- Há spoilers. Leiam, aqui, as críticas dos demais episódios da série.
Sentimentos antagônicos invadiram-me ao final de 3 X 1. De um lado, o grande plano do Dr. Campbell é absolutamente desapontador, mas, de outro, o episódio é um muitíssimo bem feito “arrumador de tabuleiro” que não só oficialmente introduz um novo jogador que potencialmente amplia a narrativa da série, como coloca as Irmãs Cuckoo/Stepford/Frost no centro da ação.
Como nesse começo de ano, meu copo está meio cheio, abordarei primeiro os lados positivos do capítulo, algo que já começa com sua estrutura. Depois do já de praxe breve flashback de abertura, desta vez focando em Blink sendo covardemente atacada pelos Purificadores em sua primeira aparição na série, partimos logo para algum momento após o clímax mortal do episódio anterior, com Esme libertando suas irmãs e deixando uma dúzia de corpos de agentes do Sentinel Services espalhados pelo chão.
A escolha de não iniciar 3 X 1 diretamente do massacre foi precisa e bem-vinda, permitindo, de um lado, a efetiva introdução do Clube do Inferno – ou, pelo menos, de sua nova e ainda “em construção” encarnação -, e, de outro, um belo enterro duplo, do agente Weeks, por Jace Turner e de Dreamer, por Eclipse, em uma montagem paralela que estabelece de cara o tom pesaroso que permeia a projeção e, claro, as mensagens belicosas dos monólogos. Com essa bem executada elipse, a ação do novo episódio em si pode ser imediatamente iniciada, sem que ele pareça um epílogo do que veio antes.
A interação das irmãs Frost (repararam o diamante que faz referência à mutação secundária de Emma?) com o misterioso líder do Clube do Inferno já coloca nas mesas as cartas do que pode ser a estrutura de uma futura segunda temporada (confesso estar temeroso por ela depois da aquisição de parte da Fox pela Disney), com mutantes se digladiando como classicamente vemos nos quadrinhos. Da mesma forma, o plano das três para colocar os mutantes da resistência ao lado da “causa” do Clube, que obviamente não objetiva apenas eliminar o programa Hound da Trask Industries, é colocado em funcionamento de forma muito eficiente, tanto visual quanto narrativamente.
Ver e ouvir os saltos altos das gêmeas em sua entrada triunfal no QG dos mutantes e, depois, observá-las encarnando suas contrapartidas dos quadrinhos, com frases sendo iniciadas por uma e finalizadas por outra ou, para maior efeito, algumas delas sendo ditas simultaneamente pelas três, é um grande mérito do episódio, que não se furta de usar esses artifícios para subir o sarrafo narrativo e quebrar a resistência em pequenos grupos dissonantes. Afinal, não demora e vemos Blink e Polaris, mais beligerantes, tomarem posições antagônicas às de Eclipse e Pássaro Trovejante, mais pacifistas ou, no mínimo, querendo manter viva a tocha que lhes foi passada pelos X-Men, novamente citados.
Aliás, falando em tocha, a aproximação de Esme (ou seria uma das outras?) a Polaris é a primeira vez que ouvimos menção indireta a seu pai, aqui como “rei do Clube do Inferno”. Para quem leu os quadrinhos, a dubiedade da frase foi proposital, pois faz remissão tanto a Magneto, pai de Polaris nas HQs quanto a Sebastian Shaw, o mais conhecido líder do Clube do Inferno.
Nesse núcleo da resistência, porém, um dos problemas do roteiro de Melinda Hsu Taylor começa a aparecer, com a decisão de Reed e Caitlin Strucker em fugir para o México, como forma de proteger seus filhos. Ok, entendo perfeitamente o impulso que os leva a ressuscitar o plano original de fuga, mas sinceramente não creio que faça algum sentido aqui, já que eles continuarão fugitivos, agora em um país estrangeiro e tendo a tira-colo dois poderosíssimos mutantes que – eles certamente sabem – serão caçados eternamente. Afastar-se da proteção, ainda que falha, da Resistência, parece-me, única e exclusivamente, uma conveniência débil de roteiro, que precisa separá-los de forma a tornar o plano secreto das irmãs mais exequível, ainda que, mais uma vez, dependente de um universo de coincidências de revirar os olhos para não dar errado. Mas pelo menos a reunião de Lauren com Wes não foi tão melosa quanto poderia ter sido e os poderes dele de miragem foram bem utilizados no ataque da “arma secreta” de Campbell.
