Está bastante complicado ser “original” na contemporaneidade. Depois de tantos conflitos, as comédias românticas dificilmente conseguem sair do trivial e bobo desfecho no aeroporto, com um dos membros do casal tentando impedir o fim do relacionamento. No que diz respeito aos filmes de ação, há numerosas produções sobre invasões à Casa Branca, ao Pentágono, ao Banco Central, bem como aviões sequestrados, além das bombas em ônibus e metrôs.
No que tange ao gênero suspense e terror, poucos conseguem o diferencial: quando não se investe em um plot twist intrigante, as narrativas caem no lugar comum. São espíritos que não aceitam a ida ao mundo dos mortos, psicopatas em busca de vingança por causa do grupo que o humilhou no baile de formatura ou a policial que decide colocar a sua vida em risco para resolver uma lista de crimes realizados por um serial killer. Esta personagem, geralmente, possui dramas do passado que não foram devidamente resolvidos, sendo o tempo presente da ação o espaço terapêutico durante a sua jornada.
Não digo aqui que sejam plots ruins. A questão é a dificuldade em sair desses lugares comuns do cinema contemporâneo. A indústria, no ápice de toda a sua esperteza, sempre acha uma forma de escavar os terrenos da criatividade em busca de possíveis novidades. Sendo assim, as refilmagens ou a prática do spin-off tem ganhado bastante notoriedade desde os anos 2000. Mais recentemente, a adaptação televisiva para filmes de sucesso é a receita para possíveis produtos de sucesso. O gênero terror, em especial, ganhou vários produtos neste formato: Damien (A Profecia) e Scream (Pânico) são alguns destes, além do road-movie de horror Wolf Creek – Viagem ao Inferno, produção com cara de filme independente, lançado em 2005, sucesso de crítica e bilheteria.
Baseada em fatos supostamente reais, a série nos apresenta novamente ao sarcástico psicopata Mick Taylor, interpretado de maneira asquerosa por Jphn Jarrat, um homem que ganha parte do seu tempo massacrando viajantes que atravessam o deserto australiano, em especial, os frequentadores da histórica Wolf Creek, uma cratera famosa, alvo de muitos turistas ao longo do ano.
Desta vez, o foco inicial é uma família que acampa no ambiente. Um dos filhos, ao tomar banho em um riacho, é atacado por um crocodilo. Para a alegria da família, um misterioso caçador surge e mata a criatura, salvando a vida do menino. Entretanto, a felicidade dura pouco. Mais adiante, o psicopata ataca toda a família e mata um a um com crueldade. O cálculo, por sua vez, não é bem feito, haja vista uma das integrantes do núcleo ter ficado viva.
É a partir daí que a série vai focar as suas energias em Eve (Lucy Fry), a sobrevivente que não tem a sua tese aceita pelos policiais da região. Eles acreditam que o pai da família tenha atacado a todos e depois cometido suicídio. Ciente de que a investigação será engavetada, Eve rouba os arquivos do detetive Sullivan (Dustin Clare) e parte em sua jornada em busca de vingança.
Ao longo de seis episódios, a série nos apresentará aos amargos momentos desta saga cheia de altos e baixos. Repleto de idas e vindas, enquanto Eve não encontra o psicopata para o embate final (que será, óbvio, no último episódio), o roteiro nos oferta uma gama extensa de subplots: há o casamento em crise do detetive Sullivan (o que lhe permite aproximar-se de Eve com outras intenções ao passo que a narrativa se desenvolve), há um motoqueiro que nos remete ao clima do instigante Easy Rider – Sem Destino, um presidiário em fuga e outros personagens flutuantes e desnecessários, juntamente aos outros essenciais para a eficácia das estratégias dramáticas, num roteiro acima da média, um pouco prejudicado pelos seus excessos, mas seguro da proposta central: a jornada evolutiva de Eve.
Aos interessados em sangue e vísceras, recomendo a continuação do filme, Wolf Creek 2. Nem o primeiro do “selo” investe em tanta violência, pois a tortura surge apenas próxima ao desfecho do filme. O foco da série é o drama. Há alguns assassinatos entre um episódio e outro, mas são cenas deslocadas e sem a mesma organização enfileirada de crimes, como num típico slasher. A ideia do roteiro é mesmo desenvolver a personagem interpretada com segurança por Lucy Fry. Ela é bem humana, comete falhas ao longo do processo, age com impulsividade, mas é astuta, mesclando características que a deixam menos óbvia do que poderia ser, caso os criadores estivessem mais interessados em mortes criativas e excesso de violência gráfica.
Greg McLean, responsável pela direção e roteiro do filme retorna para esta adaptação televisiva, dividindo os créditos de realização com Tony Tilse, diretor que assina cinco dos seis episódios. Peter Gawler e Felicity Packard assinaram o roteiro, tendo como base o argumento de Greg McLean, também produtor da adaptação. Basta aguardar se haverá uma segunda temporada. Por enquanto, há rumores para uma continuação nos cinemas. Para a televisão, o produto foi vendido como minissérie. E que assim seja: seis episódios foram o suficiente, afinal, se o vilão ainda tiver forças para atacar depois do massacre do embate final, é bem possível que ele faça parte do clã sobrenatural de Freddy Krueger, Jason Voorhes e Michael Myers, o que por sua vez, vai descaracterizar e enlatar um produto tão diferenciado.
Wolf Creek – A Minissérie Completa (Austrália, 2016)
Showrunner: Greg McLean.
Direção: Tony Tilse e Greg McLean.
Roteiro: Peter Gawler e Felicity Packard, baseado no argumento de Greg McLean.
Elenco: Lucy Fry, John Jarratt, Dustin Clare, Deborah Mailman, Maya Stange, Damian De Montemas, Miranda Tapsell, Robert Taylor, Matt Levett.
Duração: 50 min (cada episódio – 6 episódios no total)