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Crítica | Vil, Má

por Luiz Santiago
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Vil, Má é um interessantíssimo exercício de construção e exposição de uma personagem e da pessoa por trás dessa criação. De certo modo, Edivina Ribeiro e Wilma Azevedo criam o filme juntamente com o diretor Gustavo Vinagre, montando um quebra-cabeça que fala sobre as muitas possibilidades do erotismo na imprensa brasileira dos anos 70 e 80 (principalmente), na imaginação de uma escritora e também na vida de uma mulher, de uma mãe, de uma religiosa que queria encontrar um trabalho estável e poder cuidar de sua casa, de seus filhos.

Um dos motores do filme é justamente o diálogo que o diretor estabelece entre Wilma Azevedo, a rainha literária do sadomasoquismo no Brasil, e Edivina Ribeiro, a escritora que deu voz a esta personagem e alimentou os desejos e as inúmeras fantasias de homens e mulheres por um certo período de sua vida. Nesse aspecto, o documentário Vil, Má (o título, aliás, é esplêndido!) trilha um caminho teoricamente rico e interessante, jogando abertamente com essa duplicidade entre personagem e criadora para poder transmitir ao público um pouco do processo de condução do erotismo a partir de pontos de vista bem diferentes.

No que tange à presença e história de criatura e da criadora na tela, o filme é um pequeno deleite. Estranha e angustiante em alguns casos, a fita está recheada de imagens (de fato ou literárias) mostrando a vida da escritora e fornecendo um curioso material sobre a mentalidade que se tinha do sexo, sexualidade e sensualidade em São Paulo (interior e capital) durante o período da ditadura e também de experiência sociológica de uma mulher escrevendo sobre esses temas justamente nesse período. A questão é que o tema e as histórias aqui precisam de um maior polimento do diretor, sendo este o elo fraco da obra (principalmente no final), mesmo que não chegue ao ponto de torná-la ruim.

Em apenas dois momentos — um através da montagem, num divisão clara de atos e abordagens; e outro através da representação de Juliane Elting — Vinagre se permite brincar com a própria temática que propõe. Ele assume o jogo de representações, estabelece os diferentes pontos de vista, faz com que o público tenha acesso a narrativas opostas da história, mas visualmente não entrega nada que verdadeiramente dê suporte a esse “outro lado”. A mudança na planificação é até inicialmente sentida, mas depois não assume nenhuma identidade, o que torna os atos visualmente muito semelhantes, enquanto, na intenção, na atmosfera e no roteiro falava-se de personas distintas.

Vil, Má é um retrato das taras, do exercício da sensualidade e das possibilidades extremas que esse aspecto de nosso desejo pode ter para diferentes pessoas. Apesar de estar fixo a um único modelo de exposição para as duas narrativas que o compõem, meio que contrariando a abordagem do diretor para as jornadas de Edivina Ribeiro e Wilma Azevedo, o filme é uma viagem compensadora pelo mundo da criatividade literária sadomasoquista e pela faceta dolorosa do erotismo, tudo do ponto de vista de uma mulher dominadora. Difícil não se interessar pela obra.

Vil, Má (Brasil, 2020)
Direção: Gustavo Vinagre
Roteiro: Gustavo Vinagre
Elenco: Edivina Ribeiro, Wilma Azevedo, Juliane Elting
Duração: 86 min.

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