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Crítica | The Good Fight – 4ª Temporada

por Leonardo Campos
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O quarto ano da deslumbrante e audaciosa The Good Fight veio para comprovar que a série ainda possui muito fôlego dramático para continuar a sua empreitada, inclusive superando a relação com The Good Wife. Ao investir numa conexão com a política contemporânea e ampliar a qualidade estética da produção, os realizadores entregam um spin-off que consegue ampliar os horizontes de seu ponto de partida, indo além do regaste de tramas inacabadas do programa antecessor. Assim, diferente do que acontece com muitos mergulhos dentro de universos finalizados, tendo em vista reciclar restos dramáticos para criar material novo, a série em questão apresenta a vivacidade de um produto inédito, tamanha a habilidade do elenco, da equipe técnica que integram direção de fotografia, design de produção, cenografia, figurinos, edição e efeitos visuais, design de som e trilha sonora, dentre outros, além dos diretores e da sala de roteiristas desta produção escandalosamente boa, estética e dramaticamente, em seus sete episódios.

O mundo, na quarta temporada, o mundo está em colapso. Em seu episódio de abertura, The Gang Deals With Alternate Reality, Diane Lockhart (Christine Baranski) acorda em um mundo absolutamente modificado. O movimento #metoo ainda não aconteceu, Harvey Weinstein ainda não saiu do posto de magnata do cinema, homem que ainda seria acusado de assediar e devastar a carreira de diversas atrizes que não quiseram fazer com ele o “teste do sofá”, além do bálsamo que faz a advogada acreditar que está sob os efeitos de drogas, haja vista a sua jornada na temporada anterior: Hilary Clinton é a presidente dos Estados Unidos. Trump? Não conseguiu alcançar o seu desejado posto de poder para a promoção da destruição da democracia. Acompanhamos a trajetória desse dia incomum, moldado numa atmosfera quase surrealista, com fascínio e apreensão, afinal, não podia ser tudo verdade? Mas não é. Vida que segue! O episódio de abertura, como ao som de trombetas, anuncia o retorno dos personagens em suas jornadas sem espaço para diálogos ruins e conflitos dramáticos estéreis.

Trump e sua administração tosca ainda estão no centro da crítica em The Good Fight, afinal, qualquer debate sobre questões raciais e de gênero passa pela representação do influente político estadunidense que fornece péssimos exemplos de como gerenciar seres humanos em sua debandada pelo poder ao ocupar a presidência de uma nação já problemática no que tange ao belicismo e manutenção de seu espaço privilegiado de dominação econômica. O que temos aqui é a abordagem de sua figura por meio de palavras-chave, sem a busca pessoal e panfletária que transformou a terceira temporada num ano ainda muito bom, mas agressivamente dispersivo demais. O que move o novo ano da série, reduzido por causa da pandemia que se alastrou por 2020 e mudou todo calendário da programação cultural mundial, é a hostilidade da Suprema Corte dos Estados Unidos, bem como a violência racial e de gênero, institucionalizadas.

Juízes corrompidos e hackeados, advogados acossados por ameaças de morte, brigas judiciais entre poderosos, dramas humanos envolvendo as relações microfísicas dos personagens e a batalha pelo processo de reerguimento do escritório de advocacia que nos anos anteriores, passou por graves momentos de exposição negativa. Há, ainda, os embates entre funcionários que se consideram menos privilegiados por outros nas dinâmicas de trabalho, gerenciadas por Diane Lockhart, Liz Lawrence (Audra McDonald) e Adrian Boseman (Delroy Lindo). Liz continua aliada aos interesses de Diane, mas um pouco mais cautelosa que antes. Há também algumas promessas no campo sentimental, um toque de leveza para seu estressante cotidiano de trabalho. Adrian continua o caso com a juíza que não sabemos ser confiável ou não. Lucca Quinn (Cush Jumbo), agora amiga de uma cliente rica, começa a valorizar um pouco mais os prazeres da vida material, sem a dedicação exclusiva aos casos judiciais do escritório.

Marissa Gold (Sarah Steele), ainda bastante importante para o desenvolvimento da série, reforça os melhores momentos do elenco, tornando-se cada vez mais central para a história, ao lado de Jay Dispersia (Nyambi Nyambi), ambos no campo da investigação, funcionários basilares para a composição das estratégias de defesa regidas pelo time de advogados do escritório de advocacia mais incendiário da televisão contemporânea. Para completar, temos Julius Cain (Michael Boat), agora juiz estabelecido, precisa se decidir entre os ideais utópicos de justiça ou responder aos anseios dos caminhos obscuros da corrupção que puxam, por meio de ameaças tentaculares, a sua carreira e vida para as profundezas. Agora, com o arco de Maia Rindell (Rosie Leslie) devidamente amarrado, a série investe em outras dinâmicas, inclusive na chegada de participações especiais para amplias os horizontes narrativos. Hugh Dancy, John Larroquette e Raul Esparza são alguns dos convidados que somam ao time principal e elevam o programa.

Ademais, a mensagem que parece expelir de todos os poros da quarta temporada de The Good Fight é a crença na batalha constante. Se nos entregarmos, a altíssima onda fascista que tem ocupado posições de poder importantes continuará o seu projeto de destruição em massa, afinal, a coisa chegou a tal ponto que há quem arrisque a vida para comprovar que a “terra é plana”. Tolos, mas que precisam de nossa compreensão e acolhimento, afinal, não sabem o que dizem e são guiados por uma ideologia cega e burra. Além do episódio de abertura, o destaque da temporada vai para a peça escrita por um funcionário do escritório que se sentiu alijado e ao sair da empresa, construiu um texto que transforma todos os personagens em arquétipos bizarros, mas não menos divertidos e altamente satíricos, num jogo intertextual inteligente da equipe de roteiristas do programa criado por Michelle King, Robert King e Phil Alden Robinson.

Os escritórios continuam sustentados pela mesma equipe técnica, responsável por mesclar luxo e praticidade na dinâmica dos compartimentos que regem cada sala, da reunião aos espaços individuais de cada sócio. A iluminação e a movimentação da câmera em The Good Fight não deixam a série se tornar dispersa em momento algum. Há um cuidado extremo dos realizadores em manter a qualidade estética da produção, nos adereços da direção de arte, no deslocamento pelos corredores pela cenografia e nos figurinos que tornam os personagens revestidos de cores e peças que alegorizam as suas necessidades dramáticas. A trilha sonora evita ser intrusiva e o design de som trabalha nos pormenores. É, como já mencionado, um programa menos conhecido do que deveria, mas suficientemente grandioso para quem o acompanha e já teve como garantia, a continuidade das histórias numa quina temporada, agendada para 2021. A agenda crítica continua, os embates políticos também. Agora é aguardar para conferir os novos rumos, afinal, já foram confirmadas as saídas de Lucca Quinn e Adrian Boseman. É muito provável que os realizadores consigam a manutenção da qualidade. Basta esperar.

The Good Fight – 4ª Temporada – EUA, 2020
Showrunners:  Michelle King, Robert King, Phil Alden Robinson.
Direção: Jim Mckay, Broke Kennedy, Frederick E. O. Toye, Tess Malone, Robert King
Roteiro: William M. Finklestein, Joey Hartstone, Michelle King, Robert King, Laura Marks, Davita Scarlett
Elenco: Christine Baranski, Delroy Lindo, Sarah Steele, Audra McDonald, Nyambi Nyambi, Cush Jumbo, Gary Cole, Michael Boatman, Hugh Dancy, John Larroquette, Raul Esparza
Duração:  50 min (cada episódio – 7 episódios no total)

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