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Crítica | The Office (US) – 8ª Temporada

Entendendo as falhas e fragilidades para expor as qualidades antes não vistas.

por Davi Lima
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The Office


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No episódio The Incentive, o personagem Robert California (James Spader) diz uma frase sobre o personagem Andy (Ed Helms): “Há algo nos azarões que inspira a trivialidade”. Com essa caracterização de duplo sentido, como comumente o CEO da Sabre gosta de se expressar, The Office justifica a escolha do chefe do escritório, o que não significa a substituição equivalente de Michael Scott (Steve Carell). Muito pelo contrário. O cargo de Andy não indica  um novo host do programa, e por isso, essa penúltima temporada da série se coloca num caos divertido para descobrir qual a sua nova linguagem cômica; como o show vai se estruturar sem um apresentador. Por isso, entre um chefão Robert que falsifica a sua interação com a câmera e o chefe Andy que não consegue emplacar o que planeja dentro do show, Jim (John Krasinski) e Dwight (Rainn Wilson) dão a moral que sustenta mais um ano da série.

Estruturando as questões mais organizadas em meio à  inércia da série em tentar estabilizar um estilo próprio sem Michael Scott, The Office foca nos tijolos ordinários do escritório para rechear a temporada com menos subtramas e mais tramas paralelas. Com a ajuda de Jim, esse plano do showrunner Greg Daniels fica ainda mais evidente, como nos episódios em que alguns personagens estão na Flórida e Jim tem pelo menos três episódios sequenciais que dão mais atenção a Stanley e seu modo de vida, fora a sua nova “piada de bunda” ser repetida além de um episódio para recapitular o personagem mais “alegre”, que Jim também tenta aproveitar como público de suas piadas com Dwight. Outro caso é o de Kelly Kapoor (Mindy Kaling), em quem Jim e Pam (Jenna Fischer) encontram mais uma peça cômica para a interação absurda com Ryan, mediante o namoro de Kelly com um pediatra indiano. Além desses dois exemplos, há outros que vão cimentando os personagens da temporada, como Oscar (Oscar Nunez), Darryl (Craig Robinson) e Kevin (Brian Baumgartner), que ganham mais ativos com comentários de subtexto e destaques nas piadas iniciais do episódio. 

Essa aparente mudança em dar maior participação aos empregados do escritório não é em si uma mudança, mas um processo natural que se coloca diante da ausência de um apresentador do programa, como era Michael Scott, chamando atenção para si e assim criar a narrativa dos outros personagens. A escolha de Andy, mediante a frase de Robert California, serve a esse propósito. Se o chefe é trivial como os empregados, ordinário, e talvez ainda melhor alvo para caçoar – mudando a dinâmica de chefe e empregados na série – cria-se uma média. Isso, por sinal, contribui para James Spader brilhar como ator, porque aproveita o espaço da ausência de Steve Carell para criar um personagem meio Orson Welles no documentário F for Fake (1973) – uma caricatura imprevisível, um mago um pouco aterrorizante em não demonstrar o que é realmente falso e verdadeiro para intencionalmente provocar ambiguidade dentro de The Office.

O melhor exemplo disso, e talvez um dos melhores episódios da temporada, acontece em Mrs. Califórnia, quando o enredo aborda a esposa de Robert querendo um emprego na Dunder Mifflin, quando o seu esposo não quer aprovar. A força da narrativa dirigida por Charlie Grandy e escrita por Dan Greaney – novato no roteiro na série – concebe perfeitamente o  personagem de Spader e especialmente a sua função para com chefe. O nervosismo que o espectador pode sentir no alto grau de dilema entre aceitar a senhora Califórnia como empregada para satisfazer Robert e Andy saber anteriormente que não deve empregá-la, porque Robert não quer sua esposa trabalhando, define a dubiedade indescritível e constrangedora que Spader constrói para seu personagem. É um caos vestido de paletó sem gravata, que mede as palavras para confundir uma possível lógica do seu discurso incompreensível. Ele, junto com Andy, representa bem um assumir da falibilidade pela série de não ter Michael Scott como chefe e não conseguir propor a  linguagem que desenvolveu há 7 anos.

