Stan Lee tem muitos méritos. Suas ideias mirabolantes literalmente criaram a Marvel Comics como a conhecemos hoje. Suas criações são eternas e cativantes. Claro, sei muito bem que ele recebeu enormes e valiosíssimas contribuições de grandes nomes como Jack Kirby em sua época de ouro e que a Marvel não seria a Marvel sem esse conjunto de mentes brilhantes trabalhando. Mas não há como negar o valor de Stan Lee como mola propulsora e fábrica de ideiais super-heroísticas.
Dito isso, Stan Lee nunca foi um grande roteirista. Calma, não tenham ataques cardíacos e acessos de fúria. É uma verdade bastante clara quando lemos uma boa quantidade de obras escritas por ele. Mesmo considerando o contexto de sua grande era – os anos 60 – suas histórias, muito em linhas gerais, pecavam por excesso de exposição e um ritmo claudicante. Era um pouco melhor quando ele escrevia narrativas sem super-heróis, como no caso de Sgt. Fury e Seu Comando Selvagem, mas, trabalhando os queridos vigilantes mascarados, ele pecava por textos bem pueris.
Esse é o caso da história objeto da presente crítica, durante os primórdios dos incríveis X-Men, em 1964. Logo no número inaugural da revista solo do grupo de mutantes adolescentes, então formados por Cíclope, Garota Marvel, Fera, Homem de Gelo e Anjo, sob a batuta do Professor X, um inesquecível arqui-inimigo foi criado: Magneto. E ele volta em The X-Men #4 carregando a tira-colo um grupo formado pela antítese dos X-Men, a Irmandade dos Mutantes em sua primeira aparição. O nome original em inglês era “Irmandade dos Mutantes do Mal” (Brotherhood of the Evil Mutants) em tradução literal, para deixar mais claro ainda o óbvio ululante.
Assim, vemos a primeira aparição de Groxo, Mestre Mental e, claro, Feiticeira Escarlate e Mercúrio. E, talvez sabendo da importância de suas criações, Stan Lee, em parceria com Jack Kirby, que também ajudou no roteiro, além de ser responsável pelos desenhos, dá especial destaque à Feiticeira e a Mercúrio em detrimento a Groxo e Mestre Mental. Afinal, os dois são os únicos que ganham nomes (Wanda e Pietro) e dimensão tanto ao mostrar um pouco do resgate da Feiticeira por Magneto quando ela quase foi morta por habitantes de seu vilarejo depois que seu poder se manifestou quanto ao deixar evidente que tanto ela quanto Mercúrio têm dúvidas sobre as ações belicosas comandadas pelo Mestre do Magnetismo, o que é um prenúncio de uma mudança de lado, algo que se concretizaria em The Avengers #16, de 1965. Além disso, eles são irmãos, mas seu parentesco com Magneto não é revelado aqui e só surgiria algum tempo mais tarde, sob a forma de um retcon (e que sofreu outro retcon recentemente, aliás, que mudou tudo novamente).
Em termos de história, vemos um plano maligno de Magneto de enfrentamento direto da odiada Humanidade. Ele rouba um navio de guerra para tomar Santo Marco, país fictício que poderia ser uma Genosha nos dias de hoje. Usando também as ilusões criadas pelo Mestre Mental, ele logo hasteia sua bandeira com um enorme “M” no castelo local. O Professor X, que tivera um “encontro astral” com Magneto pouco antes, cria um plano (literalmente desenhado em uma folha de papel com um retângulo com um M dentro marcando o alvo e vários traços para indicar que os mutantes atacariam “por todos os lados”) para libertar o país.
Na batalha que se segue, temos a oportunidade de testemunhar os poderes dos novos vilões que não impressionam muito, nem criam grandes dificuldades para os X-Men. Mercúrio aparece como um borrão com sua supervelocidade, somente para ser derrotado pelo Anjo em quatro quadros e a Feiticeira Escarlate parece ter o grande poder de não fazer nada, já que, nesse número, ela apenas usa sua “magia” uma única vez. E é na luta em Santo Marco que os diálogos de Stan Lee focam, única e exclusivamente, em explicar o que Jack Kirby desenha, em evidente exercício de redundância.
Jack Kirby se esforça, mas, para mim, seu trabalho nesse começo dos X-Men nunca foi especialmente interessante. Por mais diferentes que os personagens sejam fisicamente, eles acabam sendo mesclados em uma grande amálgama um pouco sem forma. Falo, claro, dos X-Men em si, que vestem uniformes iguais nas cores amarela e azul (com o detalhe que o Homem de Gelo não vira gelo e sim neve e, mesmo nessa forma, suas botas ficam aparentes). Mas, sem dúvida alguma, há fluidez em seus traços e na maioria das simplistas sequências de ação, sem que, porém, sua arte evoque qualquer urgência na narrativa.
The X-Men #4 é um número importantíssimo na história dos mutantes favoritos da Marvel por mostrar a Irmandade dos Mutantes pela primeira vez e, claro, por ser o début da Feiticeira Escarlate e de Mercúrio. No entanto, em termos narrativos e até artísticos, a história é fraca e pouquíssimo memorável, ainda que tenha seus bons momentos aqui e ali.
The X-Men #4 (EUA, 1964)
Roteiro: Stan Lee
Arte: Jack Kirby
Arte-final: Paul Reinman
Letras: Art Simek
Editora (nos EUA): Marvel Comics (março de 1964)
Páginas: 24