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Crítica | Três Dias de Amor (1949)

Crime, paixão e princípios do neorrealismo.

por Luiz Santiago
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René Clément é um daqueles ilustres diretores “desconhecidos” do cinema que possui uma obra sólida e, em certa medida, fundamental para um período da cinematografia de seu país. Com filmes notáveis como Brinquedo Proibido (1952) e O Sol por Testemunha (1960) Clément encabeçou a geração de cineastas franceses pós Segunda Guerra Mundial, contribuindo para a inclusão da semente neorrealista na França e fazendo de histórias íntimas e melancólicas o grande marco de seu cinema.

Três Dias de Amor (1949) não é exatamente um filme glorioso e especial, mas é um bom exemplo dentre os longas que expunham a condição da parte pobre da sociedade nos países afetados pela guerra. A obra lança mão de ingredientes do realismo poético francês e coloca o ator-molo desse movimento para interpretar um condenado que desembarca na Itália e tem os seus planos de vida (ou falta deles) mudados após conhecer uma garçonete — e sua filha Cecchina.

Para Jean Gabin, este tipo de papel não era novidade. Um dos longas mais conhecidos do início de sua carreira, O Demônio da Algéria (1937) tinha praticamente o mesmo formato e ideias centrais, o que localiza o o ator em um universo confortável, ajudando em sua boa interpretação, mas sem muitas novidades. Todavia, será a partir dele que a história ganhará afluentes, sendo os dois principais protagonizados por duas mulheres, a bela Isa Miranda como uma garçonete marcada pela vida, por um mal casamento e pela paixão; e Vera Talchi no lugar de Cecchina, a garota enciumada da mãe que não consegue evitar a afeição imediata que sente pelo misterioso francês Pierre.

Clément leva o filme a partir de dois tons dramáticos. Na primeira metade do filme, ele adota uma forma que investiga mais o espaço, procura conhecer a cidade em vários períodos do dia e em lugares diferentes. O roteiro tem aqui a sua melhor fase, com bons diálogos de apresentação e cenas de contexto muito bem inseridas. O público se sente chegando neste novo lugar; vê-se conhecendo novas possibilidades de vida e percebe que a paixão tenta encontrar espaço em meio a tanta fuga e frustração.

Na segunda parte do longa, porém, o desenvolvimento abandona essa linha rica de apresentação e passa muito tempo explorando o quase-romance de Pierre e Marta, que sabemos que não irá se concretizar devido a luz de moralismo do roteiro. Isso não é exatamente um empecilho para a crítica feita à organização social na Europa em fins da década de 1940, mas acaba fechando os caminhos anteriormente abertos, ainda mais em uma situação que aponta para a tragédia, não de caráter neorrealista mas sim romântico. Isto pesa sobre o filme, com todos os seus pequenos clichês e melancolia reticente que se espalha na reta final, curiosamente, momento onde a direção volta a ser ágil, a montagem mais exigente e a trilha sonora cumpre um papel muito mais positivo do que em todo o restante da fita.

De certa forma, é possível compreender a simpatia que a Academia teve sobre o filme a ponto de premiá-lo o Oscar Honorário em 1951. A obra é tocante e o teor familiar ligado ao conceito de reconstrução pós-guerra sempre gera grande engajamento do público, talvez por ser um tipo diferente de história de superação pelas quais todos nós temos uma quedinha. Essas coisas aliadas a um primeiro ato bom na forma e no texto e um final triste e humano (apesar de moralista), dão a Três Dias de Amor uma dose extra de aceitabilidade. No fim, a obra é boa e válida pelo período em que foi filmada e pelo cenário que mostra. Mas não se trata de algo indispensável e sem o qual nenhum cinéfilo conseguirá viver.

Três Dias de Amor (Le mura di Malapaga) — Itália, França, 1949
Direção: René Clément
Roteiro: Cesare Zavattini, Suso Cecchi D’Amico, Alfredo Guarini
Elenco: Jean Gabin, Isa Miranda, Vera Talchi, Andrea Checchi, Robert Dalban, Ave Ninchi, Checco Rissone, Renato Malavasi, Carlo Tamberlani, Vittorio Duse
Duração: 104 min.

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