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Crítica | Visita ao Inferno (Into the Inferno)

por Ritter Fan
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estrelas 3,5

Os documentários de Werner Herzog vão, normalmente, muito além do que seus títulos dão a entender. Herzog estudou a relação do homem com a natureza em O Homem Urso, a evolução da linguagem em Caverna dos Sonhos Esquecidos e como a tecnologia influencia a humanidade – e vice-versa – em Eis os Delírios do Mundo Conectado e isso só para citar alguns. Ele nem sempre acerta completamente, mas este grande diretor não faz “apenas documentários” e sim tratados antropológicos que usam como plataforma de lançamento determinado aspecto curioso do mundo, esticando e às vezes até de certa forma deturpando a definição clássica de documentário.

Em Visita ao Inferno, que, na superfície, lida com vulcões ativos pelo mundo, ele tenta estudar a relação do Homem com seu lado místico. Isso já fica mais do que evidente na tomada aérea que abre a obra, em que somos levados à cratera de um vulcão com lava em seu interior com uma trilha sonora que evoca religião e misticismo, com um belo coral fantasmagórico. O objetivo, ali, parece ser equalizar a natureza ao religioso, aos mistérios do mundo e ele consegue muito bem, dado o assombro que é simplesmente ver a grandiosidade de um vulcão ativo assim, podendo entrar em erupção a qualquer momento.

Ainda que Herzog funcione como narrador e também apareça no documentário, o grande foco repousa sobre os ombros de seu amigo vulcanólogo Clive Opphenheimer. Ele faz as vezes do “homem da ciência” e, como tal, entrevista diversas pessoas diferentes – cientistas, guias de turismo e xamãs – em países como Coréia do Norte e uma ilhota no remoto arquipélago de Vanuatu. Há uma variedade imensa de situações que enfocam em uma espécie de resignação do Homem diante da força da Natureza em um embate que, por mais que o Homem queira destruir a Natureza, é mais provável que um dia o resultado seja justamente o oposto. Mesmo os “homens de ciência” têm reverência ao poder emanado pelo vulcões, mesmo os já extintos há muito tempo como o da Coréia do Norte, que funciona como peça da propaganda do governo comunista enlouquecido de lá ou o que ele mostra em uma planície africana repleta de vida humana de milhares de anos atrás, na Aurora do Homem.

É curioso como Herzog, para justificar seu fascínio “frio” por vulcões e sua amizade com Oppenheimer, usa doses generosas de imagens de arquivo de seu próprio documentário Encontros no Fim do Mundo, em que ele visita um vulcão na Antártida. De certa forma e em muitos momentos, estas imagens de arquivo – e outras de outros documentários ainda anteriores – são ainda mais fascinantes do que as imagens novas, o que dá um caráter híbrido estranho a esta obra do diretor. É como se ele tivesse eleito um tema em que ele pudesse fazer uso de imagens mais antigas para ilustrar um lado pessoal seu que não necessariamente se encaixa com a temática do que ele busca mostrar no presente. Isso causa um certo desconforto na narrativa que ele tenta imprimir, quebrando-a significativamente, ainda que de forma menos acentuada que em Eis os Delírios do Mundo Conectado.

Mesmo com seus problemas, o estudo do Homem diante da Natureza que o diretor faz, intercalando as entrevistas com imagens impressionantes do “inferno” tem fluidez, a mesma do magma sendo expelido por crateras ao redor do mundo. A mensagem é passada com o mesmo senso de inevitabilidade do caminho percorrido pela rocha derretida, ainda que com bem menos estragos e bem menos provocação. Ao trabalhar as perguntas e respostas sem muita profundidade, Herzog deixa de mergulhar de verdade na controvérsia, ainda que faça o suficiente para levar o espectador à indagação e reflexão.

Visita ao Inferno é um documentário que mistifica apropriadamente a Natureza e coloca o Homem em seu devido lugar, seja em estado de pura reverência – religiosa, política ou científica – ou de plena fascinação pelo desconhecido e o incontrolável. Os vulcões são templos para contemplação aqui e não “só” forças obliteradoras.

Visita ao Inferno (Into the Inferno, Reino Unido/Canadá/Alemanha – 2016)
Direção: Werner Herzog
Roteiro: Werner Herzog
Com: Werner Herzog, Clive Oppenheimer,  Maurice Krafft,  Katia Krafft, Kampiro Kayrento, James Hammond, Tim D. White, Yonatan Sahle,  Adam Bobette, Sarmin, Mael Moses, Han Myong II
Duração: 104 min.

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