– Há spoilers. Leiam as críticas dos demais episódios de The Flash, aqui.
Pegando o passo no terceiro episódio da temporada, o The Flash dessa semana ilustra bem os pontos fortes que a série é capaz de oferecer. Novamente vemos que, quando está em sua melhor forma, a produção evoca menos o drama televisivo ou a adaptação cinematográfica do que o estilo e ritmo dos quadrinhos. Nosso elenco de meta-humanos consegue se dividir o suficiente entre subtramas bem equilibradas e que trazem desenvolvimentos interessantes mesmo se tomados isoladamente.
Aos poucos, Nora (Jessica Parker Kennedy) tem provado que o que poderia a início de conversa parecer uma ideia pouco proveitosa pode vir a ser uma ótima adição à mitologia da série. Achei muito bacana a cena em que finalmente temos a oportunidade de presenciar em primeira mão o tal Museu Flash. Narrativamente, mostrar tende a ser mais eficiente do que apenas citar. Nem que seja numa sequência curta reaproveitando descaradamente sets tão antigos quanto o programa em si, acompanhar a jovem Nora em sua visita à atração particularmente misteriosa de um vilão jamais capturado tem um gancho dramático muito mais interessante do que uma linha de diálogo expositivo jogada ao vento, à guisa de caracterização.
Aliás, de maneira geral, o uso abusivo de diálogos expositivos foi um dos pontos fracos que pesou especialmente mal nos dois primeiros episódios da temporada. Felizmente em The Death of Vibe temos uma narrativa mais leve e energética, que não precisa ficar estacionando a cada cinco minutos para repassar certos pontos e adiantar outros através de conversas pouco espontâneas. Toda a subtrama envolvendo a culpa de Nora é bem desenvolvida de forma orgânica, fazendo um uso moderado de cenas em que é trazido explicitamente através do diálogo. Novamente se apoiando em sua boa química com Barry (Grant Gustin), o contraponto da iniciante XS ao já relativamente veterano Flash continua a ser benéfico para ambos personagens. Em poucos episódios, me surpreendi com o quanto me vejo me importando mais com o arco da personagem e seu papel na trama do que ocorreu com os outros “velocistas mirins”, Kid Flash e Jesse Quick, após contar com muito mais tempo de tela.
A trama central do episódio enfoca os efeitos da distorção temporal causados pela chegada de Nora, em especial no que tange às ações precoces do supervilão Cicada (Chris Klein), que deveria ter surgido apenas algum tempo depois e o qual, segundo a viajante temporal, o Team Flash jamais conseguiu desmascarar ou capturar. A ideia de um “Jack, o Estripador” meta-humano é interessante, embora os enigmas de identidade e o lance do “vilão inatingível” já tenham sido usados à exaustão. Fico na esperança de que a produção seja capaz de diversificar bem o personagem em relação a figuras similares como Dr. Alquimia e o mais recente Pensador. Ao que parece, as coisas caminham bem nesse sentido: a motivação central do vilão já foi tornada óbvia, restando esclarecer seus poderes e dar andamento ao conflito. O gato-e-rato com o Pensador foi repleto de momentos interessantes, mas vamos dar uma arejada antes de repetir a ideia, que tal?
Falando em gato-e-rato com o Pensador, o episódio também é a ocasião para o Team Flash recrutar a ajuda de um personagem que provavelmente se encaixaria melhor no contexto da temporada passada. O divertidamente ridículo Sherloque Wells (Tom Cavanagh) é obviamente mais uma das criações do ator, cuja chegada aqui mostra o quanto a série se beneficia de sua presença para sustentar a dinâmica da equipe. Acho muito difícil que qualquer coisa que Cavanagh tenha a oferecer possa superar seu papel como mentor secretamente vilanesco na primeira temporada, em especial porque sua atuação nas sutilezas é mais interessante do que sua comédia de improviso. No entanto, esse humor realmente funciona e traz uma leveza e dinamicidade às interações do elenco, em especial na relação com o BFF trans-dimensional Cisco (Carlos Valdes).
E, convenhamos, foi um alívio ver que não ficamos presos com o terrível Herr Wells — um Sherlock Holmes faux French sem dúvida é preferível ao show de bizarrices do caricato nazista bipolar. No geral as interações da equipe com o novo recruta foram divertidas e repletas de momentos hilários. A simulação da morte dele com folhas de chá e um chapéu foi tão patética quanto divertida, e ainda por cima serviu de inspiração para o clímax da história. Aliás, o enredo consegue amarrar muito bem as necessidades do arco central da temporada com os acontecimentos do episódio.
