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Crítica | The Beanie Bubble – O Fenômeno das Pelúcias

Ambição, egoísmo e bichinhos de pelúcia.

por Ritter Fan
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Em 1993, H. Ty Warner, fundador da Ty Inc., introduziu no mercado consumidor dos Estados Unidos uma linha de pequenos bichos de pelúcia que se tornou uma das primeiras febres da era da internet, com alguns deles sendo revendidos a preços estratosféricos depois de caçados por colecionadores descontrolados e fazendo bilhões para a empresa que manipulava a demanda e oferta por meio de diversas estratégias hoje tão comuns. The Beanie Bubble – O Fenômeno das Pelúcias, obra de Kristin Gore e Damian Kulash que estreiam na direção de longas, vem, a exemplo de Tetris e Air – A História por Trás do Logo, só para citar dois exemplos do mesmo ano, contar essa história de sucesso meteórico, ainda que sem a mesma qualidade.

Os Beanie Babies, como foram batizados por serem pelúcias preenchidas por bolinhas de plástico (beanies) que os tornavam especialmente macios e maleáveis, eram caracterizados por seu tamanho diminuto, variedade quase infinita de modelos e cores, nomes para cada bichinho e um poema personalizado na etiqueta e, com um boca-a-boca não por crianças, mas sim por adultos via a então incipiente internet, ganharam status de objetos de cobiça e obsessão que é muito bem capturado pela sequência de abertura que retrata um acidente real com um caminhão que transportava caixas e mais caixas dos brinquedos que foram saqueadas em plena rodovia por motoristas ensandecidos. É o colecionismo descerebrado e doentio em sua manifestação mais podre retratado logo no começo, em um daqueles casos em que a realidade é definitivamente mais estranha que a ficção.

No entanto, o roteiro escrito por Gore com base em livro jornalístico de Zac Bissonnette publicado em 2015, tem o colecionismo desvairado apenas como pano de fundo, já que seu foco fica mesmo na figura do empresário Ty Walker vivido por um Zach Galifianakis quase irreconhecível sem sua barba a partir do ponto de vista das três mulheres que o ajudaram a construir seu império, Robbie (Elizabeth Banks), Sheila (Sarah Snook) e Maya (Geraldine Viswanathan), em dois momentos temporais diferentes que vão aos poucos convergindo, o primeiro em 1983 quando Ty e Robbie fundam a empresa e o segundo em 1993 quando a empresa, já estabelecida na área de bichos de pelúcia, decola de vez com os Beanie Babies graças aos esforços de Maya, que imediatamente percebe o poder da internet e Sheila, cujas filhas pequenas basicamente criam o conceito da variação diminuta dos brinquedos que já eram vendidos.

Trata-se, portanto, de uma história a partir do olhar feminino para o mundo empresarial que notoriamente deixa as mulheres para escanteio, ao mesmo tempo em que é uma sátira que desanca o tão perseguido Sonho Americano, reduzindo-o a um conjunto formado por ambição, egoísmo e histrionismo. Infelizmente, apesar de os quatro atores principais, especialmente um afetadíssimo, mas excelente Galifiniakis, sem dúvida serem os grandes chamarizes para o longa, eles não conseguem, sozinhos, segurar uma narrativa que tenta existir apoiando-se em uma pouco inspirada conexão de clichês e tropos narrativos básicos salpicada por canções das épocas retratadas em um conjunto tão raso em conteúdo que fica até difícil afirmar com todas as letras que os personagens ganham arcos narrativos decentes.

Não é que o longa não tenha seu valor, pois ele tem, especialmente no departamento dramático, mas nós já o vimos antes de diversas maneiras diferentes e mais inspiradas, inclusive nos dois casos citados no primeiro parágrafo. Se Ty Walker funciona como um arquétipo interessante não exatamente do executivo sem coração, mas sim de uma pessoa claramente doente, algo que Galifiniakis usa como vetor para uma performance que transmuta sua usual pegada cômica em algo que resvala no psicótico, e se Banks, Snook e Viswanathan emprestam o devido vigor feminino às suas personagens, mas sem que elas ganhem mais camadas do que o que está bem na superfície, o restante é a velha colcha de retalhos que precisa dos mais variados e batidos artifícios para não perder a coesão, o que leva o longa a progredir na base de solavancos, apesar do cuidado constante com figurinos de época e um excelente trabalho de cabelo e sobretudo maquiagem (com retoques digitais aqui e ali, se não estiver enganado) que permitem que Galifiniakis e Banks transitem entre décadas.

Mesmo com esse problema estrutural, The Beanie Bubble – O Fenômeno das Pelúcias tem uma premissa real muito interessante, chamativa e, diria, até assustadora, seja do lado corporativo, seja do lado do colecionismo, que, aliás, poderia ser a base para um filme muito superior se o roteiro focasse de verdade nas estratégias empresariais e no frenesi consumidor e não em pseudo-mensagens edificantes que não ficam verdadeiramente de pé e que tentam, no fundo, artificial e didaticamente trabalhar pautas que eu sou o primeiro a dizer que são relevantes, mas que não se encaixam naturalmente na história sendo contada. As mulheres reais por trás do inacreditável sucesso de um homem asqueroso mereciam um filme que realmente fizessem jus a elas e não algo que por muito pouco não ecoa os próprios Beanie Babies, ou seja, interessantes por alguns minutos, mas esquecíveis a longo prazo.

The Beanie Bubble – O Fenômeno das Pelúcias (The Beanie Bubble – EUA, 28 de julho de 2023)
Direção: Kristin Gore, Damian Kulash
Roteiro: Kristin Gore (baseado no livro de Zac Bissonnette)
Elenco: Zach Galifianakis, Elizabeth Banks, Sarah Snook, Geraldine Viswanathan, Tracey Bonner, Carl Clemons-Hopkins, Kurt Yaeger
Duração: 110 min.

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