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Crítica | Um Amor a Cada Esquina

Lembranças de um verão.

por Fernando JG
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Uma atriz, um senhor obcecado por ela, uma psicóloga, um diretor de teatro e sua esposa, um detetive e seu filho, se encontram numa trama amorosa no centro de Nova York. Amarrados por um roteiro lúdico que os faz cruzarem os caminhos, os protagonistas não se furtam a se envolverem uns com os outros, mesmo que isso custe separações, intrigas e desafetos. Com ares de cinema woodyalliano, Um Amor a Cada Esquina marca o retorno do diretor após um hiato de 13 anos e retrabalhando um roteiro escrito há mais de duas décadas. 

Peter Bogdanovich parte de um texto dramático para depois explorar uma comédia-maluca de feição romântica. Sendo assim, é de bom grado que escolha iniciar sua película com a fala de uma mulher, a Isis (Imogen Poots), que diz acreditar em finais felizes. E continua numa reflexão banal sobre a ideia do encontro amoroso ideal: espera-se a pessoa perfeita num lugar marcante, mas, em verdade, o momento do encontro acontece na hora mais inesperada e com a pessoa mais despersonalizada de todas. Aos poucos, o cineasta transforma o relato em imagens, isto é, a narração em filme. Todo o longa é marcado pelo recurso da retrospecção, de uma atitude narrativa que retorna para acontecimentos passados. A fala de Isis marca inteiramente o enredo de Bogdanovich, que trabalha de modo muito despreocupado com temas melodramáticos da meia-idade num estilo dócil e numa forma agradável. A cena primeira determina o tom que será adotado ao longo da uma hora e meia de tela. 

A estrutura enredística é interessante e se desenrola a partir de um diálogo que, por sua vez, é o responsável por abrir as portas para a ficção e no específico do específico transforma a trama num jogo viciante em que a narração do envolvimento entre os personagens transforma-se num “gato e rato” divertido por meio do qual se trabalha, com naturalidade, as consequências desses encontros fortuitos para cada um dos personagens, sobretudo para os comprometidos, que impulsionam a ação do filme. Fato é que, a cada ato, o longa produz nós rígidos, gerando um gaming de causalidade, em que torna obrigatório a resolução dramática nos atos finais, e o desenlace desses nós amarrados ocorre numa tonalidade risível – e ridícula – que caracteriza os fatos. Quero dizer, as descobertas e as reconciliações acontecem no ponto exato, previsível, claro, mas divertidíssimas. 

Em vez de apostar num melodrama, escolhe o cineasta envenenar, com muita amabilidade, o seu enredo com ações inusitadas, encontros ao acaso, peripécias hiperbólicas e algum clímax que, ao chegar ao ápice, provoca o riso. A comédia é trabalhada com elementos do nonsense como uma maneira de trazer leveza e despojamento à película. A propósito, a presença do screwball-comedy conta com o apoio de cenas refrescantes mas contidas se comparadas às feitas em Essa Pequena é Uma Parada. O drama-romântico, embora envenenado pelas maluquices, aparece em cada alínea do enredo, sobretudo no retorno ao relato da personagem, fazendo o filme entrelaçar um gênero ao outro, demonstrando versatilidade cinematográfica. Gosto demais do Owen Wilson e acho que todo filme com ele tem algo de bom e gentil a oferecer; Jennifer Aniston cumpre seu papel; Quentin Tarantino aparece num episódio de alívio cômico e os demais atores oferecem uma base excelente a todo o elenco. 

Lúdico, aconchegante e agradável, o amor moderno de Bogdanovich não tem medo de ser óbvio, e talvez seja isso mesmo que busque. Quer ser veloz e divertido como um encontro fortuito numa temporada de verão. Não diria nem amor, nem paixão, mas o que o cineasta trabalha aqui são afetos próximos a um desejo muito adocicado com ingenuidade, que não permanece como o amor, e nem arde como a paixão, mas que gera boas lembranças quando a epopeia é finalizada. Sua comédia-romântica é exatamente como deve ser uma peça do gênero, e por se fazer tão despreocupada, propositalmente clichê e divertida, não causa o incômodo e deleita do início ao fim.

Um Amor a Cada Esquina (She’s Funny That Way, EUA, 2014)
Direção: Peter Bogdanovich
Roteiro: Peter Bogdanovich,  Louise Stratten
Elenco: Owen Wilson, Imogen Poots, Jennifer Aniston, Kathryn Hahn, Will Forte, Rhys Ifans, Austin Pendleton, George Morfogen, Cybill Shepherd, Quentin Tarantino
Duração: 94 min.

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