O universo criado pelo cartunista Maurício de Sousa atravessa gerações e, em função disso, quando os filmes Turma da Mônica – Laços (2019) e Turma da Mônica – Lições (2021) foram lançados nos cinemas brasileiros, juntamente à minissérie Turma da Mônica – A Série (2022) – em uma espécie de trilogia -, o sucesso foi estrondoso entre o público, tanto o infantil quanto o adulto. Dessa maneira, em função da direção do espetacular Daniel Rezende, é de esperar que a narrativa da turminha mais amada do país continue mantendo a sua mesma essência nos diversos cenários em que podemos consumir as histórias do famoso e querido bairro do Limoeiro. Então, nessa nova produção, continuamos a ver os principais traços de Rezende, que mantém a alma da infância criada por Maurício de Souza nesta nova série do Globoplay, intitulada Turma da Mônica – Origens.
Nela, há a vivência da turminha liderada pela personagem Mônica em duas fases da vida: na infância e na velhice — uma grande novidade bem-vinda –, já que eles estavam sendo interpretados até a adolescência, como no péssimo Turma da Mônica Jovem – Reflexos do Medo (2024). Além disso, em um formato com uma sensibilidade extraordinária, somos apresentados a respeito da origem do grupo, ou seja, como o encontro e a amizade deles tiveram início. Eles, então, se reúnem novamente na casa dos 70 anos pelo fato de a Mônica idosa, interpretada pela atriz Louise Cardoso, ter pedido a memória após sofrer um acidente e, com isso, ela não se lembra mais dos seus amigos. Dessa forma, a Turma da Mônica da terceira idade se reúne para contar o momento como eles se conheceram no Limoeiro Palace Hotel, com o objetivo de ajudar a protagonista a recuperar as suas faculdades mentais. Contudo, isso deveria ocorrer antes da passagem de um raro cometa, mesmo evento astronômico que eles acompanharam na infância, há exatos 63 anos. A ideia é relativamente simples, um tanto enxuta, o que faz dela não ser considerada original, isto é, um enredo fraco, não desenvolvendo de maneira expressiva e dramática o núcleo adulto. Talvez os roteiristas não quisessem aprofundar um drama denso por se tratar de uma série voltada para o público infantojuvenil, mas eles poderiam ter inserido os percalços da fase idosa e os seus desdobramentos, desde o surgimento de alguma doença ou o falecimento de um ente querido.
Outro ponto negativo foi a incoerência de dois personagens principais do grupo das crianças: a Mônica (Giovanna Urbano) e Cebolinha (Felipe Rosa). No caso da primeira, ela ficou em todos os oito episódios com trejeitos e feições de uma garotinha rabugenta, e não brava e violenta, como é de costume vê-la nesses aspectos nas outras produções já citadas. Essas características estão diretamente relacionadas ao segundo, uma vez que o Cebolinha não milabolou, por exemplo, os famosos “planos infalíveis” contra a sua amiga. Consequentemente, ambos não estavam nas essências de seus personagens, pelo menos no sentido de seus comportamentos como crianças, como no último episódio, em que o Cebolinha infantil e o Cebolinha idoso decidem dar o famoso nó nas orelhas do Sansão para a indignação e a raiva da Mônica, com ela demonstrando uma certa violência em querer agredir o coleguinha; pelo menos se não me falha a memória foi a única vez em que eu vi ele tendo esse comportamento, com a pequena Mônica girado o seu melhor amigo no ar. Eu estava torcendo para que o Cebolinha estivesse envolvido com o sumiço do bichinho de pelúcia, apesar de ter adorado a participação especial do Maurício de Sousa nos segundos derradeiros do final da temporada, que mostrou o responsável por inserir o Sansão na máquina de brinquedos de pelúcia.
Já no que diz respeito ao núcleo adulto escolhido, percebe-se que ele foi selecionado com muito cuidado, excelência e respeito em relação aos lendários nomes da teledramaturgia brasileira para interpretar a Mônica (Louise Cardoso), o Cebolinha (Daniel Dantas), o Cascão (Paulo Betti), a Magali (Malu Valle) e a Milena (Dhu Moraes) na melhor idade. Eles incorporaram perfeitamente a turminha, mantendo sempre aquela inocência infantil embora já não mais conseguissem alongar o corpo em uma aula de yoga ou correr longas distâncias durante a realização de uma atividade física, por exemplo. Os atores transbordaram um carinho tão gigantesco sendo eles os intérpretes desses personagens tão queridos por nós, brasileiros, que a torcida aqui é grande para uma possível continuação em uma 2ª temporada. Quem aí não deseja ver o Paulo Betti, na pele do Cascão, fugindo de um banho de mar ao viajar para a praia com os amigos em novos episódios de Turma da Mônica – Origens, hein?!
