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O fenômeno dos Trekkies é algo incontestável. Nunca se viu fãs que realmente deixam de ter suas vidas e se condicionam a viver pela Federação. Por mais que a comunidade de Trekkers seja tremenda, é difícil de pensar que esse tema conseguiria sustentar novamente um documentário de mais de 90 minutos. Star Trek é uma série que pode, e deve, ser debatida por muitas e muitas horas, mas com tantas discussões políticas e sociais que podemos abordar com a série, será que produzir outro longa sobre seus fãs é algo necessário?
Logo no começo do filme já se nota a diferença de linguagem entre as produções do primeiro e do segundo longa. Como o seu antecessor foi feito no ano de 1997, não se via muitos elementos gráficos inseridos no documentário. Já Trekkies 2 foi lançado em 2004, uma época que o uso, de forma exagerada, desses efeitos era muito grande. Vemos logo no começo do filme, a Enterprise voando, o espaço e até mesmo um bebê gigante feito de computação gráfica.
Outra grande diferença entre os dois documentários é a sua narrativa. Talvez pela falta de orçamento, ou até a linguagem mais lenta da época, o primeiro documentário era mais focado em poucas histórias, não víamos a equipe ultrapassando a linha dos EUA para procurar grandes contos da série. Já aqui, temos uma produção que viaja para quase todo o globo. Vamos à Itália, Inglaterra, Austrália, EUA, França e até mesmo o nosso querido Brasil.
Em vez de focar em poucas histórias, Trekkies 2 gosta muito de quantidade, acompanhamos os relatos de muitos fãs da série. Isso é algo interessante, pois vemos o quão grande é esse fandom, porém também tem seu lado ruim já que ver muitos e não focar em poucos é algo que deixa o documentário muito pouco pessoal.
Trekkies 2 tem a presença de uma narradora, Denise Crosby, que aparece não apenas em off, como também ganha destaque em vários momentos da narrativa, transformando o documentário em uma espécie de matéria jornalística. Isso é bom, uma vez que não ter um fio que ligasse e guiasse toda a narrativa era um erro no primeiro longa. Deixar que as pessoas contem a história é algo muito interessante, mas também muito perigoso. A “trama” se divide em capítulos, essas partes são definidas principalmente pelos locais visitados. Quando a produção muda de país, automaticamente ela começa a contar outra história.
O diretor Roger Nycard tem a coragem de inserir alguns questionamentos muito interessantes durante o documentário. Digo coragem pois, indagar um Trekker a respeito do extremismo de seu comportamento é algo muito perigoso. Nycard levanta perguntas como “as pessoas passam dos limites?”. Isso é muito válido quando se fala do fandom de Star Trek. O primeiro documentário já tratava sobre esse assunto, mas o diretor não o abordou como um capítulo à parte na narrativa. Neste é dado muito mais importância para esse polêmico assunto. Como relatei no começo, essa comunidade é muito apaixonada e esse amor por muitas vezes é tão grande que ultrapassa a própria personalidade da pessoa.
Deixar de ser quem é para se tornar um fã é um tema abordado pelo documentário. Vemos uma comunidade muito dividida. Temos os extremistas, que vivem pela série, e os fãs casuais, que amam e entendem da série, mas não vivem por ela. É documentado até uma rixa entre os trekkies e trekkers – se você não está familiarizado, na comunidade de Star Trek, Trekkies são os fãs que amam mas não se vestem e não vivem para a série enquanto que Trekkers são a parte extrema do fandom, que vive pela Enterprise.
Fanático ou não, todos os fãs quando perguntados por que Star Trek é um amor, respondem quase a mesma coisa: os ideais da série são com certeza a razão da paixão. Isso é o principal, pois a saga é uma utopia da humanidade, vemos ali algo que um dia queremos chegar a ser. Pessoas que não pensam apenas em si próprias, mas que estão ligadas por uma comunidade, como uma família. Roger Nycard faz questão de mostrar muitos trabalhos de caridade sendo feitos pela maioria dos fãs, e quase todos os entrevistados relatam sobre o cuidado com o próximo, e é sobre isso que Star Trek trata.
O diretor dedica uma boa parte do seu documentário para mostrar a quantidade de pessoas que fazem músicas à respeito da série, quase todos os trinta minutos finais do longa são dedicados para as bandas de Star Trek, a proposta é muito interessante; mostrar algo que não se imagina que o fandom da Saga faz, mas depois de seus primeiro minutos, toda essa parte do filme fica um pouco cansativa.
Sente-se muita falta de relatos da tripulação da Enterprise, nenhum membro da tripulação original da série é visto durante o documentário. Isso conflita muito com Trekkies, que tem muitos relatos interessantes sobre os bastidores e até mesmo sobre a influência da saga. Mostrar apenas o lado dos fãs, e não ter quase nada que mostre o lado de quem viveu de fato a série, é evidenciar apenas uma parte do todo, e a parte “omitida” faz muita falta.
Com uma narrativa mais dinâmica, efeitos gráficos desnecessários e muitas outras coisas iguais a seu antecessor, Trekkies 2 não brilha mais que o primeiro. Talvez seu maior mérito seja evidenciar os exageros da série. Porém, esse acerto é ofuscado pela falta de Leonard Nimoy, Willian Shatner, George Takei e muitos outros nomes que não podem deixar de aparecer quando o assunto é Star Trek.