Por isso, o arco de Andy, do primeiro ao último, é um ato falho. Fala sobre a impotência – até em termos sexuais – e indica  não ser e nem querer ser o substituto de Michael Scott, mesmo que as dinâmicas de chefe de escritório sejam bem parecidas. Ed Helms, diferente de Carell, assume um tom mais realista para interpretar um chefe, pensando realmente em ideias executivas para melhorar rendimento dos empregados e se provar constantemente como um personagem relevante. Mas sua história na temporada é ele nunca conseguir isso, ele apenas é reconhecido pelos empregados como um chefe, um bom chefe para ser caçoado e trabalharem como família, sem nunca o próprio Andy conseguir uma vingança ou uma piada planejada. Ele é a própria piada de The Office, sendo  trivial demais para ser levado a sério, especialmente em seu cargo. E isso funciona dando sempre voz ao escritório por Andy precisar de apoio ou dar ponte para personagens como Erin (Ellie Kemper).

Como uma criança em forma de adulto, Ellie já havia crescido como personagem ao lado de Michael, tornando-se até uma afilhada na ficção do chefe e da secretária. Com Andy sendo o desejo amoroso de Erin, Ellie acaba tendo mais espaço, incorporando o lado infantil de Scott e desenvolvendo o nonsense um pouco mais lógico envolvendo uma personagem inocente, caipira e conservadora, para não dizer apenas estranha. Ela se torna essencial, dessa forma, para preservar a fantasia em confronto com o realismo do escritório, como acontecia constantemente entre Michael e a estrutura de falso documentário realista de The Office. Nisso, o antigo host vai se distribuindo no escritório de alguma forma, especialmente com os protagonismos de praxe, e agora ainda mais importantes, de Jim e Dwight.

Se Andy e Robert são como novas engrenagens funcionais entre os resets e testes de uma sitcom, como Michael Schur, showrunner de Parks and Recreation e The Good Place, comenta sobre séries de comédia serem esses testes que nos fazem conhecer melhor os personagens; Jim e Dwight são a base da série nesse penúltimo ano de The Office. É uma escolha óbvia, mediante Jim ser nosso olhar de dentro da série, algo que Robert tenta emular por sua personalidade predatória, enquanto Dwight ser o nonsense que quer sempre mais, sempre quer ser o chefe e sempre quer dominar as situações para o bem dos empregados. Apesar disso parecer natural torná-los líderes da ação havia ali um desenvolvimento individual de cada personagem que os impedia de serem unidos  além do conflito entre o Jim realista e o Dwight caricatural. Desse jeito, vai se construindo do auge da briga entre os dois a união para o trabalho, tornando-os protagonistas.

O auge significativo, que tem a pretensão de causar mais risada como trama completa de um episódio nessa temporada, está presente em Garden Party, quando Jim escreve um livro sobre Garden Party e Dwight, chamado por Andy para ser o anfitrião dessa Garden Party na fazenda Schrute, compra o livro e faz exatamente o que está escrito como uma grande piada – mesmo sendo uma festa importante e dramática para Andy tentar conquistar os pais. Se nesse episódio o conflito entre Jim e Dwight ocupa a trama toda e ainda evidencia o ar mais dramático da falibilidade de Andy no início da temporada, em Turf War, Jim e Dwight trabalham juntos para manter a Dunder Mifflin aberta, depois do desastre que o imprevisível e irresponsável Robert California mostrou ser como CEO. Ou seja, o desenvolvimento de Jim e Dwight como protagonistas passa pela narrativa de exposições dos chefes. Andy, em sua ordinariedade, vai do dramático em potencial de resolução feliz ao reverso conto de fadas. Robert, em seu orgulho de achar o trabalho fácil, arruína a empresa, mas se mantém por cima, pelas suas estratégias ilógicas de convencimento, que são hipnóticas.

