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Crítica | Zorro (2024) – 1ª Temporada

Zorro está de volta e com uma interessante novidade!

por Ritter Fan
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Considerando que estamos vivendo, já alguns anos, uma era alongada de filmes de super-heróis, chega a ser incompreensível que os avós e bisavós dos personagens mais famosos não ganhem novas versões. Pimpinela Escarlate, Tarzan, Fantasma, Buck Rogers, O Sombra, Besouro Verde e uma série de outros clássicos mereciam ser resgatados do quase completo anonimato até para ver se o “sangue velho” reanima as produções recentes e permite que novos caminhos sejam abertos justamente com um retorno ao que há de mais tradicional, com as devidas modernizações, claro, pois não prego, aqui, a imutabilidade de nenhum personagem. Fiquei muito feliz, portanto, quando soube que Zorro, um de meus favoritos desses “avôs” dos super-heróis, ganharia uma nova versão vinda diretamente da Espanha que, conforme prometia o pouco de publicidade que vi, traria uma abordagem radicalmente diferente do personagem criado pelo americano Johnston McCulley em 1919, ainda que dentro de uma série de época, sem – ainda bem – trazer o herói para o presente (já temos o Batman fazendo esse papel, afinal de contas).

A grande novidade da série desenvolvida por Carlos Portela faz de Zorro uma entidade mística nativa da região do que hoje é o oeste dos EUA e norte do México, com uma raposa e um pajé escolhendo quem deverá usar o uniforme, a máscara, as armas e o cavalo do defensor dos fracos e oprimidos. Há, claro, um “quê” do Fantasma, de Lee Falk, nessa ideia, mas sem que a identidade do novo Zorro tenha qualquer conexão hereditária. Aos que torcerem o nariz para essa escolha, só digo uma coisa: não torçam. Essa modificação funciona, até porque o Zorro continua sendo um humano normal, sem poderes, apenas enormes habilidades atléticas e com armas que já vêm da pessoa que usa o manto. O maior “poder” que Zorro tem nem é do Zorro, mas sim de Tornado, seu fiel corcel preto que é mais inteligente que 90% dos humanos da série e sempre está onde deveria estar, algo que existe em diversas encarnações do personagem inclusive na querida série da Disney, de 1957.

O que esse lado místico faz de bom pela série? Bem, além de a ideia em si ser interessante, ela abre oportunidades para conflito entre o escolhido pela entidade-raposa e uma nativa que se considera a herdeira por direito do Zorro anterior, que era seu irmão. E, dessa maneira, os dois lados de uma mesma moeda podem ser diretamente abordados, o justiceiro vingativo, que é a versão nativa de Nah-Lin (Dalia Xiuhcoatl), que quer assumir o manto depois do assassinato de seu irmão Zorro (Cristo Fernández, o Dani Rojas, de Ted Lasso) para literalmente matar todos os homens brancos ricos da região e o lado que coloca a justiça acima da vingança, que é a versão “forasteira” de Diego de la Vega (Miguel Bernardeau), jovem que volta da Espanha em razão do misterioso assassinato de seu pai Alejandro (Luis Tosar), na Califórnia. Em outras palavras, um conceito que poderia ser apenas um enfeite politicamente correto (afinal, os espanhóis também era invasores e imperialistas) ganha contornos inteligentes que acrescentam boas camadas à construção do personagem titular.

