Eu queria ter revisitado a série animada de 1992 dos X-Men antes do lançamento do revival X-Men ’97, do qual fiz as críticas dos episódios semanais, mas não teve jeito, só consegui voltar à produção no meio do caminho. Ainda assim, é muito interessante voltar aos anos 90 e poder analisar, celebrar e comparar as diferenças entre as séries, bem como a importância da animação original. Lançada em um período ainda de descobrimento do público geral sobre os heróis da Marvel, o desenho faz exatamente o que deveria fazer para aumentar a popularidade dos mutantes: uma ótima introdução ao universo.
Baseado majoritariamente na run do Chris Claremont com os X-Men – e também do Jim Lee, principalmente na composição do grupo -, somos apresentados à Ciclope, Jean Grey, Tempestade, Fera, Wolverine, Jubileu, Morfo, Vampira e Gambit, todos sob o comando do Professor Xavier, salvando o mundo para, aos poucos, conquistarem um espaço de respeito e tolerância para a espécie mutante coexistir com a humanidade em paz. Como de praxe, a equipe é uma representação de minorias em sua eterna busca por igualdade, algo que a animação deixa claro logo a partir do primeiro episódio com os mutantes sendo perseguidos por Sentinelas, mais especificamente a jovem Jubileu, que é salva pelos X-Men e se torna a nova “estudante” da Mansão X.
Na primeira temporada, o desenho cobre muito chão em apenas 12 episódios, trazendo principalmente a trama dos Sentinelas capturando e assassinando mutantes, de Magneto tentando instigar o início de uma Guerra Evolucionária, das viagens temporais dos mutantes e os planos genocidas de Apocalipse, além de pequenas histórias paralelas e autocontidas com personagens específicos. Há definitivamente uma certa pressa e atropelo em muitos dos arcos – algo compartilhado pelo revival -, o que deixa algumas adaptações muito simplistas e superficiais, como a representação quase caricata de Magneto ao longo da série, querendo botar fogo em tudo sem muito sentido ideológico ou racional, e a resolução rápida do conflito em alta escala de Dias de um Futuro Esquecido, muito mal aproveitado na temporada.
Essa crítica acaba sendo parcialmente injusta, uma vez que o tom da animação é bem infantil, fazendo com que desenvolvimentos mais ambíguos e temáticas complicadas não estejam realmente em pauta na temporada – por exemplo, vemos pouco dos debates acalorados de Xavier e Magneto. Ainda assim, é notável que a produção poderia extrair mais de certas realidades e vilões importantes como Apocalipse se os episódios fossem um pouco mais pacientes, o que acredito que deva acontecer nas temporadas subsequentes que contêm mais capítulos. Isso não significa, porém, que os roteiros são ruins.
Inclusive, os episódios e os núcleos autocontidos demonstram as melhores qualidades da animação, até mesmo certos momentos de um nível de maturidade em um desenho animado que surpreende para a época. Temos uma trama envolvendo o exílio de Wolverine que é o grande destaque para mim, sobre um homem da guerra buscando paz, mas arrastando a destruição consigo. A participação de Dentes-de-Sabre nesse arco torna ele o melhor vilão da temporada, desempenhando perfeitamente seu papel de catalisador do caos. O personagem até mesmo desencadeia o melhor diálogo da temporada, quando o carcaju confronta Xavier por querer reabilitá-lo, enquanto quer acabar com Magneto, sem dúvidas um dos melhores confrontos da temporada. Um núcleo envolvendo o aprisionamento do Fera é particularmente interessante também, especialmente pelos ótimos monólogos dados ao personagem.
No mais, a temporada se resume a um clico frenético dos mutantes lutando contra um evento apocalíptico todo episódio, o que é divertido no frenesi e no entretenimento da coisa toda, por mais apressada que a narrativa seja. A animação tecnicamente falando pode ser datada para alguns, mas não sou de ligar muito para isso e consigo facilmente gostar do trabalho visual da temporada, mesmo que não seja tão fluído quanto a nova versão. Pequenos dramas pessoais são gradualmente bem desenvolvidos ao longo da temporada, como a desconfiança de Gambit, o trauma de Vampira em não tocar outras pessoas, o triângulo amoroso de Summers, Grey e Logan, a claustrofobia de Ororo, e por aí vai.
O clímax dramático da temporada merece um destaque especial, sobre mutantes querendo se tornar humanos, no que é provavelmente o maior conflito do outro, do diferente, da minoria – a participação do Anjo é ótima nessa história. Novamente, nada disso é extremamente aprofundado, mas é tudo bem conduzido, bem introduzido e com várias lições valorosas para os pequeninos. No fim, a primeira temporada da animação deixa um sentimento satisfatório de apresentação. Os personagens todos com ótima caracterização e personalidades distintas deixam suas marcas; os idealismo de Xavier é facilmente relacionável ao passo que é inocente e bonito na mesma medida, dando o tom da grande missão dos X-Men; e por mais comprimidos que sejam os arcos, é notável a criatividade de Claremont em tela, com a adaptação entretendo em cada aventura maluca e em cada novo mutante participante ao longo da jornada. Os X-Men chegaram com tudo em 1992 e o legado da animação é sentido ainda hoje por conta disso.
X-Men (X-Men: The Animated Series) – 1ª Temporada | EUA, 1992
Direção: Larry Houston
Roteiro: Mark Edward Edens, Jim Carlson, Terrence McDonnell, Don Glut, Robert N. Skir, Marty Isenberg, Michael Edens, Julianne Klemm, Julia Jane Lewald (baseado na série de quadrinhos homônima de Stan Lee e Jack Kirby)
Elenco: Norm Spencer, Cathal J. Dodd, Lenore Zann, Iona Morris, George Buza, Chris Potter, Alyson Court, Catherine Disher, Cedric Smith
Duração: 12 episódios de aprox. 20 min. cada