– Contém spoilers. Leiam, aqui, as nossas críticas dos outros episódios.
Chegamos, enfim, ao primeiro episódio de The Orville após a estreia de Star Trek: Discovery e, ao menos por enquanto, nossos temores de que uma série acabaria ofuscando a outra foram totalmente apagados. Claro que somente vimos os dois primeiros do seriado da CBS exibido internacionalmente pela Netflix, mas, com base no que foi visto, é seguro dizer que, enquanto Discovery funciona como uma espécie de amálgama entre a série original de Jornada nas Estrelas e os recentes filmes da linha do tempo Kelvin, a obra de Seth McFarlane mais se assemelha à franquia criada por Gene Roddenberry à época de concepção – algo que podemos enxergar com clareza nesse quarto episódio, If the Stars Should Appear.
Sabiamente, o roteiro de MacFarlane, que, por enquanto, escreveu todos os capítulos da série, esquiva das consequências da decisão tomada pelo júri em relação à operação de mudança de sexo do bebê, em About a Girl. Tudo o que vemos relacionado a esse acontecimento é um breve conflito entre Bortus e seu parceiro nos minutos iniciais do capítulo, de forma a manter a estrutura procedural da série, aos moldes da série original de Star Trek. Após essa breve introdução, a tripulação da Orville acaba encontrando uma gigantesca espaçonave à deriva por mais de dois mil anos. Ao embarcarem nela a fim de investigar, eles descobrem que todo o interior da nave conta com um ecossistema próprio, com árvores, campos, fazendas, cidades, onde vive uma sociedade teocrática, que sequer tem consciência de que vivem no interior desse colossal transporte espacial. Visto que a trajetória da nave vai de encontro com uma estrela, cabe ao capitão Ed Mercer e sua equipe convencer esse microcosmo de que o universo é muito maior do que eles imaginam.
A premissa de If the Stars Should Appear não poderia ser mais familiar a quem já assistiu os primórdios de Jornada nas Estrelas e MacFarlane respeita sua fonte de inspiração ao máximo, fazendo uso de uma solução não-violenta para a problemática central do episódio. Evidente que alguns momentos de conflito estão presentes, mas nada que leve à morte de algum personagem, por mais secundário que ele seja. Aliás, o showrunner utiliza isso para criar a tensão acerca dos tiros levados por Alara – sua sobrevivência não vem como nenhuma surpresa, mas sempre há aquele temor de que a personagem iria encontrar seu fim ou sofrer algum ferimento debilitante – a nossa preocupação, claro, é fruto da boa construção de personagens apresentada até então, ainda que alguns mereçam mais destaque, o que provavelmente ocorrerá no futuro.
O showrunner/ roteirista, no entanto, desliza no seu texto nos minutos finais, resolvendo tudo de maneira simplificada, sem dar tempo para posteriores embates entre eles e o lado mais radical dessa sociedade. A presença de Liam Neeson na gravação, como o falecido capitão da nave à deriva é mais que bem-vinda, mas faltou profundidade na maneira como esse microcosmo é desenvolvido – fator que poderia ser resolvido por alguns minutos adicionais. Portanto, por mais fascinante que seja a premissa do capítulo, ela permanece na superficialidade, pouco, de fato, acrescentando ao espectador.
Felizmente, o fator entretenimento não é abalado, já que, novamente, MacFarlane acerta na dosagem entre drama e humor, sabendo misturar ambos de maneira orgânica, permitindo que a identidade da série fale por si só, enquanto que o notável otimismo desse retrato futurista prevalece. Talvez seja por influência da série original de Jornada nas Estrelas, mas não pude deixar de sentir falta de um epílogo dentro da Orville, de repente retomando a discussão entre Bortus e seu parceiro, ou até trazendo de volta à tona a admiração (de repente atração) sentida por Alara em relação ao capitão. Ainda que não tenha impactado muito a narrativa, a ausência de um trecho assim passa a impressão de que o episódio foi encerrado às pressas.
Mesmo com tais deslizes, não há como não se deixar levar pela narrativa de The Orville, que prova ser uma relevante produção inspirada em Star Trek. Os pontos negativos de If the Stars Should Appear são evidentes, mas os positivos falam muito mais alto, mantendo nossa imersão intacta, enquanto aproveitamos esse bem-vindo olhar positivo sobre o futuro.
The Orville – 1X04: If the Stars Should Appear — EUA, 28 de setembro de 2017
Showrunner: Seth MacFarlane
Direção: James L. Conway
Roteiro: Seth MacFarlane
Elenco: Seth MacFarlane, Adrianne Palicki, Penny Johnson Jerald, Scott Grimes, Peter Macon, Halston Sage, J. Lee, Mark Jackson, Jeffrey Tambor, Holland Taylor, Chad L. Coleman, Liam Neeson
Duração: 44 min.