Há spoilers! Confira as críticas para os outros episódios da série aqui.
Sun Tzu ficaria muito orgulhoso de Richard Price pela forma como A Arte da Guerra foi aplicada a um sistema prisional viciado e a um sistema jurídico marcado por acordos de bastidores e cercamento bastante arbitrário da Lei. Estejamos falando de um verdadeiro culpado ou não, é evidente que a discussão sobre “Justiça” e “Política”, em suas formas menos óbvias, são duas das coisas mais fortemente exploradas no roteiro desta Parte 4 de The Night Of.
Pergunta número um: o que de fato aconteceu naquele dia? Pela primeira vez desde o insano The Beach, tivemos um pequeno vislumbre, sob um outro ponto de vista, da fatídica noite. A rigor, os planos diagonais, capturados um pouco fora de foco e quase como um exercício psicológico de Naz, que sob pressão, rememora rapidamente aqueles eventos, não nos dizem nada verdadeiramente relevante, mas colocam lenha na fogueira das especulações. A respiração ofegante de alguém subindo a escada seria de Andrea ou outra pessoa? Se foi de Andrea, onde está o sangue no chão, próximo à escada? Nós perdemos alguma coisa ou estamos falando de um assassino extremamente cuidadoso? Foi nesse momento que o sangue foi parar próximo ao olho do cervo, na parede?
Existe, claro, a possibilidade de ser outra pessoa ou o próprio Naz — o primeiro impulso que temos é de atribuir a cena à ida dele da cozinha até o quarto, mas quando sobe, após acordar, ele não está ofegante e o efeito das drogas já havia passado… — e isso é bom, porque mantém ativa a sensação de suspeita de todos e dá a possibilidade dos roteiros futuros investirem nessa ideia de “não confio em ninguém“.
Pergunta número dois: Freddy (uma interpretação cada vez mais espantosa de Michael K. Williams) quer apenas o “cérebro” de Naz? Seria inocente demais acreditar naquela conversa do “Chefão”, mas o que Naz pode fazer por Freddy que este já não tenha quem o faça? Essa pergunta é importante porque coloca em perspectiva a importância do protagonista e a forma como ele deverá se comportar na prisão a partir de agora, que está protegido.
Um ponto “menor” no episódio foi a ideia de fazer do ‘companheiro de prisão’ de Naz um tipo de portador de A Arte da Guerra, reconhecendo o terreno, usando de subterfúgios e atacando em um momento de fraqueza, surpreendendo o inimigo. Não que ESTAS ações sejam o ponto “menor”. A ideia de adaptação do conceito do manual de guerra é louvável em todos os aspectos nesse episódio. O que se coloca de maneira pouco convincente é o fato de ser guiada por um personagem novo, que se aproxima de Naz e faz dele um exemplo de vingança pessoal, um bode expiatório conveniente. Isto não é despropositado, porque o bloco teve o seu contexto bem montado, mas foi importância demais para um personagem novo com uma ação narrativa de peso como esta.
A diferença acertada de ritmo impresso pela montagem torna The Art of War um episódio de acertos e consequências para diferentes lados da moeda, seja na esfera pessoal, na esfera ligada ao caso do assassinato ou em ambas as esferas. A segunda parte é mais expansiva, com cenas fora da cela conjunta e as sempre interessantes sequências de tentativa de acordo, no tribunal. A qualidade do elenco ajuda a tornar tudo ainda mais intenso e aparecem coisas que nos fazem questionar posturas como a conversa entre o Detetive Box e a Promotora; o acerto mudo entre Stone e a nova advogada de Naz; e a misteriosa conversa do padrasto de Andrea no cemitério.
Um pouco menos sombrio em cor (pelas cenas no tribunal), mais ágil na montagem, mais dinâmico no figurino e aprofundando-se ainda mais nas consequências de uma acusação para todos os que estão ligados ao acusado — notadamente em um caso grave e de conhecimento público — The Art of War mantém o nível dos episódios anteriores e segue nos fazendo queimar neurônios para ler [segundas] intenções e encontrar vilões no meio de tantos suspeitos.
The Night Of 1X04: The Art of War (EUA, 31 de Julho de 2016)
Direção: James Marsh
Roteiro: Richard Price
Elenco: Riz Ahmed, John Turturro, Bill Camp, Peyman Moaadi, Poorna Jagannathan, Jeannie Berlin, Sofia Black-D’Elia, Paul Sparks, Michael Kenneth Williams, Chandra Kapoor
Duração: 60 min.