Eu não estava esperando me decepcionar com essa história de Dampyr (embora já tenha começado a me decepcionar com a estranha capa de Enea Riboldi, confesso). Nada aqui, partindo de uma primeira olhada, teria potencial de me desagradar. O texto é de Mauro Boselli, que é um baita escritor. A arte é de Nicola Genzianella, já em sua quinta contribuição para a série; um artista com estilo que me agrada muito. O enredo, por sua vez, tem todos os ingredientes para alcançar um bom nível de qualidade, pois aborda criaturas e personagens icônicos da fantasia e terror da literatura mundial, além de ícones reais da História de Las Vegas. Como imaginar que todo esse combo de personagens bacanas geraria uma história mediana? Bem, é exatamente esta situação que temos em Vegas!, 30ª edição da série Dampyr, originalmente lançada em setembro de 2002.
Aqui temos o retorno do Mestre da Noite chamado Ixtlàn, um dos que eu mais gostei de ver na série até o momento, pelo tipo de gângster charmoso e impiedoso que ele encarna, e por comandar, de maneira inescrupulosa e violenta, grupos de pessoas que regulam a fonte de dinheiro sujo em diferentes lugares. Nós conhecemos esse personagem em A Milícia Sinistra, aventura ambientada na Bolívia, também com um tratamento de guerra entre organizações criminosas. Aqui, o autor volta para esse ambiente violento, lembrando personalidades dos anos 1930 e 1940, misturando a realidade com múmias, Mil e Uma Noites, King Kong, dragões e afins. É uma boa base narrativa! O problema é que o autor não dá um bom direcionamento para essas coisas todas.
O desenvolvimento da trama é aceitável, vale dizer. O leitor só não entende para onde Boselli está conduzindo o texto, a longo prazo. Para uma aventura de caça a um vampiro tão poderoso, contando ainda com Harlan, Tesla e Kurjak em cena, era de se esperar uma ação mais direta frente ao antagonista, mesmo que as coisas não se concluíssem aqui. Mas, exceto pelo estabelecimento das ilusões e mortes interessantíssimas do início do quadrinho, o autor deixa a fantasia em segundo plano e investe tudo numa “história de gângsters”, escolha que não dá tão certo quanto o mesmo tipo de texto apresentado em A Milícia Sinistra. É muito foco num aspecto puramente mundano (apesar de interessante) e um certo abandono daquilo que torna Dampyr uma série chamativa para o leitor. O resultado? Uma parcial enrolação no miolo do volume e uma boa perda de tempo no final, quando a trama se conclui.
Ixtlàn é um Mestre da Noite interessante demais para ser desmascarado ou vencido tão rápido, eu concordo. Adoraria vê-lo mais vezes na série, não estou dizendo que tudo deveria ter sido finalizado aqui. Seus crimes, sua postura desprezível diante do mundo, seu charme e seu pleno uso de poderes me chamaram muito atenção desde que ele surgiu na série, mas realmente não dá para usá-lo como chamariz num contexto em que a guerra contra o crime está na frente do drama (ou toma esse lugar, para ser mais específico), e onde um final insosso afasta o poderoso vampiro apenas com citação. É simplesmente um desperdício de grande personagem e atraso de um bom encerramento de história.
Local de ação: Las Vegas (EUA)
Personagens principais: Harlan Draka, Tesla, Emil Kurjak, Ixtlàn
Dampyr – Vol. 30: Vegas! (Vegas!) — Itália, setembro de 2002
Roteiro: Mauro Boselli
Arte: Nicola Genzianella
Capa: Enea Riboldi
No Brasil: Editora 85 (outubro de 2021)
Tradução: Júlio Schneider
100 páginas