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Crítica | The Resident – 4ª Temporada

Perdendo as qualidades e tornando-se comum.

por Leonardo Campos
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A quarta temporada de The Resident é a comprovação cabal do sucesso das fórmulas dos dramas médicos, histórias com personagens envolvidos em celeumas profissionais, concomitantes ao que ocorre em suas vidas pessoais. Inicialmente focada na pandemia da COVID-19, os episódios logo se dissociaram da temática para dar continuidade aos conflitos desenvolvidos no ano anterior, alguns com desdobramentos ainda pertinentes, outros repetitivos e comprovadores da sina deste tipo de programa, geralmente mais ousado em suas primeiras histórias, para logo depois, transformarem-se em variações da desgastada Grey’s Anatomy. Desta vez, os médicos do Chainstain Memorial, um hospital agora público, precisam lidar com as dificuldades do sistema, além do enfrentamento de pacientes surtados por problemas psicológicos graves, um deles, responsável por quase ceifar a vida de uma das personagens centrais do esquema narrativo. Há espaço também para a fúria de um tornado que devasta a região e, consequentemente, parte do prédio, bem como um incêndio testemunhado durante uma caminhada de dois residentes da instituição, agitação que nos tira brevemente da unidade hospitalar para injetar um pouco de ação externa.

Em linhas gerais, os resultados ainda conseguem ser mais interessantes que qualquer bom momento raro da série criada por Shonda Rhimes, mencionada anteriormente, no entanto, há a sensação de repetição cíclica e falta de criatividade, com romances estéreis, variações bizarras de masculinidade, perseguições e desafios de egos entre os profissionais que atuam na equipe que centraliza a narrativa. Os criadores Amy Holden Jones, Hayley Schore e Rishan Sethi, também coautores de alguns episódios, aparentemente conscientes dos interesses do grande público, continuam investindo em paixões e outras bobagens envolvendo alguns personagens e perdem a oportunidade de criar tramas mais substanciais. É um quarto ano bom, mas que nos deixa saudosos dos impactantes debates realizados nas empreitadas anteriores, em especial, nas duas primeiras temporadas. Com a maioria dos episódios dirigidos por Rob Corn, Kelli Williams e Chris Bessounian, The Resident começa com um casamento cheio de saudosismos. Os participantes homenageiam as vítimas da pandemia, lamentam as perdas na equipe e agradecem pelas vidas que conseguiram salvar. Após este preâmbulo, a devastação global que impactou todo o esquema de produção no cinema e na televisão vai para escanteio, pois os profissionais do hospital precisam vencer novos obstáculos, internos e externos.

Conrad Hawkins (Matt Czuchry) está mais contido nesta temporada. Focado no casamento com Nic e envolvido com a gravidez da esposa, o médico continua na saga para resolução das questões hospitalares, mas a série dá uma guinada em sua participação, mantendo mais destaque em sua esfera pessoal. Sem os arroubos de herói em suas missões nos atendimentos, um dos principais personagens deste drama surge mais maduro, seguro e ainda muito confiante no que faz, só que com um temperamento mais contido, importante para que a síndrome de Derek, de Grey’s Anatomy, não continuasse nos irritando. Devon Pravesh (Manish Dayal), agora desvinculado do relacionamento amoroso com uma jovem da realeza, tema retratado no ano anterior, segue a sua vida profissional com vigor, envolvido com a possibilidade de um novo romance em seu cotidiano. Tudo indica que na próxima temporada, ele se manterá firme namorando uma nova residente do hospital, figura inserida para substituir uma baixa importante do elenco, delineada nos parágrafos seguintes. Devoto ao que faz, o médico continua a sua caminhada para manter os investimentos de seu saudoso pai, um homem que fez de tudo para a boa educação do filho.

O casal Irving (Tasso Feldman) e Jessica (Jessica Miesel), médico e enfermeira, ganham menos destaque na temporada, com passagens breves sobre o relacionamento e algum diálogo para o desenvolvimento dos dilemas dos personagens centrais. Quem ainda mantém relevância é Nick (Emily Van Camp), enfermeira que não retorna para o quinto ano da série, mas fecha os seus arcos adequadamente nos episódios. Ela passa por uma experiência traumática depois de ser esfaqueada por um criminoso que adentra o hospital e perde o controle, aparentemente desestabilizado pelo uso de drogas ilícitas. Entre a vida e morte, tanto ela quanto o seu bebê ficam com a existência por um fio, mas conseguem ser salvos pela eficiente equipe médica do local. Durante a temporada, dividida entre manter-se um tempo distante das atividades profissionais e a importância de se manter ativa para não cair em depressão, a experiente enfermeira entrega bons desempenhos, mesmo que sua participação careça de conflitos menos óbvios para administrar. Um adendo para falar de maquiagem e efeitos: os envolvidos na produção não tinham um animatrônico melhor para ser recém-nascido da personagem não? É constrangedor ver que, no colo, as figuras ficcionais seguram um boneco nada convincente.

