Home QuadrinhosOne-Shot Críticas | Elfos – Livro 1: O Cristal dos Elfos Azuis

Críticas | Elfos – Livro 1: O Cristal dos Elfos Azuis

por Luiz Santiago
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Ano 700 do Calendário Athean. Arquipélago de Polanis, ao sul de Nodrënn, rumo à cidade portuária de Ennlya, habitada por elfos azuis. Este é o lugar de destino do humano Turin e sua amiga, uma elfa azul chamada Lanawyn, no início desta estreia da série Elfos. Criada pela editora francesa Soleil Productions, a série é ambientada em um Universo onde cinco raças élficas habitam, juntamente com Orcs, Goblins e Anões (grupos que ganhariam séries spin-off de Elfos, também pela editora Soleil). Os Elfos Azuis, por serem os protagonistas desta trama inicial, serão trabalhados por mim mais à frente. No entanto, para contexto geral do que a série propõe, vou passar de maneira rápida pelas outras raças que encontraremos na saga.

Os Elfos Silvestres são os mais simples de contextualizar. Habitantes das florestas, eles possuem forte ligação com os elementos da natureza e por isso são versados em herbologia e dominam a magia druida. Os Meio-Elfos são os híbridos rejeitados. Eles não possuem país, não possuem rei e vivem dispersos. Normalmente são detestados pelas “raças puras” e não são raros os momentos de caça, banimento, aprisionamento e infanticídio de seu povo. Os Elfos Brancos consideram-se os “Guardiões do Mundo” e protegem tudo o que um dia pode desaparecer: livros, armas, obras de arte, criaturas. Eles se isolam propositalmente e, dentre os grupos élficos, são os considerados Sábios por excelência. Os Elfos Negros são os problemáticos. Os assassinos silenciosos. Eles podem nascer de diferentes cores (azul, verde, vermelho ou cinza) mas sua verdadeira natureza é revelada apenas anos depois, como sinal de amadurecimento.

Em O Cristal dos Elfos Azuis, o roteirista Jean-Luc Istin nos apresenta uma busca por poder, tendo a guerra e o enfrentamento relativamente ideológico entre humanos e elfos azuis. Por ser uma aventura dentro do gênero de fantasia, magia (e… com espadas também), existem similaridades com obras que se encaixam nessa base narrativa, como Conan, Elric, Red Sonja, Izuna (dos quadrinhos de Saverio Tenuta e Bruno Letizia), Elfquest… a lista é bem longa. De maneira inteligente, o autor começa nos dando uma informação bastante importante sobre os elfos, mas não de maneira narrativamente crua. O diálogo entre Turin e Lanawyn fala sobre poder, características e alguns ideias de mundo e ética (ou algo próximo disso) que os elfos possuem, conceitos que serão utilizados na reta final da história, quando o inimigo se mostra e precisa ser combatido. Com a apresentação do massacre dos elfos na cidade de Ennlya, encontramos a mola que empurra a história para algo bem maior do que “apenas” uma chacina.

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Os Guardiões.

O destino de dois povos é colocado no fio de uma navalha que conta com um rei belicista e mal aconselhado; uma elfa escolhida para portar o famoso cristal que lhe dará controle dos oceanos; e uma investigação que mostra que em todos os povos e raças existem bons e maus elementos. Quando os Yrlanais entram em cena e algumas verdades aparecem na investigação da dupla protagonista, o roteiro se deixa levar rápido pelo espetáculo da guerra vindoura e da intriga palaciana, largando a abordagem conceitual dos povos em cena, o que é uma pena, pois até o meio da aventura esses detalhes estavam aparecendo de maneira bastante sólida no texto. À medida que isso é posto de lado, o autor foca a atenção em acontecimentos por demais mundanos para esse tipo de enredo, uma escolha que embora não seja ruim, certamente não acompanha o ritmo e o conteúdo sugerido no restante do tomo.

Não é de se espantar, portanto, que essa abordagem mais distanciada cobre o seu preço no final, que acaba dando a uma trama inicialmente tão rica uma aparência de batalha simplista entre bem e mal, impressão que só desaparece quando Lanawyn retorna com a solução do caso, em um ato espantoso e excelente. Também vale destacar aqui a ótima visita da elfa azul e do humano à Terra de Ma Halal, o cemitério dos Orks. Como já abordei, o que encanta nesse tipo de fantasia é a apresentação dos elementos mitológicos em torno dos seres e suas terras, de modo que toda vez que uma novidade nesse sentido aparece, é sempre muito bem-vinda. E só para constar, é muito estranho que estejamos falando dos elfos ligados às águas e que haja tão pouca exploração do território aquático pelo texto. Claro que a arte deixa isso mais evidente e que a localização geográfica desse povo seja, por si só, um indício orgânico de sua origem. Mas reparem que há apenas uma única cena de mergulho e relação direta da elfa-messias com os Guardiões do Cristal, o que é insuficiente para o que O Cristal dos Elfos Azuis nos pretende vender.

A arte do espanhol Kyko Duarte e as cores do brasileiro Diogo Saito cumprem muitíssimo bem o papel de nos levar para uma realidade de fantasia como esta. O projeto de coloração me chama ainda mais atenção, pela excelente atmosfera que Saito consegue criar para cada ambiente, não fazendo uma aplicação de luz, sombra e cor desleixadas, uniformes e com tendências monocromáticas ao longo das páginas. Nada disso. Como a história passa por cenários de neve, água, terra seca e terra sombria (o território dos Orks), o colorista literalmente pintou e bordou ao dar uma bela identidade aos desenhos de Duarte, que poderiam trazer mais detalhes e riqueza cultural (vestimentas, adereços, etc.) para os Elfos Azuis, mas ainda assim, são muito bons.

plano critico plano critico Elves #1 - The Blue Elves' Crystal (2013_3) - página 11

A cidade central dos Elfos Azuis.

Se o leitor está procurando muita violência, deturpações morais e éticas de personagens, sexo, nudez e coisas do tipo, Elfos não é o produto ideal. Quando a Mythos anunciou, em 2017, o lançamento de um volume-umbrella contendo esta e a aventura seguinte da série, A Honra dos Elfos Silvestres, muita gente se apressou em colocar a obra como uma “sucessora de Elric”, o que é uma bobagem tremenda. Claro que estamos falando de uma saga dentro de um Universo similar ao de Elric, como eu já abordei mais acima na crítica, mas as propostas não poderiam ser mais diferentes. Elfos tem um tom mais formal, mais próximo da literatura fantástica do que do espetáculo conceitualmente influenciado pela TV e pelo cinema que o Elric de Jean-Luc Cano tem, o que é muito bom, porém, um é um outro tipo de abordagem. Mas não se enganem. Elfos possui todos os ingredientes para encantar aqueles que realmente gostam de uma boa trama de fantasia. Mais um quadrinho para a lista de histórias com grandes e viciantes Universos.

Elfes – Tome 1: Le Crystal des Elfes Bleus — França, 2013
Editora original: Soleil Productions
No Brasil: Mythos, 2018 (Elfos – Volume 1: encadernado contendo esta primeira e a segunda história da série)
Roteiro: Jean-Luc Istin
Arte: Kyko Duarte
Cores: Diogo Saito
Capa: Kyko Duarte
55 páginas

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