Utilizar o detetive transdimensional como porta-voz do fato de que ele capturou Cicada em mais de trinta Terras, e em todas elas ele foi desmascarado como David Hersch é uma forma muito mais interessante de se inteirar das especificidades dessa versão do vilão do que a tradicional linha expositiva preguiçosa (“Pessoal, olhei aqui no nosso supercomputador vibro-dimensional e parece que em todas as realidades o cara era esse mesmo, sei lá!”). Estreando nos quadrinhos na fase de Geoff Johns, o supervilão Cicada em sua versão original dos quadrinhos é realmente Hersch. A trama trabalha de forma interessante esse twist a respeito de sua identidade,aproveitando-se do ensejo para trazer uma excelente cena de ação com a dupla Flash e XS, na apreensão do terrorista que, no entanto, não se transformou no supervilão nessa nova linha temporal.
A armadilha para Cisco também rende uma ótima segunda trama para o capítulo, construindo muito bem a tensão tanto na captura de Joe (Jesse L. Martin) na residência dos West quanto na sequência de ação final. Embora seja uma estratégia um tanto “barata”, a habilidade de Cicada é capaz de criar situações interessantes de perigo real para nosso time extenso de meta-humanos. O conflito de Vibro contra o vilão é bem armado: “vibrado” para um lugar indeterminado e com seus poderes anulados, é convincente o beco sem saída em que o herói repentinamente se encontra.
Com o nome do episódio depondo fortemente contra suas chances de vitória no combate, o desfecho consegue ser bastante empolgante e entregar tanto na frente dramática quanto na parte da ação. A profetizada morte de Cisco parecia tão improvável quanto qualquer outra envolvendo algum membro do elenco regular do arrowverse — mesmo que fosse bancada até o final do episódio, a maioria dos espectadores estariam apenas no aguardo para presenciar sua inevitável reversão. O enredo se usa habilmente desse fato para um blefe que, embora não seja totalmente imprevisível, é bem realizado e faz empolgar.
A revelação da técnica de pensamento em flashtime de Nora foi muito bem inserida, e a perspectiva de que ela tenha falhado mesmo assim nos faz torcer pela personagem e dá um fechamento bacana para a não-morte de Cisco. No geral, me surpreendi com o quanto uma premissa tão batida (morte fake de um dos membros do Team Flash + herói iniciante com dificuldades em conter a impulsividade) rendeu uma história tão divertida. A dúvida de Sherloque sobre a veracidade da versão de Nora sobre os fatos abre uma interessante dinâmica entre os dois estreantes no elenco, e me deixou interessado pelo que virá.
Na trama secundária, temos Ralph (Hartley Sawyer) e Caitlin (Danielle Panabaker) na perseguição à verdade sobre o pai da senhorita Snow. Aqui a coisa se mantém apenas dentro do aceitável, em especial ao mostrar um Dibny mais maduro em uma dinâmica interessante com Caitlin, outro personagem que careceu de um desenvolvimento maior por muito tempo. Infelizmente, como se trata de CW, as chances de tudo encaminhar para mais um romance redundante são altas. Em todo caso, estou curioso sobre as possíveis intersecções entre a subtrama de Caitlin e a perseguição ao Cicada.
The Death of Vibe consegue ser o melhor episódio da temporada até agora, equilibrando muito bem suas várias subtramas e mantendo o ritmo e tonalidade de narrativa quadrinhescos que tanto combinam com a série. Melhorando em praticamente todos os aspectos em relação aos episódios anteriores, finalmente vemos esboçar algo realmente interessante para o serial. Para ficar perfeito, só faltava fechar todo esse arco antes mesmo do crossover de dezembro!
The Flash – 5×03: The Death of Vibe — EUA, 23 de outubro de 2018
Direção: Andi Armaganian
Roteiro: Jonathan Butler, Gabriel Garza
Elenco: Grant Gustin, Candice Patton, Danielle Panabaker, Carlos Valdes, Hartley Sawyer, Danielle Nicolet, Tom Cavanagh, Jesse L. Martin, Jessica Parker Kennedy, Chris Klein, Susan Walters
Duração: 43 min.