O que me leva, claro, ao ponto mais baixo da história…
Quer dizer então que o grande ás na manga do maquiavélico e deformado Dr. Campbell é fundir poderes mutantes como os Strucker são capazes de fazer? Em outras palavras, ele cria irmãos siameses forçados em que cada parte, aparentemente, tem poderes razoavelmente inúteis, mas que, juntas, são capazes de feitos aleatórios como os que vemos no capítulo, em que a dupla da vez, presa por uma manopla que parece ter sido retirada de um episódio de Power Rangers, atira rajadas de “sei-lá-o-que” que poderiam ser emuladas com menos custos por, não sei, um tanque de guerra ou talvez até alguns soldados manipulando bazucas ou lança-mísseis.
Matt Nix, infelizmente, com uma cajadada só, consegue banalizar os poderes combinados do Fenris e criar uma ameaça boba, quase genérica, que, ainda por cima, exige que Jace Turner, mesmo tendo sofrido o que sofreu, embarque sem arrependimentos em uma jornada em que basicamente o torna um nazista. E a cereja nesse bolo um tanto quanto solado é a ineficiência dos mutantes que vêm aos resgate dos Strucker e de Wes: ninguém usa seus poderes e olha que estamos falando de um grupo composto de um cara que solta raios laser das mãos, uma moça que manipula metal, agora em sua versão 2.0 mega-power grávida, um fulano que é super forte e a prova de balas e, finalmente, uma jovem que poderia ter simplesmente teletransportado todos para fora em um piscar de olhos (com trocadilho). Chegou a doer o cérebro a incompetência demonstrada aqui diante de uma ameaça que, convenhamos, não assusta ninguém. E tudo isso, claro, para que a aliança mutante possa enfim ser encetada, com a Resistência perdendo toda sua liberdade e personalidade.
Ou seja, apesar de The Gifted continuar sendo uma boa série, mas aquele seu charme inicial de um grupo de mutantes fugindo das autoridades já se dissipou e a temporada talvez tenha entrado muito rapidamente em uma linha bem mais comum de quadrinhos menos inspiradora. Não que a adição das irmãs Frost tenha sido ruim, mas elas praticamente substituíram a liberdade narrativa que antes existia, para que tudo se encaixe em um plano maior. É uma arapuca daquelas quase inevitáveis, eu sei, mas espero que Nix saiba usá-la em prol da história maior e não de um clímax duplo efêmero, criado apenas para fins de espetáculo.
3 X 1, portanto, mesmo depois de escrever todos esses comentários, deixou-me dividido entre uma bem-vinda e bem-feita expansão da mitologia e uma mal executada ação que martela conveniências demais em tempo de menos apenas para armar a tenda para o show de encerramento. The Gifted prometia mais e ainda pode entregar algo fora da curva. Resta saber se Matt Nix saberá manipular corretamente as manipuladoras irmãs Frost.
- The Gifted voltará dia 15 de janeiro de 2018 para dois episódios transmitidos no mesmo dia e que marcarão o final de temporada.
The Gifted – 1X11: 3 X 1 (EUA, 1º de janeiro de 2018)
Criação e Showrunner: Matt Nix
Direção: David Straiton
Roteiro: Melinda Hsu Taylor
Elenco: Stephen Moyer, Amy Acker, Sean Teale, Jamie Chung, Coby Bell, Emma Dumont, Blair Redford, Natalie Alyn Lind, Percy Hynes White, Garret Dillahunt, Jermaine Rivers, Sharon Gless, Garret Dillahunt, Elena Satine, Jeff Daniel Phillips, Hayley Lovitt, Zach Roerig, Michelle Veintimilla, Danny Ramirez, Raymond J. Barry, Paul Cooper, Caitlin Mehner, Skyler Samuels
Duração: 45 min.