Enquanto o clássico estilo de comédia romântica heteronormativa tem sido esquecida pelo nicho de narrativas de romances eróticos com casais tóxicos, tem sido interessante acompanhar essa disposição de contar histórias sobre personagens gays através do prisma da rom-com. Nisso, traz a oportunidade de abordagem com segmentos mais leves, ainda que tratando de tópicos delicados no caminho, por fim, o espírito tradicional do subgênero é mantido. Se Fire Island fazia uma comédia existencial romântica com toques de Jane Austen, a adaptação do best-seller de Casey McQuiston, Vermelho, Branco e Sangue Azul quer se remeter aos contos de fadas de quando os opostos se atraem e vivem um romance açucarado.
Em sua estreia atrás das câmeras – ainda que pensado e filmado para o formato de streaming -, o dramaturgo e roteirista da Broadway, Matthew López, consegue relembrar a essência que consagrou o subgênero no cinema, mesmo que sua execução destaque ainda mais a falta de plausividade da história, dos personagens… O que temos aqui é o romance improvável entre o Alex (Taylor Zakhar Perez), filho da presidente dos EUA – que está em fase reeleição – e o príncipe herdeiro da Inglaterra Henry (Nicholas Galitzine). Em meio aos dilemas políticos e da monarquia, vemos o desabrochar romântico de duas pessoas de mundos distintos trilhando em momentos decisivos de suas vidas e buscando pelo pertencimento e aceitação.
Ignorando a aura fanfiqueira dessa premissa, é possível perceber que a fórmula para uma comédia romântica está lá, para início, meio e fim. Porém, apesar de reconhecer isso, López não atinge o timing, a sacada de naturalidade que a trama precisava para se embarcar na história com menos incredulidade, sem a sensação de que falta algum tempero. Uma sequência que ilustra a falta de tato do diretor é no episódio escandaloso em que Alex e Henry protagonizam, o que ameaça a relação entre os países. Era só o que a trama precisava para poder aproximar os rapazes: uma situação embaraçosa; o que é uma bagunça divertida de ver duas figuras que se detestam, sujas depois de derrubarem um bolo de sete andares.
O roteiro segue a lógica esperada de provocar circunstâncias em que unirão os pombinhos, e o fator diversão acompanha isso, contudo, falta esse dinamismo de Perez e Galitzine. Ambos conseguem ter carisma de forma individual vivendo seus personagens: Perez se esforça para ser um arquétipo caricato ao que seu papel pede, um galã de comédia romântica, o que não soa a melhor escolha já que a trama decorre na perspectiva de Alex; já Galitzine “precisava” carregar dramaticidade na performance – pelo peso da imagem real, talvez. Por essa individualidade, escapa, apesar das intenções, qualquer firmeza na história, principalmente no atrito que obviamente é a atração comedida entre o príncipe e o filho da presidente.
A consequência disso também é percebida em qualquer momento que a trama trabalhe para impulsionar essa relação – como quando o casal fica escondido numa dispensa na ideia de usar o espaço pequeno para causar um desconforto já que não se suportam -, e uma vez que a dupla de protagonistas atuam à sua maneira, a direção de López continua sendo um problema quando não consegue aproveitar as boas sequências que o filme tem para render – e quem numa comédia romântica faz a proeza de deixar o primeiro beijo anticlímax? O tato apressado do diretor tira o brilho das cenas bonitinhas que o longa tem para colecionar com uma edição repentina, mas até os trocadilhos sexuais – a exemplo da partida de polo – são enfraquecidos pelo senso precipitado da direção.
Talvez por López vir da direção teatral, seja justificável sua execução pouco precisa, mas que ainda consegue fazer de Vermelho, Branco e Sangue Azul um filme divertido com um charme e elegância dignos do formato da Hallmark. A graça de ter um romance gay sendo contado, é que a excitação pelo beijo que só aconteceria no final feliz de uma rom-com é substituída aqui pelos momentos de tensão, atração sexual e autodescoberta, e seria ótimo se Lopez pudesse transmitir com capricho a ideia de fantasia romântica, da explosão de sentimentos, e que esses dois belos personagens que fingem ser amigos acabaram se apaixonando.
Vermelho, Branco e Sangue Azul (Red, White & Royal Blue – EUA, 2023)
Direção: Matthew López
Roteiro: Matthew López, Ted Malawer
Elenco: Taylor Zakhar Perez, Nicholas Galitzine, Uma Thurman, Ellie Bamber, Rachel Wilson, Sarah Shahi, Clifton Collins Jr., Juan Castano, Stephen Fry, Jemma Redgrave
Duração: 121 min