Por outro lado, no elenco infantil, temos o destaque para a Milena (Sabrina Souza), que mesmo procurando mil e um motivos para não se mudar para o bairro do Limoeiro com a sua família, foi arteira e perspicaz na anotação de todos os detalhes do grupo. Já podemos considerar, por exemplo, que a palavra inteligência faz parte do seu sobrenome, afinal de contas ela foi esperta – e um tanto carismática, seja na infância, seja na velhice – ao descobrir que a Denise (Mel Dutra) estava aprontando para alterar o resultado da gincana promovida pelo Denilson (Marcos Veras), o seu pai e gerente do hotel, juntamente à divertida participação do Tio da Recreação (Érico Brás). Ademais, Cascão (Bernardo Faria) e Magali (Manu Colombo), ao contrário da Mônica e do Cebolinha, estavam excepcionais em suas tramas, com ele morrendo de medo de água em qualquer situação – passando gel no cabelo e tomando banho de perfume -, em contrapartida tivemos ela comendo toda a comida do frigobar do quarto e também da mesa durante a competição do futebol de sabão.
Somado a isso, precisamos elogiar a produção, que mais uma vez teve cenas gravadas na cidade de Poços de Caldas, em Minas Gerais. Lá, o universo do Limoeiro foi criado de forma certeira, tendo uma identidade própria e encantadora: a fotografia e os cenários remetem aos dos dois filmes e a minissérie citados no início desta crítica, a estética dos personagens é condizente às anteriores e o figurino é lindo e semelhante aos antecessores. Destaque também para a atriz Mônica Iozzi, interpretando novamente a Dona Luísa, a mãe da Mônica, de maneira doce e cativante. É nítido a preocupação de eles manterem a essência da Turma da Mônica viva embora haja obviamente diferenças entre os filmes e as séries, porque aos olhos do público, ao meu ver, o que encanta são os pequenos detalhes que não podem ser perdidos ao longo do tempo. Se a Maurício de Sousa Produções (MSP) continuar tendo esse carinho e, muito provavelmente, permanecerá, não resta dúvida: as novas produções da Turma da Mônica continuarão acalentando os corações dos fãs, perpetuando, assim, por longevas gerações brasileiras.
Com um roteiro sensível, que explora a passagem do tempo e a relevância de se manter memórias compartilhadas com os amigos, Turma da Mônica – Origens é mais um sucesso consagrado dessa família amada há mais de 60 anos. Isso foi notório na intercaladas de cenas entre o passado e o presente, em um diálogo tocante e sensível sobre as inevitáveis mudanças da vida e o impacto duradouro de se manter fiéis amigos ao longo dos anos. O seriado consegue ser uma obra encantadora, transcendendo a simples nostalgia ao oferecer aos telespectadores uma reflexão sobre a amizade na infância e no envelhecimento, momentos presentes na vida de qualquer ser humano. De fato, Turma da Mônica – Origens – mesmo tendo apresentado alguns equívocos no roteiro, como o fato da existência de um hotel com o mesmo nome do bairro do Limoeiro – conseguiu emocionar, divertir e arrancar lágrimas, oferecendo ao público, mais uma vez, pura emoção e nostalgia.
Turma da Mônica – Origens (Brasil, 24 de Outubro de 2024)
Showrunner: Daniel Rezende, Marina Maria Iorio
Direção: Isabel Valiante
Roteiro: Marina Maria Iorio, Fernanda de Capua, Yann Lima, Verônica Honorato, Rose Caetano
Elenco: Giovanna Urbano, Felipe Rosa, Manu Colombo, Bernardo Faria, Sabrina Souza, Louise Cardoso, Daniel Dantas, Malu Valle, Paulo Betti, Dhu Moraes, Érico Brás, Marcos Veras, Mel Dutra, Bernardo Soares, Érico Brás, Monica Iozzi, Luiz Pacini, Fafá Rennó, Felipe Rocha, Marcela Rosis, Beto Schultz, Angélica de Paula, Adriano Paixão
Duração: 6 episódios com cerca de 24 min. cada