Ao fim, é uma temporada de sustentação pela falha de não conseguir ser como antes. Dwight tem suas tramas individuais, mas elas se tornam redundantes. Jim tem sua história com Pam problematizada por uma possível traição em preparação constrangedoramente clichê – ao ponto de a personagem estagiária servir APENAS para perguntar por Jim em qualquer momento – sem nenhum efeito ou consequência, servindo apenas para descobrir que John Krasinski não concordou com a trama do seu personagem trair Pam. Tudo isso sem falar da trama de Darryl, que divide alguns espectadores, especialmente no episódio Lotto, sobre o personagem pedir demissão para Andy; e o próprio romance do chefe com Erin, que sempre particulariza uma infantilidade deslocada, mesmo sendo nonsense. Os argumentos que indicam uma boa temporada são pincelados em meio às várias fragilidades que a nova composição de roteiristas e diretores vão tentando, após a saída de Michael Scott.

The Office prova que consegue viver sem o host que se tornou ícone de memes e a alma da série, mas para isso precisa assumir sua falha como justificativa de encontrar o acerto de um novo estilo, talvez sem solução, e sua falta de algo que apresente a série, criando noções de Jim e Dwight como protagonistas como uma compensação preciosa. A qualidade se mantém, os bons personagens vão se desenvolvendo pelo contexto consistente do escritório, mas a introdução de Nellie (Catherine Tate) como uma emulação de Michael Scott em versão britânica e feminina e a volta de David Wallace (Andy Buckley) para comprar a Sabre, após a série revisar a saída de Michael, dão um sentimento de reset cedo demais, antes de acabar a temporada, mesmo que resets sejam algo comum no programa. 

Sobra a graça de Dwight, a esperança junto com Jim como colunas constantes da sitcom, de que o revival com Angela (Angela Kinsey), que revela Dwight tanto pai quanto Jim, seja um progresso dos dois personagens, de alguma forma. Em sua 8ª temporada, o escritório documentado dá mais chance para o olhar de Dwight ser ainda mais importante, assim como dá par para o espectador sobre a situação da série de maneira direta com Oscar, em seu vlog gravado com webcam na última piada de abertura da temporada, dizendo: “Enfim, melhora.”.

The Office – 8ª Temporada (The Office, EUA, 2011 – 2012)
Criação: Greg Daniels, Ricky Gervais, Stephen Merchant.
Direção: Randall Einhorn, Jeffrey Blitz, David Rogers, Charles McDougall, B.J. Novak, Matt Sohn, Rainn Wilson, Troy Miller, John Krasinski, Charlie Grandy, Ed Helms, David Rogers, Brian Baumgartner, Brent Forrester, Claire Scanlon, Daniel Chun.
Roteiro: B.J. Novak, Mindy Kaling, Paul Lieberstein, Justin Spitzer, Aaron Shure, Warren Lieberstein, Halsted Sullivan, Charlie Grandy, Daniel Chun, Steve Hely, Robert Padnick, Amelie Gillette, Carrie Kemper, Allison Silverman, Dan Greaney, Owen Ellickson, Steve Hely.
Elenco: Rainn Wilson, John Krasinski, Jenna Fischer, Mindy Kaling, Leslie David Baker, Brian Baumgartner, Angela Kinsey, Kate Flannery, Phillys Smith, Creed Bratton, Oscar Nuñez, B.J. Novak, Craig Robinson, Paul Lieberstein, Melora Hardin, Rashida Jones, Ed Helms, Hugh Dane, Zach Woods, Andy Buckley, Ellie Kemper, James Spader, Catherine Tate, Taylar Hollomon, David Koechner, Jerry Minor, Michael Schur, Hidetoshi Imura, Julie Dove, Ameenah Kaplan, Mark Proksch, Jack Coleman, Josh Groban, Dee Wallace, Stephen Collins, Sendhil Ramamurthy, Lindsey Broad, Maura Tierney, Eleanor Seigler, Georgia Engel, Brad Morris, Chris Bauer, Robert R. Shafer
Duração: 23 minutos (em média) cada episódio.

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