Surgido no cinema no início dos anos 1910 e finalizado no início dos anos 1930 (com seu auge na década de 20), o Expressionismo Alemão foi um estilo que incorporou na Sétima Arte um movimento artístico que já vinha orientando produções na poesia e nas artes plásticas, posteriormente deixando sua marca também no teatro, na arquitetura, na dança e na escultura.
A marca estética e mesmo temática do Expressionismo no cinema é bastante conhecida, não apenas por ser simples, mas por ter sido amplamente reproduzida, estudada e referenciada ao longo dos anos. E assim como no caso do noir (que tem aqui suas raízes) é bastante fácil olhar para a tela e reconhecer a marca de uma obra dentro desse estilo. Os enredos expressionistas trazem histórias sombrias, urbanas, que muitas vezes classificam-se como um mistério de ordem policial. Os personagens são visual e dramaticamente bizarros ou no mínimo incomuns, cheios de maneirismos ou claramente marcados por uma teatralidade exagerada.
A maquiagem pesada, os ângulos e os cenários distorcidos e inclinados indicam perturbação, fantasia, simbolismos e inquietações angustiantes do inconsciente, elementos às vezes não só representados como um fator mental/comportamental nos filmes, mas também fortalecido por acontecimentos ou influências sociais. Aí também podemos adicionar o enorme papel da direção de fotografia, inteiramente marcada por contrastes entre luz e sombras (chiaroscuro) e por uma grande interação com a direção de arte. Quanto mais “cubistas”, inclinados, distorcidos, claustrofóbicos fossem os cenários, mais peculiares, em termos de iluminação, esses ambientes se tornavam.
Com o início da 1ª Guerra Mundial, em 28 de julho de 1914, a Alemanha passou por um isolamento muito forte de seu cinema, tanto na distribuição, quanto na exibição de filmes estrangeiros em seu território. O resultado disso não poderia ser outro: houve um grande salto na produção cinematográfica nacional. E foi na verdade a primeira Grande Guerra que delineou o que a escola expressionista já vinha fazendo desde o filme que normalmente é aceito como a legítima semente do movimento, O Estudante de Praga (1913). O pessimismo causado pela guerra foi o tom dominante desse cinema durante e principalmente depois do conflito. Ao longo da República de Weimar, onde mazelas jurídicas, governamentais, econômicas, partidárias, ideológicas, éticas, segregacionistas e fascistas se acumulavam por todo o país, o cinema desse período também espelhava os dissabores sociais no Universo Expressionista desesperançado e condenado de seus personagens.
Há alguma controvérsia, mas o último filme do movimento a de fato estrear nos cinemas alemães foi Kuhle Wampe ou Quem é o Dono do Mundo?, em 30 de maio de 1932. Já com quase nenhuma controvérsia aceita-se O Testamento do Dr. Mabuse (1933), de Fritz Lang, como o filme de encerramento do movimento. O longa foi oficialmente lançado em 1933 na França, Áustria, Hungria, Dinamarca e Portugal, mas não na Alemanha, pois foi banido pelo já absoluto Partido Nazista, cuja escalada foi rápida e, como todos sabemos, assustadoramente “legal”, como deixo claro na sequência a seguir (todos os eventos ocorridos em 1933): nomeação de Hitler como Chanceler (30 de janeiro), Decreto do Incêndio do Reichstag, cancelando a maior parte das liberdades civis e políticas estabelecidas pela Constituição (28 de fevereiro), Eleições Federais, onde os nazistas chegaram com força ao Congresso (5 de março) e por fim, a tenebrosa Lei de Concessão de Plenos Poderes, onde Hitler conseguiu de fato estabelecer sua ditadura (23 de março). A propósito desta lei: ela só passou pelo Parlamento com apoio do Partido do Centro Católico (Zentrum), já que o Partido Nazista e a sua marionete, o Partido Popular Nacional Alemão, formavam “apenas” 52% do Parlamento e esse tipo de lei para transferência de poderes precisaria de no mínimo 67% dos votos para obter aprovação. Com os católicos negociando com os nazistas, a lei foi aprovada.
Goebbels, Ministro da Propaganda de Hitler, assistiu a O Testamento do Dr. Mabuse em 23 de março, e adiou a estreia programada para o dia seguinte, alegando “motivos técnicos“. Por volta de 30 de março, o filme foi definitivamente banido porque, segundo o Ministério, a Nova Alemanha não poderia aceitar uma obra que “mostrava como um grupo extremamente dedicado de pessoas é perfeitamente capaz de derrubar um governo através da violência“. O filme foi, portanto, classificado como anti-nazista. Isso colocou Lang em estado de atenção, dada a sua ascendência judaica, e em 31 de julho daquele mesmo ano (ou seja, quatro meses depois do banimento de Mabuse, data confirmada em seu passaporte), o diretor deixou definitivamente a Alemanha, refugiando-se na França e depois nos Estados Unidos. O banimento de Mabuse representa não só o fim do Expressionismo, mas também o início de um novo estilo de se fazer cinema na Alemanha (confira O Cinema Nazista: Breve Panorama), além de um dos períodos mais sombrios da História Contemporânea.
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O Estudante de Praga |
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Der Student von Prag |
Paul Wegener, Stellan Rye |
1913 |
As Aranhas – Parte 1: O Lago Dourado |
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Die Spinnen, 1. Teil – Der Goldene See |
Fritz Lang |
1919 |
O Gabinete do Dr. Caligari |
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Das Cabinet Des Dr. Caligari |
Robert Wiene |
1920 |
O Golem – Como Veio ao Mundo |
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Der Golem – Wie Er In Welt Kam |
Paul Wegener, Karl Boese |
1920 |
Da Manhã à Meia-Noite |
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Von Morgens Bis Mitternacht |
Karl Heinz Martin |
1920 |
A Morte Cansada |
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Der Mude Tod |
Fritz Lang |
1921 |
Nosferatu |
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Nosferatu, Eine Symphonie des Grauens |
F.W. Murnau |
1922 |
Dr. Mabuse, o Jogador |
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Dr. Mabuse, der Spieler – Ein Bild der Zeit |
Fritz Lang |
1922 |
As Mãos de Orlac |
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Orlacs Hände |
Robert Wiene |
1924 |
Tartufo |
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Herr Tarüffe |
F.W. Murnau |
1925 |
Fausto |
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Faust – Eine Deutsche Volkssage |
F.W. Murnau |
1926 |
Metrópolis |
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Metropolis |
Fritz Lang |
1927 |
A Mulher na Lua |
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Frau im Mond |
Fritz Lang |
1929 |
M, o Vampiro de Dusseldorf |
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M – Eine Stadt sucht einen Mörder |
Fritz Lang |
1931 |
O Testamento do Dr. Mabuse |
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Das Testament des Dr. Mabuse |
Fritz Lang |
1933 |