- Leiam aqui, todo nosso material sobre a série principal.
Mal deu para sentir saudades ou ficar “refém” do fim de Vikings, que cá está, um pouco mais de ano depois do “fim”, um spin-off/continuação prontinho, produzido pela Netflix, para extrair o máximo de desempenho numérico possível para o algoritmo do streaming, que, méritos à parte, foi um dos principais responsáveis por alçar a popularidade da série-mãe. E justamente por isso não há tempo a perder. É preciso aproveitar o produto enquanto está na boca do povo que não tem mais paciência para esperar nada, nem sequer digerir direitos as coisas. A mentalidade que a própria Netflix ajudou a fermentar no consumidor médio é maratonar a temporada já pedindo a próxima para ser lançada no mesmo ano. Não importa tanto o valor qualitativo que será entregue ou sequer que tenha algo direito para contar. Tratando-se de Vikings, o caso não chega a ser tão extremo. Com a vasta cultura e mitologia desse povo, certamente existem muitas histórias escondidas para explorar. Valhalla, num primeiro momento, poderia ser uma expansão promissora desse universo.
Infelizmente, na prática, o spin-off acaba abraçando o mesmo formato da série principal, contando ciclos de conflitos por dominações que se repetem, agora sem o grupo de personagens carismáticos identificáveis que costumávamos acompanhar. Difícil lembrar o nome de algum, embora, nenhum chegue a ser exatamente ruim pela caracterização da produção sempre em alto nível – todos os atores envolvidos, de principais a figurantes, são bons. Parece, inclusive, uma dificuldade assumida pela própria narrativa, que modifica constantemente a figura do protagonista a depender da subtrama mais urgente a ser resolvida, compensando a falta de aprofundamento particular para a melhoria do envolvimento rítmico do telespectador. Valhalla já é pensada para o formato que será lançado no futuro, assim, providencia com velocidade calculada as resoluções de cada novo rumo, para promover essa vontade do espectador de ver o próximo capítulo.
Pensando pelo lado do entretenimento, isso funciona. A série principal parecia muitas vezes um documentário encenado. Michael Hirst ficava muito preso a esse realismo do retrato de época, já Jeb Stuart toma liberdades pontuais mais fantasiosas, mas ainda verossimilhantes com toda a identidade consolidada pelo antigo mentor. Inevitavelmente perde-se um pouco de personalidade nessa agilidade ofegante, exigindo um didatismo maior do texto para que o telespectador não se perca no amontoado de núcleos a se resolver. Até por isso, Stuart estaciona na linearidade mais básica possível, sem trocar tantas vezes de eixos narrativos que não se conectam diretamente ao longo dos episódios. Tanto que há uma queda rítmica a partir da metade, quando ele necessita usar um ou dois capítulos para organizar o clímax que une tramas (naquele momento) consideravelmente distantes uma da outra.
Em contrapartida, o início é bem forte, pela simplicidade adotada. Vemos a introdução dos personagens durante a preparação de uma invasão Viking à Inglaterra, com uma batalha acontecendo já no quarto episódio – na série principal era uma trama com potencial de durar quase uma temporada. Esses quatro primeiros capítulos, além de serem bem dinâmicos e energéticos, contêm uma exploração interessante do contexto temporal (a história se passa 100 anos após a principal, que acaba já com a civilização Viking em decadência) de divisão de fé na sua cultura: uns ainda acreditam nos antigos deuses nórdicos, outros se converteram ao Cristianismo – trazendo nos conflitos internos um frescor momentâneo à repetição da fórmula de grandes ações movidas por vingança. Pena que isso não sobreviva muito tempo depois da resolução da batalha. Até tem um desenvolvimento mais diplomático do que o convencional, condizente ao caráter não mais tão bárbaro dos nórdicos, mas essa trama deixa de ser a principal e outra (encaminhando um novo confronto) assume o protagonismo sem tanta ênfase na dubiedade religiosa. Tomara que essa dinâmica volte a ser explorada nos próximos 16 episódios já confirmados.
A perspectiva para eles, nesse sentido, é negativa. Fica claro, pelos filtros, que Vikings: Valhalla é um tapa-buraco para a Netflix lucrar em cima daqueles que não aceitaram que a série acabou. Disfarçando-se de uma expansão de universo, mas entregando exatamente aquilo que já estava sendo entregue (inclusive, com a mesma qualidade parcialmente duvidosa, mas ainda boa e constante) nas últimas temporadas sem a presença de Ragnar Lodbrok (Travis Fimmel). A partir disso, há um balanço positivo a se retirar de um ritmo melhor ou do senso mais leve de entretenimento, outro negativo por não ter personagens tão bons quanto os antigos ou cenas de ação tão bem coordenadas quanto (as presentes se mostraram mais picotadas), mas, no geral, é a primeira temporada de um final estendido da mesma série, com um sufixo no nome.
Vikings: Valhalla – 1ª Temporada | EUA, 25 de Fevereiro de 2022
Criação: Jeb Stuart
Diretores: Niels Arden Oplev, Steve Saint Leger, Hannah Quinn
Roteiristas: Declan Croghan, Eoin McNamee, Vanessa Alexander, Jeb Stuart
Elenco: Sam Corlett, Frida Gustavsson, Leo Suter, Bradley Freegard, Jóhannes Haukur Jóhannesson, Caroline Henderson, Laura Berlin, David Oakes, Pollyanna McIntosh, Asbjørn Krogh Nissen, Søren Pilmark, Louis Davison, Bosco Hogan, Lujza Richter, John Kavanagh, Pääru Oja, Julian Seager, Gavin Drea, Ruben Lawless
Duração: 8 episódios – 45 minutos em média cada episódio.