O segundo volume de Ultimate X-Men segue a abordagem inusitada que a roteirista/artista Peach Momoko apresentou nas seis primeiras edições da série, com a reimaginação do grupo dos X-Men através de personagens japoneses, na curiosa inspiração da autora em mangás e em J-Horror. Depois de um primeiro volume paciente e envolvente que estabelece a narrativa de mistério e de terror em torno de Hisako Ichiki e suas colegas mutantes que aos poucos descobrem seus poderes enquanto enfrentam o Shadow King, retratado aqui praticamente como uma entidade demoníaca, partimos para um segundo arco da série que explora mais a fundo o conceito da sociedade secreta de mutantes.
A sugestão da quinta edição de que o culto é uma forma de controle do Criador se confirma nesse volume, onde aprendemos um pouco melhor do funcionamento interno da sociedade e como a mesma é utilizada como uma ferramenta de controle dos mutantes – as correlações com instituições religiosas não são meramente ilustrativas. Mais uma vez, Momoko segue bebendo de elementos de Fugitivos e de mangás com cenários escolares, mas com um tom maduro, pesado e que ganha foco aqui na temática de exploração infantil e abuso parental (emocional, físico e sexual), em adição aos já abordados temas sobre suicídio, depressão e bullying. Aos poucos, a história vai sendo moldada em uma rebelião juvenil contra seus perpetradores (na mesma linha da insurgência dos Ultimates, mas em um contexto doméstico), ganhando dimensão quando a sociedade e a existência dos mutantes se torna informação pública, com preconceito e medo coletivo da humanidade ganhando espaço na história, aproximando-se da mitologia dos X-Men.
Momoko faz um bom trabalho narrativo em aumentar o escopo da HQ, que pela primeira vez soa menos contida e com um impacto maior dentro do quadro geral desse novo Universo Ultimate (denominado Terra-6160), mas mantendo as características intrínsecas da trama (não temos qualquer fator exterior, com exceção da introdução de Viper, que trabalha diretamente para o Criador) e o nível de pessoalidade com o grupo principal das adolescentes, que inclusive aumenta com a introdução da Psylocke (Kwannon, não Betsy Braddock), Mori (uma versão da Molly Hayes) e Natsu (uma reimaginação feminina do Ciclope). O desenvolvimento dramático em torno das jovens segue sendo um destaque, com a atmosfera de terror psicológico em uma crescente de momentos perturbadores e um trabalho artístico afiado na construção das cenas de horror, que intensificam os momentos de ação, sempre transbordados de dramas densos e perseguições mentais.
No entanto, vejo uma pequena queda de qualidade nesse volume no que tange a estrutura narrativa, mas não por causa do escopo maior. Seja pelo aumento de personagens, seja pela introdução de várias subtramas envolvendo diferentes figuras da sociedade secreta de mutantes, Momoko parece perder um pouco do controle da colagem de núcleos, com muitos momentos soando desagarrados ou simplesmente confusos, incluindo um uso estranho de elipses. Por exemplo, temos todo um bloco envolvendo Maystorm reunindo um grupo de combate que desagua em uma grande luta… que simplesmente não vemos o resultado. A própria Hisako Ichiki perde alguns dos holofotes no meio de tanta coisa nova. Também vejo um certo problema aqui na paciência da autora, que perde um pouco o senso de ritmo em algumas edições. São problemas pontuais, porém, que não atrapalham o todo do volume.
Mesmo perdendo o tato da história aqui e ali, Momoko segue explorando e desenvolvendo os elementos que tornaram sua série uma leitura interessante. A densidade dramática segue aumentando com temas delicados e com um nível de importância bem grande dentro da história, com destaque máximo para o confronto de Shadow King e Hisako na reta final do volume, em que o antagonista culpa a protagonista pela morte de seu melhor amigo. A peças se movendo em torno do quadro geral desse universo, a apresentação do culto dos mutantes, os novos personagens e o foco cada vez maior no misticismo (incluindo boa participação de Nico Minoru) agregam bastante à história desse segundo volume, mas são nos momentos de tensão e de horror dos dramas psicológicos que a obra continua brilhando com mais força, agora com Hisako enfrentando um inimigo que personifica sua culpa; uma quase literal batalha contra seus demônios. Não tenho ideia de como a Momoko planeja construir uma equipe dos X-Men através de tudo isso, mas caramba, estou intrigado!
Ultimate X-Men – Vol. 2 | EUA, 2024-2025
Roteiro: Peach Momoko
Arte: Peach Momoko
Letras: Travis Lanham
Editoria: Wil Moss, Michelle Marchese, C.B. Cebulski
Editora: Marvel Comics
Páginas: 201