson, Halloween – A Noite do Terror não é apenas o seu filme de terror favorito, mas o seu predileto enquanto cinema. Ele tem respeito ao filme de John Carpenter por ter sido a sua experiência mais impactante em sua trajetória de cinéfilo e também por ter sido a produção que o trouxe ao mercado, afinal, para quem lembra, Pânico ressalta questões da trajetória de Michael Myers em vários momentos. W. Earl Brow, interprete do cameraman de Gale Wheaters também considera o clássico de 1978 como um de seus prediletos. Courteney Cox é breve ao apontar O Bebê de Rosemary. Neve Campbell revela que as narrativas com tons espirituais mexem mais com o seu psicológico e aponta O Iluminado como um dos filmes mais impactantes e perturbadores de sua experiência com cinema. Dentre outros depoimentos, temos O Exorcista, O Massacre da Serra Elétrica, Os Pássaros, etc.

Sobre Pânico 2

Para o melhor dos quatro episódios da franquia, adentramos nos bastidores e observamos, tal como será mencionado na análise dos featurettes de Pânico 3, o contagiante clima colaborativo da equipe técnica e do elenco dirigido por Wes Craven. Liev Schreiber conta que o diferencial de Pânico 2 é o estabelecimento de um espetáculo da cultura do entretenimento, mesclado com um conteúdo que mexe com o intelecto dos espectadores, tamanha a complexidade dos diálogos e dos arcos dramáticos dos personagens. Kevin Williamson conta que após encerrar o roteiro do primeiro filme, era possível perceber que a história não tinha acabado, apenas pausado. Agora, com a mudança de perspectiva e um filme sobre os acontecimentos em Woodsboro, as tensões na vida de Sidney Prescott aumenta, tendo em vista o surgimento de mais uma onda de crimes e a sensação de paranoia num enredo onde ninguém é confiável e qualquer um pode ser o assassino. Para Sarah Michelle Gellar, a sensação de desconfiança é um dos pontos mais angustiantes do filme. Ela, interprete de Sissy, estudante de cinema, assassinada num dos trechos mais bem dirigidos do filme, estava na época em seu auge como a caçadora de vampiros Buffy e Helen, do ótimo Eu Sei O Que Vocês Fizeram No Verão Passado. O elenco revela que o interesse em retornar se deu por causa da vinculação da mesma equipe do antecessor: diretor, roteirista e produtores. Num ambiente mais amplo, com uma final girl mais madura e com maior aprofundamento nos arcos dramáticos, Pânico 2 foi um sucesso de público e crítica e os envolvidos já sabiam que ali era a base para uma trilogia.

Pânico 3: Spots para TV e Por Trás das Cenas 

Mais concisos que os demais featurettes sobre a franquia, o material de Pânico 3, no geral, aborda a condição de desfecho da trilogia, retomada no formato mais amplo pouco mais de uma década após Sidney Prescott descobrir que o seu irmão esteve por detrás do projeto de vingança que ceifou vidas ao longo dos primeiros filmes. “No terceiro capítulo, tudo pode acontecer”: a cena em que o personagem de Patrick Dempsey responde ao questionamento sobre trilogias, realizado pela figura ficcional de Neve Campbell, estabelece o tom do material. “Tudo o que você sabe sobre trilogias, pode esquecer”: a declaração de Randy em vídeo, levada por sua irmã para que Gale, Sidney e Dewey assistam, também demarca as idas e vindas dos featurettes sobre Pânico 3. Irônico e divertido, o material expõe as etapas de cada filme da franquia, reforçando o que já sabemos sobre o primeiro estabelecer as regras, o segundo alterar e aumentar a contagem de corpos, e, por fim, o terceiro, momento onde tudo pode acontecer. Outro ponto interessante é os flagras de situações de bastidores, conteúdo que mesmo sendo representação, nos transmite a boa relação de Wes Craven com o seu elenco, todos sempre colaborativos e muito entrosados. Há um clima respeitoso e o featurette aproveita para resgatar erros, acertos, orientações e demais captações de bastidores ao longo dos três primeiros filmes da franquia. É um material interessante para a compreensão do funcionamento de um set de filmagens, bem como a tarefa de um diretor de cinema.

Making-of de Pânico 4

O excelente retorno de Ghostface em 2011 ganhou um featurette à sua altura, com mais de vinte minutos de duração e muitas reflexões sobre o legado da franquia que se tornou responsável por resgatar o slasher na década de 1990. Como estabelecido pelo projeto, “nova década, novas regras”. Pânico 4 foi concebido para se tornar o provável inicio de uma nova trilogia envolvendo os crimes em Woodsboro, agora com imagens gravadas numa cidade universitário no Michigan, diferente da localização californiana dos três primeiros filmes. Trajada pelo figurino do último ato da produção, Neve Campbell, interprete da final girl Sidney Prescott, segue pelos bastidores e nos apresenta o processo em detalhes, num featurette que vai além das curiosidades para nos mostrar como a metalinguagem se estabelece com força no set de realização de Wes Craven. A atriz conta como é emocionante retornar ao projeto, rever o diretor e os amigos Courteney Cox e David Arquette, parte integrante do trio protagonista desde 1996. Agora consciente de sua condição a personagem de Campbell aceitou a sua condição, escreveu um livro e enfrentou o luto por meio da autoajuda, pois ao publicar sobre a suas.

