Obs: Há spoilers. Leiam as críticas dos demais episódios de The Flash, aqui.
Back to Normal é um título errado para este episódio. Nenhuma das situações mostradas aqui, ou mesmo o contexto de perigo delas, com um Barry sem poderes, já tiveram precedentes na série. O que tivemos antes foi um “homem mais rápido do mundo que não era o mais rápido do mundo” [já contei para vocês a história do meu coelho de infância, o Sebastião, que dava de mil a zero no Barry Slug?] e claro, o melodrama e o vilão da semana; mas no conjunto da obra não estamos, de fato, voltando ao normal. Estamos rompendo a barreira da anormalidade.
Um dos recentes dissabores da DC-para-as-massas na TV tem sido a reafirmação de uma identidade teen nivelada por baixo, muito mais ingênua e clichê do que deveria, como é possível comprovar em Legends of Tomorrow, Arrow e, de forma menos grave — se comparada às outras duas –, The Flash. O incômodo disso tudo? O fato de séries para um público teen não necessariamente precisarem ser estúpidas e patologicamente didáticas ou ensandecidamente sem lógica como vemos nessa tríade (e posso estar sendo injusto com The Flash, que ainda possui salvação e não é exatamente um martírio de se ver, mas está no caminho). Em Back to Normal, o espectador prova um pouco desses modelos tortuosos de um roteiro que fala demais, mas não chega a lugar nenhum. E talvez por isso mesmo, aposta em fan service de pouco ou nenhum sentido (perceberam as pinceladas de Ponto de Ignição?), chegando a conclusões tenebrosas.
Com Barry Barrichello sem poderes, qual foi a ideia genial dos autores para nos fazer lembrar de que, mesmo nessa situação, ele ainda tem a “alma de um velocista”? Ora, fazê-lo vestir o uniforme sem necessidade e com um novo adereço inventado de última hora apenas… porque sim, claro! Se a ideia era voltar ao normal, não seria mais coerente para os roteiristas apostarem unicamente no uso do Star Labs para chegar a alguma coisa? Afinal, temos ali um garoto com o poder de vibrar entre dimensões (convenientemente escanteado, perceberam?) e um QI altíssimo; temos a mente do Barry, esta sim, muito rápida; temos o gênio Wells; e temos Jesse, que é inteligentíssima. E temos tecnologia de ponta à mão. Vamos parar e pensar um pouco, de forma fria e ponderada: como é possível aceitar o andamento narrativo desse episódio, considerando todos esses fatores?
Alguns podem trazer à tona o inútil vilão da semana, Griffin Grey, um vilão bem mais interessante nos quadrinhos. Confesso que me peguei gostando do diálogo quase filosófico dele com Wells, no cativeiro, mas foi um lampejo apenas. Com Caitlin sequestrada e Barry Sloth sem poderes, qual a necessidade de um vilão da semana? De verdade, procurem achar uma justificativa plausível e narrativamente coerente para a existência de Griffin Grey a 4 episódios da temporada terminar. É irresponsável por parte da produção permitir que a série caminhe para um novelo de pequenas crônicas, talvez com a intenção de justificar um filler ruim. E pior: amontoam coisas e inventam “velhas novidades” ao invés de utilizarem o tempo de sobra (já reclamei demais sobre temporadas de 23 episódios, mas não dá para não chover no molhado… de novo!) para juntar algumas pontas e fechar mini-arcos anteriormente abertos.
Danielle Panabaker na Terra-2 chama a atenção como Nevasca, mas apenas por um momento. E nisso eu devo culpar mais a direção de John F. Showalter do que a capacidade dramática da atriz, e explico por quê. Tentem se lembrar da primeira sequência no covil de Zoom neste episódio. Pontos positivos: fotografia com filtro sépia muito bem aplicada, ótima exploração da câmera pelo set e excelente apresentação de Nevasca, com seu jeito sassy de ser. Pontos negativos: a chatice das batidas do “homem da máscara de ferro” e o erro crasso em não lhe dar mais importância, mudar a figura que temos dele (o verdadeiro Jay, certo? Ou não?). Agora pensem em como o mesmo covil foi sendo mostrado ao longo do episódio e como Nevasca foi mudando de uma personagem provocativa e intrigante para uma mulher de quase-murmúrios e insistência em um estereótipo forçado, cheio de maneirismos. Não há como negar que estas são orientações da direção que, devo admitir, mantém o bom uso do espaço cênico no covil de Zoom (ponto que também se repete na delegacia, na cena notura entre Wally e Joe, uma das sequências mais bem dirigidas do episódio) mas destrói completamente a exploração dos personagens após o primeiro bloco.
De repente, temos um psicopata com empatia, capaz de sentir amor e, ao que parece, ciúmes! Vamos jogar fora toda a literatura de psiquiatria, psicologia e psicanálise e adotar o “estilo Zoom” de tratar casos de distúrbios mentais, que tal? Logo agora, que ele estava se tornando um vilão realmente interessante, o roteiro traz essa bobagem para atrapalhar. Sem contar que as entradas e saídas dele no covil e aquele negócio de tirar a máscara e botar a máscara chega a ser enervante. Eu tenho a impressão de que a qualquer hora que ele vai tirar aquilo e vai aparecer o Papa-Léguas ou o Sonic ou o meu coelho Sebastião dizendo “e aê galerinha do whatsApp!“… Se é para fazer charminho cobrindo uma identidade que a gente já conhece, que seja feito com classe.
Por fim, alguns pontos para fechar este capítulo. Um: Wally ganhou um grama e meio de simpatia aqui, vocês não acham? Dois: Jesse Quick! Sério, isso? Mais um velocista? Que tal apresentar Wally primeiro a este novo mundo e depois, talvez, colocar mais uma velocista em cena? E três: VÃO REFAZER A GODDAMMIT EXPLOSÃO DO ACELERADOR DE PARTÍCULAS? Por favor, meu digam que o arco dessa segunda metade inteira da temporada não será resolvido com essa decisão sandia!
O que podemos tirar de bom deste episódio é a canção Israelites, de Desmond Dekker, que toca no início do episódio, quando Barry Turtle acorda em seu “regular day“. Tente ouvir e não dançar com essa música para acordar feliz.
The Flash 2X19: Back to Normal (EUA, 2016)
Direção: John F. Showalter
Roteiro: Brooke Roberts, Katherine Walczak
Elenco: Grant Gustin, Candice Patton, Danielle Panabaker, Carlos Valdes, Keiynan Lonsdale, Tom Cavanagh, Jesse L. Martin, Teddy Sears, Violett Beane, Haig Sutherland
Duração: 42 min.