- Há spoilers. Leiam, aqui, as críticas de todo o material desse universo.
The Boys é melhor quando foca no drama humano e quando descamba para a sátira óbvia, mas deliciosamente descarada. Depois de Departamento dos Truques Sujos não passar de um começo de quarta temporada bastante burocrático que teve a função de “cenas dos capítulos anteriores” para colocar os espectadores no mesmo patamar mnemônico, não fazendo absolutamente nada para retirar pelo menos reduzir o gosto amargo que o final da temporada anterior deixou, A Vida entre os Sépticos consegue ser mais interessante, ainda que fazendo pouco para a trama geral realmente andar e tomando algumas decisões que reputo equivocadas nessa altura do campeonato.
No lado divertidamente satírico, temos a hilária convenção da verdade, a Truthcon, como pano de fundo para uma missão de Marvin, Francês e Kimiko – com a ajuda indesejada, mas obviamente providencial, de Billy Bruto – que tenta descobrir o papel de Mana Sábia na história. Todas as sequências desse lado do episódio, inclusive a introdução formal de Espoleta (Valorie Curry), manipuladora de estalinhos manuais e principalmente de mentes frágeis como instrumento de Sábia e da “ameaça” momentânea representada pelo autoclonador Splinter (Rob Benedict) que só existe para tornar possível a cena da “Centopeia Humana“ (sou o primeiro a reconhecer que o Plano Crítico é um site doentio por ter a crítica da trilogia) e a pancadaria final, têm um fim em si mesmas, ou seja, elas existem para as críticas que são feitas sobre a maleabilidade da verdade e a facilidade de se controlar mentes sem a necessidade de superpoder.
Tematicamente no episódio, logicamente, a Truthcon, paraleliza e comenta a fabricação da verdade sobre Ryan, que Mana Sábia quer introduzir ao mundo como um messias super-heroico, mas que o Capitão Pátria impede em razão de sua psicopatia aqui manifestada como egoísmo profundo e necessidade de atenção e aclamação, estragando toda a encenação e traumatizando seu filho – em mais um capítulo do conveniente e frustrante processo que chamo de “Ryan é bonzinho, gente” -, além da busca da verdade por Hughie e Annie que novamente fazem de Trem-Bala um espião infiltrado nos Sete (outro bandido vendo a luz libertadora da verdade cansa e começa a indicar que todo mundo terá seu momento de redenção, o que é irritante demais). Mesmo com problemas, porém, todo esse aspecto de “verdades e consequências” do episódio funcionou para mim com mais eficiência do que a modorrência da reintrodução dos personagens no episódio anterior.
Mas eu falei de decisões equivocadas no episódio, não foi? Pois bem. Elas recaem na categoria geral de “criações e reutilizações de passados para os Rapazes”. Temos Francês em um círculo vicioso em que ele namora Colin (Elliot Knight), mas se odeia por isso já que ele é responsável pela morte da família do sujeito. Temos Kimiko retornando à sua época de cativeiro, largando a terapia e partindo, ao que tudo indica, para a vingança. Temos Marvin e Bruto naquele velho conflito ideológico deles. E, finalmente, temos Hughie lidando com a mãe que o abandonara e a seu pai, que retorna agora que Hugh Sr. está acamado. Não estou reclamando dos dramas em si, pois, como eu disse logo no começo, é com eles que The Boys costuma sobressair-se quando não está abalroando baleias ou lidando com prazer intrapeniano. O problema está no momento em que essas situações estão sendo abordadas.
A série já teve oportunidade de lidar com os passados de Francês e Kimiko. Para que voltar a eles agora? Será que eles realmente precisam de mais um encerramento de arco narrativo? E a tensão entre Marvin e Bruto só pode ser fruto do amor carnal que os dois sentem um pelo outro, pois não é possível… Pelo menos Billy não retornou – ainda – oficialmente aos Rapazes pela intransigência de Marvin, o que é um começo na série de conveniências narrativas em que esses episódios iniciais se apoiam. E a história de Hughie com a mãe, bem, não sei bem qual é a intenção de Erik Kripke em lidar com isso agora, mas eu realmente espero que não haja ligação com a Vought (ok, eu sei que a mãe dele trabalha para uma divisão da empresa maligna, mas torço para que as coincidências parem por aí), senão será muito cansativo.
Não foi aqui que a quarta temporada de The Boys reencontrou seu ritmo e qualidade usuais. Sim, houve uma melhora em relação ao cansado episódio de abertura, mas ela não foi tão significativa assim para que justificasse uma subida visual da “nota final”. Está bom como está, mas o problema é que apenas bom não é nem de longe o suficiente para essa série.
Obs: Sei que estou me repetindo, mas, novamente, o grande destaque é a atuação assustadora de Antony Starr.
The Boys – 4X02: A Vida Entre os Sépticos (The Boys – 4X02: Life Among the Septics – EUA, 12 de junho de 2024)
Showrunner: Eric Kripke
Direção: Karen Gaviola
Roteiro: Jessica Chou
Elenco: Karl Urban, Jack Quaid, Laz Alonso, Tomer Capon, Karen Fukuhara, Antony Starr, Erin Moriarty, Chace Crawford, Nathan Mitchell, Colby Minifie, Claudia Doumit, Cameron Crovetti, Susan Heyward, Simon Pegg, Valorie Curry, Rosemarie DeWitt, Elliot Knight, P. J. Byrne, Rob Benedict, Will Ferrell
Duração: 59 min.