Gale Wheaters retorna insatisfeita a nova onda de crimes a deixa assustada. No final de Pânico 2, ela já havia suavizado o seu lado abjeto, isto é, a associação com o que chamamos de sensacionalismo. Em Pânico 3, apesar de ainda ser interessada na “pegada” excessiva da mídia focada no espetáculo, temos uma personagem mais humanizada, envolvida com o romance. Dewey a pede em casamento e o caminho disso tudo é a vida pacata uma década depois, com bloqueio criativo e na normalidade da dona de casa de Woodsboro. O quarto filme é a oportunidade para Gale retomar a sua melhor forma e transformar a investigação em torno do assassino metalinguístico cinéfilo, agora também vinculado com a internet, numa saga rumo aos holofotes. Dewey, como sempre, se apresenta com a sua astúcia moderada, meio atrapalhado e constantemente posando com seu uniforme, numa posição irônica, espécie de Clint Eastwood atrapalhado, como define o próprio David Arquette, interprete do personagem. Gravado após a gigantesca onda da recessão econômica de 2008, Pânico 4 passou por várias intervenções orçamentárias e refletiu de maneira bastante humorada, a relação do cinema com a internet, aplicativos e redes sociais, tendo inclusive espaço para autocrítica e debates sobre questões sociológicas e psicológicas em torno da violência na mídia.

Os habitantes da região no Michigan onde o filme foi gravado comentam o estado de excitação da população diante das filmagens da retomada de uma franquia tão icônica, dando ao featurette uma perspectiva mais abrangente, analítica do cinema enquanto arte e entretenimento que aquece a economia. Curiosamente, Kevin Williamson não aparece para dar depoimento, mas Wes Craven dá conta do recado dignamente, trazendo para o featurette apontamentos sobre o seu processo de realização cinematográfica e também comentado o campo de produção do terror, espaço por onde circula desde os anos 1970. Para o cineasta, só vale voltar ao conteúdo se o material é tão bom ou melhor que os seus antecessores. Não fosse assim, qual o sentido de resgatar a franquia idolatrada por tantos? É assim que ele conduz Pânico 4, filme que não fez o sucesso esperado de bilheteria, mas é um dos pontos altos da saga de Ghostface. Tal como no material promocional do primeiro, o featurette traz em seu desfecho, as opiniões de membros da equipe técnica e do elenco acerca dos seus filmes de terror prediletos. Destaque para David Arquette, O Iluminado é uma das grandes obras-primas do terror. Enquanto isso, outros membros, inclusive habitantes da cidade, comentam sobre os seus clássicos, opiniões que vão de Psicose aos mais atuais, como a refilmagem de O Chamado.

Entrevista com Wes Craven sobre A Sétima Alma

Para finalizar o nosso texto sobre os featurettes do universo cinematográfico de Wes Craven, apresento algumas considerações de uma entrevista concedida para os extras do suspense A Sétima Alma, narrativa irregular do cineasta, mixagem de elementos sobrenaturais com traços de estilo do slasher. Humorado, o diretor comenta sobre a geração mais recente e seu público, alguns adultos que na infância e adolescência, sofreram os impactos do legado de clássicos como A Hora do Pesadelo e Pânico, as franquias de Freddy Krueger e Ghostface, respectivamente. Mais uma vez, Craven aborda a constante onda de filmes do segmento torture porn, reflexão que traz críticas indiretas do realizar ao campo de produção que durante algum tempo, prendeu-se exclusivamente ao processo de representação da violência como entretenimento, sem aprofundar mais no lado psicológico de suas narrativas. Para o Mestre do Terror, depois dessa gigantesca onda de mortes sangrentas em cena, tornou-se difícil chocar as pessoas com a vulnerabilidade do corpo. Era preciso aprofundar nos traços mais psicológicos, algo que ele tentou fazer em A Sétima Alma, um filme sobre luto, traumas do passado ainda latentes na vida atual das gerações vindouras aos acontecimentos aparentemente esquecidos da cidade à beira do Rio Riverton, numa trama que segundo as suas declarações, traz ecos das memórias de seu pai, um homem que morreu enquanto Wes ainda era bastante jovem. A sua juventude, alguns momentos de relação com a família e outras memórias mescladas integram o pacote deste confuso e enigmático filme, um dos últimos de sua trajetória.

Você Também pode curtir

Este site usa cookies para melhorar sua experiência. Presumimos que esteja de acordo com a prática, mas você poderá eleger não permitir esse uso. Aceito Leia Mais