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Crítica | Um Sonho Possível

por Leonardo Campos
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Um Sonho Possível é um filme cheio de boas intenções, mas que infelizmente adentra com força na seara da superficialidade. Em seus 129 minutos de duração, somos apresentados ao enredo focado na edificante trajetória de um garoto negro e marcado pela chaga do estigma da obesidade, algo complexo numa sociedade cada vez mais focada em padrões. Com estilo que nos lembra a linguagem dos telefilmes, o filme tem direção de John Lee Hancock, cineasta que também assumiu o roteiro, inspirado no livro biográfico de Michael Lewis.

Um Sonho Possível segue o estilo “feel good movie”, modelo de narrativa sobre pessoas em busca de realizações pessoais em meio ao opressor e nem sempre alcançável american way of life. No roteiro de Hancock, Michael é colocado como um coadjuvante de presença bastante notável, mas o protagonismo fica em torno de Leigh Anne (Sandra Bullock), personagem que permitiu a primeira indicação e vitória da atriz na cerimônia anual do Oscar.

No passado, Leigh Anne foi garota de torcida, título que lhe permite conhecer bastante de futebol americano. Bem sucedida na fase adulta, atuante na área de design de interiores, ela explica em sua narração de abertura o termo “the blind side”, nomeador do filme. Trata-se de uma tática utilizada quando o quarterback destro prepara um passe e precisa ser protegido pelo atacante esquerdo em relação ao seu “lado cego”, ponto sem visualização que salvas as devidas proporções, lembra o nosso aprendizado sobre ponto cego na condução de veículos.

Após a explicação inicial, somos apresentados a Leigh Anne e seu núcleo familiar estruturado de maneira bem republicana. Tudo muito aparentemente certinho e em seu lugar. Tradicional, o seu lar é composto por Sean Tuohy (Tim McGray), seu marido, e os dois filhos, Collins Tuohy (Lily Collins) e S. J. Tuohy (Joe Head), o segundo, falastrão e presença constante em cena, ao lado de Big Mike, apelido, ou Michael Oher (Quint Aaron), seu nome em registros sociais. Logo na abertura, a família assiste aos passes da filha num campeonato escolar.

No local, o jovem Michael cata as pipocas deixadas de lado e logo depois caminha pela gélida área externa, até ser avistado pela família Tuohy. Excessivamente caridosa e de grande coração, Leigh Anne pede que o marido pare o carro para dar assistência ao jovem, levando-o para sua casa. É neste momento que se estabelece o ponto de partida. Big Mike é levado, recebe atenção e acaba tornando-se parte da família que acredita em seu potencial e investe na educação, na saúde e no bem-estar do garoto que cresceu numa redoma asfixiante, com a mãe viciada em drogas e um mundo de crime ao redor de sua existência.

Diante da situação exposta, a narrativa segue um caminho já esperado. Os desafios do jovem no que tange sobreviver dentro de um mundo que até então não fazia parte, os dribles dentro e fora de campo nos treinamentos, haja vista o preconceito racial e social vigente, o instinto de maternidade aflorado em Leigh Anne e perpetuado em suas ações como matriarca bastante presente e com poder de decisão no seio familiar, dentre outros pequenos conflitos que não chegam a fazer diferença dramática ao longo da jornada dos personagens.

Comparado ao protagonista Pip, do romance Grandes Esperanças, de Charles Dickens, Michael Oher recebe a educação formal pela professora particular Sue (Kathy Bates). Ele precisa ser bom além dos esportes, pois para adentrar nos grandes times e na universidade, depende de notas mínimas para aprovação, independente do dinheiro que a família possua.  Narrado de maneira linear, permeada em alguns trechos por flashbacks explicativos desnecessários, Um Sonho Possível trabalha bem o seu design de produção, assinado por Michael Corenblith, profissional com setor responsável pela construção da visualidade interligada aos temas apresentados.

Os quartos, as salas e os ambientes externos conectam-se adequadamente com os perfis de seus personagens, enquadrados de maneira industrial pela direção de fotografia de Alan Kivilo. Leia-se industrial o tipo de produção de imagens que segue uma padronização fixa, sem ousadia ou irreverência, tendo como foco práticas que seguem as regras mais básicas dos manuais de linguagem cinematográfica, sem uma gota sequer de subversão. Os figurinos de Daniel Orlandi também colaboram com a construção visual dos personagens, adequados ao contexto, elementos que em conjunto, são acompanhados pela trilha pouco intrusiva de Carter Burwell, o que ajuda a produção a diminuir o tom de artificialidade já escancarado pelas escolhas dramáticas do roteiro.

Lançado em 2009, Um Sonho Possível não se apresenta como um filme potencialmente ruim, mas carece de expressividade, pois em diversos momentos a trama trafega pela obviedade, pelo sentimentalismo excessivo e focado constantemente em ser lacrimejante. Grandes conflitos, tais como a questão racial discutida na mesa de almoço com as amigas de Leigh Anne, além do impacto da chegada de um membro fora da realidade da família, mas recebido de maneira amistosa e tranquila, sem problematizações, tornam o roteiro um punhado de soluções dramatúrgicas fáceis e calculadas para fazer o filme avançar de maneira palatável.

Um Sonho Possível — (The Blind Side) Estados Unidos, 2009.
Direção: John Lee Hancock
Roteiro: John Lee Hancock, Michael Lewis
Elenco: Sandra Bullock, Quinton Aaron, Stacey Turner, Tim McGraw, Tom Lemming, Tom Nowicki, Kathy Bates, Kelly Johns, Kevin Nichols, Kim Dickens, L. Warren Young, Lamont Koonce, Libby Whittemore, Lily Collins, Lou Holtz, Maria Howell, Matthew Atkinson, Melody Weintraub, Michael Fisher, Nick Saban, Omar J. Dorsey, Omid Soltani, Patrick G. Keenan, Paul Amadi, Phillip Fulmer, Preston Brant
Duração: 129 min.

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