Número de temporadas: 20
Número de episódios: 390
Período de exibição: 31 de janeiro de 1999 até os dias atuais
Há continuação ou reboot?: A série está em andamento, com a 21ª temporada prevista para 2022.
Eu nunca vou esquecer de uma sequência específica de Family Guy: Brian e Stewie estão presos, e, resumindo a cena, Brian precisa comer o cocô do Stewie, que vomita logo em seguida, fazendo Brian comer o vômito também, e, por fim, lamber seu ânus. Sim, é isso que vocês leram, e sim, eu não acredito que acabei de escrever isso. É uma sequência de eventos de um humor tão estúpido, tão nojento e tão ofensivo, mas, para mim, tão inadvertidamente hilário e de certa forma corajoso que eu preciso enaltecer o trabalho de Seth MacFarlane.
Quis abrir a crítica do piloto da série com essa historinha, pois Family Guy acaba sendo muito criticada por não ser uma sátira tão inteligente quanto South Park, ou até mesmo Os Simpsons em seus anos iniciais, mas sempre tive comigo que a animação se encontra mesmo no humor bobo e ofensivo, que, por sua vez, acaba sendo a verdadeira provocação da obra aos espectadores americanos. Diferente de South Park, a produção passa na televisão aberta, e, diferente de Os Simpsons, MacFarlane leva suas piadas para campos tão polêmicos quanto Trey Parker e Matt Stone. Tente imaginar a Globo colocando uma animação dessa no ar e você começa a entender a dimensão do que MacFarlane conquistou – a Fox é, até hoje, a emissora mais conservadora nos EUA.
O piloto da série já traz algumas dessas características para chocar a tradicional família estadunidense (principalmente pensando no contexto do ano de 1999), começando com uma piada irônica sobre suburbanos quando Pete caçoa bairros pobres, e logo depois uma piada sobre Testemunhas de Jeová. McFarlane já começa atirando, algo que vemos pela abertura que tira sarro dos “valores tradicionais e conservadores”. Nesse sentido de chocar, um dos elementos que mais me chama a atenção no episódio é a caracterização de Stewie, um garotinho com cara e personalidade de psicopata tentando matar sua mãe, dispondo de uma dublagem sensacional de MacFarlane, que criou uma espécie de sotaque inglês ruim para o personagem.
Com exceção de Stewie e Pete, os outros membros da família ainda não ganham destaque, com a narrativa se concentrando na sátira do patriarca. Sempre gostei da caracterização de Pete, um homem que não pensa antes no que vai falar, que é estúpido e preconceituoso sem notar, e que faz o que quer e quando quer sem muita consequência. É o arquétipo exagerado do pai de família americano e caucasiano nos anos 80/90, com, claro, infelizes paralelos até hoje.
O piloto como um todo é sobre o egoísmo de Pete, que perde o emprego por bebedeiras, mente para a esposa, engana a assistência social, e, no fim, é perdoado pela justiça e por sua mulher, pois ele “sabia que tudo ia dar certo”. Há um certo amadorismo na comédia, principalmente no timing de algumas piadas e nos cortes de cenas com efeito humorístico (as cenas dos anjinhos, por exemplo), mas são nas pequenas doses de provocação e no conceito geral de satirizar o patriarca que o episódio acaba sendo uma boa introdução. Também senti bastante falta do melhor elemento dos roteiros da animação: cultura pop.
Family Guy, ou, como é chamado por aqui, Uma Família da Pesada, tem suas limitações, oscilando entre momentos divertidos e outros sem graça. Sempre teve limitações, ainda mais hoje depois de tantos anos no ar. Mas o piloto Death Has a Shadow traz a melhor qualidade do trabalho de MacFarlane: olhar diretamente para sua audiência da televisão aberta e provocá-la, às vezes de maneira inteligente, às vezes das formas mais ofensivas e nojentas possíveis, mas sempre usando elementos e piadas polêmicas para criticar e nos fazer rir. Não à toa, o episódio termina com Pete fazendo piadas sobre minorias, assédio sexual e pessoas deficientes…
Family Guy – 1X01: Death Has a Shadow – EUA, 31 de janeiro de 1999
Criação: Seth MacFarlane, David Zuckerman
Direção: Peter Shin, Roy Allen Smith
Roteiro: Seth MacFarlane
Elenco: Seth MacFarlane, Alex Borstein, Seth Green, Rachael McFarlane
Duração: 29 min.