Dra. Mina Okafor (Shaunette Reneé Wilson), uma das melhores personagens da série, continua a sua trajetória coesa, distanciada de sentimentalismos e focada em ser uma das melhores médicas da equipe. Em seu último ano no drama, a eficiente cirurgiã cardíaca enfrenta a onda de ira de um dos colegas, responsável por denunciar a sua clínica clandestina, bem como os seus relacionamentos amorosos com um paciente e com um dos colegas de trabalho. Perseguida e imprensada numa investigação dura, ela corre o risco de perder o visto e até mesmo a sua licença, o que a faz aceitar o retorno para a Nigéria, local que segundo a sua mãe, cirurgião renomada, também do mesmo ramo, carece de profissionais como a jovem médica. Com partida programada para ser realizada satisfatoriamente, ao lado de AJ Austin (Malcolm-Jamal Warner), os planos se modificam quando a mãe do parceiro descobre um câncer e sofre consequências graves da doença, algo que o força a se manter nos Estados Unidos e deixar a sua amada seguir o seu destino. Estressado e receoso em atravessar o possível luto com as chances de morte de sua mãe, o cirurgião passa por momentos de bastante intensidade, descontados numa residente nova que abre espaço para discussão sobre assédio verbal e a importância do ensino sem posturas e técnicas consideradas ultrapassadas.

Dr. Bell (Bruce Greenwood) continua mantendo a sua posição benevolente em relação ao hospital e aos seus colegas. O lado sombrio, abandonado desde o segundo ano, dá espaço para o personagem manter a sua presença firme e interessante, mesmo que tenha tido menos tempo em cena, se compararmos com os anos anteriores. O desenvolvimento da relação com o filho, jovem num relacionamento homoafetivo e com obstáculos para driblar no que concerne o interesse pela adoção de uma criança para compor a sua família é um dos melhores elementos que compõem a temporada. Quem continua irritante é o candidato ao posto de antagonista da história, Dr. Barret Cain (Morris Chestnut), figura do quadro de personagens principais que passou por perrengues depois de um atropelamento que o obrigou a baixar um pouco a guarda, algo que, no entanto, não impede de fazê-lo centralizar os momentos de prepotência quando a vontade de retornar aos centros de operação o colocam como alguém muito convencido. Ele passa um bom período em aprimoramento na fisioterapia, trechos que minimizam a sua vilania e nos permitem ver poucas instâncias de bondade, especialmente quando há o interesse amoroso numa paciente que passa pela mesma situação de reabilitação, beirando a morte num determinado momento de tensão.

No que tange ao desenvolvimento da construção audiovisual dos episódios, a quarta temporada de The Resident continua mantendo o seu formato satisfatório. Não há uma estética primorosa, afinal, os cenários são os mesmos de sempre, mas podemos destacar alguns bons momentos da direção de fotografia de Bart Tau, responsável por captar os espaços concebidos pelo também assertivo design de produção assinado por Paul Peters, com suas paletas em verde e branco, com aspectos acinzentados em algumas passagens. Na condução musical, a dupla formada por Jason Derlatka e Jon Ehrlich estabelecem o tom de sempre, com um sentimentalismo que não atrapalha o caminhar das situações, tal como os trechos mais tensos, adequadamente acompanhados por uma textura básica, funcional para o que se expõe. Os efeitos visuais e especiais do episódio que contempla o devastador tornado não impressionam, mas compõe o necessário para uma história mais focada em seus dramas que necessariamente nos aspectos que envolvem a estética deste ano que contou com 14 episódios, quantidade que deveria ser mantida ou até mesmo diminuída nas próximas temporadas, haja vista a extensão de conflitos que acabam perdendo a força quando esticados sem justificativas plausíveis.

Ademais, na medicina, definimos que um paciente está assistólico quando há ausência ou baixíssima frequência elétrica, ritmos ou contrações cardíacas num determinado indivíduo, não captadas por um eletrocardiógrafo, situação que designa a morte clínica de alguém, uma vez que os sistemas elétricos e as células musculares do coração deixam de funcionar, ocasionando o interrompimento do fluxo sanguíneo, com reversão quando se há a possibilidade de realizar procedimentos corretos e ágeis. É disso que, dramaticamente, The Resident precisa para continuar. Com temas tão interessantes e ofertas genéricas de outras produções semelhantes no campo dos dramas médicos, os envolvidos na sala de roteiristas possuem casos hospitalares novos cotidianamente, basta observar as notícias que pululam os jornais diariamente. As crises sistêmicas na seara da saúde pública e privada, em escala mundial, ofertam conflitos mais viáveis e dinâmicos que a perda de tempo com paixões passageiras, dramas existenciais bobos e briguinhas de corredor que podem até ser material pedagógico para discussões sobre liderança, gestão e conflitos para mediação no desenvolvimento de trabalhos em equipe. Falta mais identidade no atual momento da série e é possível reversão. Basta ousar, o que não tem acontecido muito desde os momentos mais próximos do final da temporada anterior.

The Resident (idem, Estados Unidos/2020-2021).
Criação: Amy Holden Jones, Roshan Sethi, Hayley Schore
Direção: Phillip Noyce, Rob Corn, Bill D’Elia, James Roday, David Rodriguez, Thomas Carter, Bronwen Hughes, David Crabtree, Liz Allen
Roteiro: Amy Holden Jones, Roshan Sethi, Hayley Schore
Elenco: Manish Dayal, Emily VanCamp, Matt Czuchry Bruce Greenwood, Melina Kanakaredes, Tasso Feldman, Shaunette Reneé, Morris Chestnut, Rob Yang
Duração: 45 min (cada episódio – 14 episódios no total)

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