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Crítica | Wish: O Poder dos Desejos

Fazendo pedidos para uma estrela.

por Luiz Santiago
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Em 1923, a Disney Brothers Cartoon Studio começou a produzir curtas-metragens, dando início a uma empresa de audiovisual que se tornaria uma das mais poderosas no ramo do entretenimento mundial. Em 2023, por ocasião do centenário dessa gigante que tanto encantou e maravilhou plateias de todas as idades ao redor do mundo, foi lançado o longa-metragem Wish: O Poder dos Desejos, obra que vinha sendo produzida desde 2018, e que foi pensada justamente para ser “o longa de comemoração do aniversário da Disney“. O filme traz em seu bojo um sem-número de referências visuais, narrativas e musicais de animações anteriores do estúdio, de Branca de Neve e os Sete Anões (1937) até Encanto (2021). Aqui, quem encarna a figura responsável por inspirar gerações e trazer esperança e leveza por meio da beleza artística é o centenário avô de Asha, que na cena pós-créditos, aparece compondo a canção When You Wish Upon a Star, uma faixa que, desde a sua primeira aparição, em Pinóquio (1940), tornou-se uma assinatura da casa.

Abrindo a jornada como em um livro de clássicas histórias infantis, a exemplo de Branca de Neve, Cinderela (1950) e Bela Adormecida (1959), o filme de Chris Buck e Fawn Veerasunthorn nos entrega cedo toda a situação do Reino de Rosas, governado por um amado rei-feiticeiro que tem a capacidade de guardar os segredos da população e realizá-los… em algum momento, numa grande celebração. O núcleo familiar de Asha se mostra como o espaço seguro a ser afetado por uma clara corrupção do rei, em todo o seu orgulho e apego doentio que a posse dos desejos alheios lhe dava. O roteiro, no entanto, faz muito pouco para criar motivações aceitáveis para os personagens centrais, inclusive o vilão. Podemos aludir suas motivações à já citada “sede de poder“; à sua grande vaidade, ou até ao medo de que tragédias do passado voltassem a acontecer. Mas nenhuma dessas atribuições parecem realmente “servir como uma luva” ao personagem. A mais óbvia delas é o trauma de infância, todavia, a mudança moral do personagem, a partir de determinado momento, acaba invalidando essa aproximação.

A trajetória de Asha também não carrega uma construção coesa. Inicialmente, supõe-se que ela seria uma “aprendiz de feiticeiro” (como Mickey, em Fantasia), mas esse drama dos “aprendizes do rei” é abandonado sumariamente logo após o embate que o monarca tem com Asha, e não volta mais a ser citado na história. Em torno dela, os amigos revivem as figuras dos Sete Anões, e a magia parece persegui-la por um capricho do destino, um misto de presente do pai e um forte desejo para que algo de bom acontecesse a ela e ao povo de Rosas. A mensagem é boa. Faz jus ao público-alvo e há uma beleza simbólica na caminhada da menina, com seu simpático psicopompo (um pequeno bode chamado Valentino) que a guia por ocasiões de iniciação e transição, contribuindo com bom-humor para o crescimento de sua dona e o enfrentamento das adversidades. Contudo, a organização do enredo não dá a Asha força o suficiente para guiar o fio narrativo. Para efeito de comparação, esse tipo de importância apareceu para Mirabel Madrigal já nos primeiros minutos de Encanto. Aqui, transitamos aleatoriamente por momentos fofos, interações simpáticas e sem muito conteúdo dramático e pela protagonista pulando de uma ação intensa para outra, quase inconsequentemente.

E para adicionar problemas à já complicada situação do texto, não temos aqui um trabalho estético que verdadeiramente se destaque — o filme é gracioso, mas para padrão Disney, falta-lhe cenas de grande deslumbramento visual, seja para construções, geografia, figurinos/composição de personagens e componentes mágicos. O mesmo posso dizer para a lista de canções. A única faixa que, de alguma forma, se destaca, é Não dá Mais pra Não Ver, quando Asha e seus amigos cantam, juntamente com a rainha, uma espécie de progressiva marcha, havendo um bom destaque para a percussão e uma letra que mostra uma posição ativa do grupo diante do inimigo. Gostei bastante desse momento musical, mas, infelizmente, é o único do filme que merece menção. Em se tratando de Disney, isso é realmente problemático. Especialmente numa comemoração centenária.

Mais cheio de cores frias do que deveria (eu entendo a ideia do reino de Rosas oprimido, em sua “falsa felicidade“, e o uso da paleta mais fria para reforçar a atmosfera de desejos aprisionados, mas, sinceramente, achei uma má escolha. Um filme comemorativo merecia uma paleta ampla e viva), Wish: O Poder dos Desejos tenta a todo custo prender o público pela nostalgia e por dezenas de referências, entretanto, não encerra uma história e um trabalho imagético que deem suporte a esses segredos escondidos e que façam tudo valer a pena em uma narrativa coerente, interessante, completa. Se era um “presente para o público“, como o péssimo marketing do longa apontou em alguns teasers, é um baita presente de grego.

Wish: O Poder dos Desejos (Wish) — EUA, 2023
Direção: Chris Buck, Fawn Veerasunthorn
Roteiro: Jennifer Lee, Allison Moore, Chris Buck
Elenco (vozes originais): Ariana DeBose, Chris Pine, Alan Tudyk, Angelique Cabral, Victor Garber, Natasha Rothwell, Jennifer Kumiyama, Harvey Guillén, Niko Vargas, Evan Peters, Ramy Youssef, Jon Rudnitsky, Della Saba, Keone Young, Lucas Sigler, Holland Watkins, Woody Buck, Efé, Nicole Lynn Evans, Heather Matarazzo, Nasim Pedrad, Abraham Sigler
Duração: 95 min.

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