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Crítica | “WE ARE” – Jon Batiste

Herança musical.

por Kevin Rick
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On the verge of cryin’
I don’t feel like tryin’
But instead, I’ll sing, yeah
But instead, I’ll sing

Vencedor do Grammy de Melhor Álbum do Ano em 2022, Jon Batiste entrega em WE ARE uma obra com muito orgulho e valorização de suas raízes sonoras e humanas. O artista cresceu no estado de Lousiana, vindo de uma família de aclamados músicos de New Orleans, berço do Jazz, e também de uma criação católica, ambos elementos importantes na produção. Batiste mergulha em suas origens e crenças, seus laços familiares e artísticos, e até mesmo suas lutas pessoais e culturais, num álbum cheio de olhares íntimos para o passado e com muita celebração da vida e da música.

A faixa-titular personifica bastante o tom do disco, com uma letra que mescla nostalgia com perspectivas culturais para o meio geográfico de Lousiana, seja nas sugestões para a história do estado marcada por racismo, seja para a herança e o talento musical de New Orleans como um refúgio pacífico e alegre, transcorrendo sensações festejantes de elevação e comemoração de um povo escolhido por Deus, e de um gueto cheio de estrelas. Trazendo melodias que misturam gospel com jazz, a faixa é uma abertura magistralmente otimista e triunfante mesmo em suas dores, e um hino apaixonado de muita glória santificada e arranjos orquestrais com a adição de uma banda marcial.

O final da canção até mesmo se assemelha a um batismo, funcionando de ponte para a próxima faixa, TELL THE TRUTH, uma música mais voltada para o soul e o funk em seu ritmo batucado e gritos roucos de Batiste. A canção também mostra os primeiros indícios de que WE ARE é um álbum sobre a infância do artista, trazendo uma história sobre os ensinamentos de seu pai e novamente nos situando do espaço que cresceu, com muito lirismo de memórias e uma mensagem cativante sobre se manter firme à verdade em meio ao estrelato.

A música seguinte é CRY, uma produção mais melancólica em seu groove taciturno de blues – notem como a guitarra dita a tristeza melódica e como seu solo funciona como uma forma de clímax do choro de pertencimento do eu-lírico, também com ótima seção de metais. Logo depois temos I NEED YOU, uma canção totalmente alegre em seu piano boogie-woogie e ritmo de palmas, também misturando um hip-hop melódico à la Outkast – toda essa mescla criativa transformam a faixa quase num pop em sua letra animada sobre amor e mais olhares nostálgicos. É notável como Batiste transita com naturalidade entre seu vocal de R&B e esse rap mais saltitante e simples, algo que ele repete em WATCHUTALKINABOUT, outra música que adota um caminho entre jazz e hip-hop, só que ainda mais próxima dos flows rápidos do gênero.

As reminiscências da infância continuam em BOYHOOD, mais uma faixa com elementos elementos vocais de hip-hop com pano de fundo instrumental sofisticado e clássico, como a base do piano e um trecho fantástico de trombones que carregam o ouvinte para um campo idílico e inocente das criancices e origens de Batiste, como se pudéssemos ver ele jogando basquete sob uma casa da árvore. O momento de ternura é seguido pelo devastador e trágico MOVEMENT 11′, uma canção toda instrumental que funciona como um interlúdio temporal e uma passagem de amadurecimento para a calma ADULTHOOD, tocando em uma fase diferente da vida do eu-lírico, com camadas de relacionamento e espiritualidade em seus elementos de gospel e trechos que emulam orações.

SHOW ME THE WAY e SING também são faixas tematicamente e liricamente amarradas. Ambas são homenagens à música enquanto forma de arte que molda mentes e espíritos, com a primeira faixa sendo nostálgica de outras épocas e artistas que mostraram o caminho para Batiste, com referências de Ella Fitzgerald à Rolling Stones, enquanto SING é pura celebração, mostrando o ato de cantar como sentimento libertador e como sua herança musical superou o fardo das dificuldades através da música – essa canção é poesia cultural.

E, por fim, temos FREEDOM, uma faixa dançante que sintetiza a musicalidade complexa de um álbum que une funk, gospel, hip-hop, R&B e jazz com muita harmonia, sendo que o gênero formado em New Orleans está no centro de WE ARE, sempre ritmicamente vivo na mixagem sonora, mesmo em faixas que não esteja tão aparente. A herança musical de Batiste dita a melodia da produção, enquanto suas memórias de infância e a cultura da sua terra natal delineiam a narrativa musical de um lugar único e especial, seja em suas profundas melancolias ou suas danças contagiantes.

Aumenta!: FREEDOM
Diminui!: 
Minha canção favorita do álbum: SING

WE ARE
Artista: Jon Batiste
País: Estados Unidos
Lançamento: 19 de março de 2021
Gravadora: Verve
Estilo: Jazz, R&B

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