Dito isso, o restante da temporada é puro Zorro clássico, com a versão de Diego de la Vega tendo seu literal e fiel criado mudo Bernardo (Paco Tous), seu belo amor de infância Lolita Márquez (Renata Notni) que faz de tudo para ignorá-lo tanto por achar que ele a deixou para trás quando foi para a Espanha e por estar noiva de Enrique Sánchez de Monasterio  (Emiliano Zurita), um consciente chefe da guarda comandada pelo totalmente maligno Governador Pedro Victoria (Rodolfo Sancho), que, como todo político, só se preocupa com o seu bolso e os bolsos daqueles que possam enchê-los. Os episódios seguem a linha de histórias soltas combinadas com uma narrativa única de fundo, com Diego e Nah-Lin sempre agindo de forma diametralmente oposta, mesmo que, em linhas gerais, com o mesmo objetivo. Há o bom e velho uso canhestro da montagem para suprir distâncias – é hilário como Zorro vai instantaneamente de sua fazenda até a cidade e vice-versa – e um verniz de telenovela que, eu confesso, me deixa muito irritado por ele ser completamente desnecessário e por ser uma evidente escolha deliberada de filtros da produção que poderia muito bem ter encarado a série como algo mais cinemático e menos burocrático na forma como os visuais são encarados. E isso sem falar nas câmeras lentas exageradas que me remetem ao estilo Zack Snyder de dirigir e as coreografias de lutas que desperdiçam enormes oportunidades para trabalhar a esgrima com o devido cuidado, privilegiando chicotes e acrobacias.

E o mesmo vale para as atuações. Não é que eu queira que uma série de super-herói tenha atores shakespeareanos no elenco, mas Miguel Bernardeau e Renata Notni podem até ser lindos e maravilhosos, mas suas respectivas capacidades dramáticas para além de “olhar raivoso” e “olhar amoroso” são extremamente limitadas. Pelo menos Dalia Xiuhcoatl como a “Zorra” e Paco Tous como Bernardo são um pouco melhores, até porque, muito sinceramente, gosto mais do estilo matador – na literalidade – da versão do Zorro de Xiuhcoatl do que a versão “não mato ninguém nunca” de Bernardeau, com o Bernarndo de Tous sendo o simpático Sancho Pança da história.

Mas o que realmente compensa os problemas da temporada é que os roteiros não se contentam apenas com banalidades. Sim, há muito heroísmo básico no estilo “Z” na testa de bandido e muita vilania na linha de risada maligna, mas há também muito mais, notadamente no conflito entre Zorros, a existência de um misterioso Clã Urso que parece estar por trás de todas as mazelas da região, e em uma linha narrativa que começa vagarosamente a aparecer quando a temporada começa a chegar na metade e que lida com a própria herança de Diego de la Vega, o que leva a ação para Nova York e introduz um assassino particularmente hábil no uso de armas de fogo. Percebe-se, portanto, um esforço genuíno em trazer algo mais para a série do que as usuais besteiras infantis de filmes e séries de super-herói, ainda que não seja nada de outro mundo ou particularmente adulto ou violento, apenas o suficiente para fazer dessa nova versão do Zorro algo que vale o investimento.

Se Zorro pode renascer em pleno 2024, então espero que as produtoras se animem para trazer do limbo outros personagens do mesmo naipe que não tiveram sua chance na era do dilúvio super-heróico em que vivemos. Afinal, se há espaço para dezenas de filmes com heróis e heroínas mais recentes (mesmo que de décadas atrás), está na hora de mais investimento nos super-heróis que já passaram dos 100 anos desde sua criação. Não que eu particularmente queira mais filmes e séries desse gênero por aí, mas, se é para fazer mais, que tal então cavar mais fundo ainda nesse mesmo baú?

Zorro (2024) – 1ª Temporada (Idem – Espanha, 19 de janeiro de 2024)
Desenvolvimento: Carlos Portela (com base em obra de Johnston McCulley)
Direção: Javier Quintas, Jorge Saavedra, José Luis Alegría
Roteiro: Carlos Portela
Elenco: Miguel Bernardeau, Renata Notni, Rodolfo Sancho, Dalia Xiuhcoatl, Paco Tous, Peter Vives, Elia Galera, Andrés Almeida, Emiliano Zurita, Chacha Huang, Joel Bosqued, Francisco Reyes, Mireia Mambo, Estibalitz Ruiz, Ana Layevska, Cristo Fernández, Cecilia Suárez, Luis Tosar
Duração: 483 min. (10 episódios)

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