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Crítica | Tio Patinhas e a Moedinha do Infinito

O multiverso dos Patinhas.

por Ritter Fan
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Apesar de não lê-los há anos (décadas, na verdade), os quadrinhos da Disney sempre foram muito especiais para mim, pois representaram minha introdução às HQs ainda em tenríssima idade, antes de aprender a ler (segundo meus pais me diziam, pois obviamente que eu não me lembro de patavinas). E, dentre tudo que já li do que foi publicado por aqui, a Família Pato (que, porém, não tem só pato) sempre teve um lugar especial em meu coração, com a coroa de personagem favorito indo muito facilmente para o Tio Patinhas. E digo favorito mesmo, pois, apesar de eu nunca ter feito um ranking, nem mesmo mental, tenho certeza de que ele está ali no meu Top 3 de melhores personagens de quadrinhos como um todo.

Como estava esse tempo todo longe de Patópolis e dos seres emplumados de lá, fiquei muito feliz e curioso quando a Marvel Comics anunciou que lançaria a primeira HQ da Disney sob sua bandeira e que ela seria protagonizada por ninguém menos do que o sovina do Patinhas em uma aventura cujo título, quase inevitavelmente, faz referência às Joias do Infinito de Thanos e de diversos vilões e super-heróis da editora. Não tive dúvida alguma que leria a HQ no dia de seu lançamento e que, independente de qualquer outra coisa, eu a adoraria sem reservas, feliz como um pinto no lixo que eu estava. E sim, eu adorei sem reservas o que Jason Aaron escreveu e uma equipe de artistas italianos (que, como todo mundo sabe, é o país natal de muitas HQs originais boas demais da Disney) desenhou, cada um ou cada dupla responsabilizando-se por cada um dos três capítulos mais o epílogo. É apenas meu chapéu – que eu não comi ainda como o Patinhas já comeu diversas vezes – de crítico que me impede de dar avaliação máxima a Tio Patinhas e a Moedinha do Infinito.

O que Aaron faz é uma gostosura de referências à toda a trajetória do personagem titular pelas hábeis mãos de seu incomparável criador Carl Barks e pelo grande Don Rosa, que tinha Barks como seu ídolo. Para fazer isso e ao mesmo tempo contar uma história com sentido, ele usa o “método Marvel” e joga o multiverso no mix, retornando para a história Natal na Montanha Urso, publicada em dezembro de 1947 e que marca a primeira aparição do Tio Patinhas e basicamente indaga: o que aconteceria se Donald e seus sobrinhos não tivessem chegado na cabana de Patinhas? A resposta é, em retrospecto, bastante simples e mostra a esperteza de Aaron, ou seja, o evento mergulha aquele Patinhas quase vilão que vemos na história em uma espiral de solidão, raiva e ambição que o leva ao uso do espelho da Maga Patalógika em combinação com sua Moedinha nº 1 para acessar outras realidades e roubar as caixas-fortes de suas variantes por todo o multiverso, tornando-se, então, o Patinhas Acima de Todos.

No entanto, quando ele chega no universo do Tio Patinhas que nós conhecemos há décadas, aquele sovina gente boa (ops, sovina pato bom) que, em sua primeira história, foi visitado por Donald, Huguinho, Zezinho e Luisinho, o Patinhas Acima de Todos finalmente encontra um rival à altura que se recusa a aceitar que seus quaquilhões sejam roubados mesmo quando não há mais esperanças de recuperar a caixa-forte sugada em um vórtex mágico. Patinhas – o nosso Patinhas! -, graças à ajuda do Professor Pardal (que não é um pardal, mas sim um frango), parte em uma jornada também pelo multiverso para arregimentar a ajuda de seus outros “eus” e, então, a aventura toma proporções épicas. Um aviso, porém, aos que forem mais “chatos”: as outras versões do Patinhas que vemos estão mais para versões do mesmo universo que conhecemos, só que de outras épocas, mas isso é um detalhe, até porque podemos muito facilmente aceitar que essas versões vêm de outros universos e pronto, não se fala mais nisso.

Meu problema com a história de Aaron é que ela é ambiciosa demais, bacana demais para ser contada em 20 e poucas páginas (a HQ tem quase 60, mas o restante é composto pelas capas alternativas – há muitas! – e pela republicação da primeira história do Patinhas que citei acima) como se fosse uma aventura comum do personagem. Para um evento desse naipe, que marca o possível começo da publicação das histórias da Disney pela Marvel Comics e que conta como infinitos Patinhas, além de um vilão Patinhas sensacional, Tio Patinhas e a Moedinha do Infinito simplesmente tinha que ter ganhado um tratamento ainda mais especial, ou transformando o one-shot em uma minissérie que explorasse de verdade a jornada do protagonista pelo multiverso, o que seria ideal, ou, no mínimo dos mínimos, contendo o triplo de páginas. Trata-se de um desperdício de premissa espremer tanto em tão pouco espaço. Um desperdício maravilhosamente nostálgico e divertido, sem dúvida, mas, mesmo assim, um desperdício. E, com isso, Aaron escreve um texto acanhado, podado, tentando encaixar um mundo de coisas em um mínimo de páginas e ele nem sempre consegue encontrar um equilíbrio narrativo perfeito, pecando no uso excessivo de saltos temporais e obrigando os artistas a usar artifícios bobos como o sombreamento de personagens para manter o suspense.

Falando na arte, apesar de haver quatro conjuntos de desenhistas – Paolo Mottura sozinho no Capítulo 1; Francesco D’Ippolito e Lucio de Giuseppe no Capítulo 2; Alessandro Pastrovicchio e Vitale Mangiatordi no Capítulo 3 e Giada Perissinotto no Epílogo – existe uma harmonia fantástica entre os estilos. Não que os desenhistas tenham aberto mão de seus estilos para fazer algo uniforme, pois é evidente que eles mantiveram suas pegadas próprias, mas a questão é que há uma complementariedade suave entre cada capítulo, como por exemplo os traços mais expressivos de Mottura funcionando bem para a origem do Patinhas do Mal e a vitalidade da arte de Alessandro Pastrovicchio e Vitale Mangiatordi sendo a escolha ideal para as sequências movimentadas e até tumultuadas do capítulo seguinte.

Tio Patinhas e a Moedinha do Infinito é uma enorme promessa que frustra um pouco o leitor que esperava – como eu – uma grandiosidade equivalente para um evento editorial dessa categoria. Por outro lado, a HQ é uma absolutamente envolvente aventura com o Tio Patinhas e suas várias outras versões que acerta em cheio na nostalgia e, no final das contas, entrega uma história que faria bonito como parte de qualquer almanaque do pato mais pão-duro do multiverso.

Tio Patinhas e a Moedinha do Infinito (Uncle Scrooge and the Infinity Dime – EUA, 2024)
Roteiro: Jason Aaron
Arte: Paolo Mottura (Capítulo 1); Francesco D’Ippolito (Capítulo 2); Alessandro Pastrovicchio e Vitale Mangiatordi (Capítulo 3); Giada Perissinotto (Epílogo)
Arte-final: Paolo Mottura (Capítulo 1); Lucio de Giuseppe (Capítulo 2); Alessandro Pastrovicchio e Vitale Mangiatordi (Capítulo 3); Giada Perissinotto (Epílogo)
Cores: Arianna Consonni
Letras: Joe Caramagna
Editoria: Mark Paniccia, C.B. Cebulski
Editora original: Marvel Comics
Data original de publicação: 19 de junho de 2024
Páginas (excluindo a reimpressão de Natal na Montanha Urso, de Carl Barks): 29

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