- Há spoilers. Leiam, aqui, as críticas dos demais episódios da série.
Para todo mistério é necessário haver uma boa ilusão que prenda o público. Há várias maneiras de fazer isso, com acréscimo de informações, elipses e possibilidades narrativas. Como uma boa novela, Star Wars, e por consequência The Acolyte, utiliza a básico revisão de cenário. O exemplo mais fácil de lembrar na franquia é o caso Obi-Wan com o Luke falando sobre sua família. Na trilogia clássica, no primeiro filme, Luke pergunta sobre o pai, Obi-Wan responde que ele foi morto por Darth Vader; no segundo filme ele descobre que seu pai é o Darth Vader; e no terceiro filme descobre uma irmã. Isso também é chamado de retcon, mas soa bem semelhante com as novelas brasileiras que traziam uma revelação bombástica sobre familiares para a história progredir, ou criar mais drama. Porém, infelizmente, nesse sexto episódio, Ensinar/Corromper, o mistério perde a ilusão.
Nos episódios anteriores, o problema de empurrar o mistério com mais informações, na expectativa que o cenário da morte das bruxas em Brendok fosse revelado completamente, se mostrava por ser a dependência dramática da série. Isso alinhado com o ritmo “netflixado”, aos poucos as revelações poderiam expor o esqueleto da narrativa e do roteiro como algo pobre em desenvolvimento. Assim, Ensinar/Corromper parece desabar os defeitos da produção de The Acolyte em como fazer o novelesco com ilusões bem feitas para suas incógnitas, especialmente após revelar o grande vilão dos Jedi. Sem o Sith como algo mais imediato do futuro a se esperar, toda a expectativa se volta ao passado de Osha e Mae, ou até mesmo do próprio Sith.
Como temática geral da série, vemos que a organização da história em acinzentar o preto no branco dos Jedi e Sith é extremamente óbvia. Isso não é ruim, mas algumas sutilezas se perdem, especialmente na montagem paralela e como a direção explora cores e luz — ou melhor dizendo: unidade estilística audiovisual do episódio. Como apresentei nos textos de Noite e Dia, havia a preocupação literal da tensão total surgisse quando a noite aparecesse em Khofar, e ela se dissipasse, com o fim da luta, no amanhecer. Em Ensinar/Corromper, essa associação direta fica pobre exatamente por a ilusão do mistério se perder.
Enquanto Qimir retira suas roupas pretas, toma banho e veste sua blusa branca, tentando Osha a ter a liberdade como sua aprendiz do lado escuro da Força, Mestre Sol tem seu sobretudo cada vez mais sujo e com marcas de guerra, lutando contra suas emoções numa nave escura, que por algum motivo perde a energia. O Sith no ambiente claro, com roupas claras, o Jedi num ambiente escuro com roupas sujas, e ambas Mae e Osha tem vestes cinza claro e cinza escuro, respectivamente, para indicar o clima da Força dos personagens. Mesmo que isso faça parte da composição dramática do episódio, os diálogos e as ações parecem paralisar, cadenciar todo o ritmo, ao ponto dessas composições deixarem de ser sutis, se tornando um requentamento do tema da série e do episódio.
De novo: isso tudo acontece porque a ilusão do mistério se perde. Durante todas as conversas com as gêmeas, sempre há progressos de um drama, de uma aproximação da revelação, e surgem interrupções anticlimáticas. Mostra-se uma cicatriz, mas foge-se da informação com outra informação; dize-se que o passado vai ser explicado e a energia da nave volta; mais uma vez é falado dos problemas do Jedi em Brendok e um silêncio reina para a montagem mudar de cenário. Se você se irritou só em ler essa frase anterior, imagina assistindo. E por causa dessa insistência em ir para frente para dar dois passos para trás que o que se tornava gancho para o próximo episódio aparece agora como frustração.
Mesmo que nesse episódio haja novidades no nosso olhar para franquia, com tensões sexuais entre os personagens e drasticidade nos diálogos, além de teorias novas sobre o cânon, especialmente sobre a Regra dos Dois do Sith e todo o Código Sith bem desenvolvido no cenário cinza e pretensamente complexo da série em tratar o maniqueísmo; The Acolyte vai matando sua qualidade aos poucos por parecer ter pouco a entregar dramaticamente, além de suas conexões canônicas. Isso talvez explique a “netflixação”, uma necessidade para conteúdos pouco enriquecidos. O ritmo acelerado é um ótimo disfarce e mantém séries medianas com qualidade com a aproximação dos pontos da história em causa em consequência, no entanto, com Ensinar/Corromper, esse sexto episódio da série, pode até mostrar uma grande consequência nos próximos episódios, mas sua causa não pode ser maltratada assim.
Nem Lee Jung-jae (ator do Mestre Sol) e Manny Jacinto (ator de Qimir) podem compor qualidade para segurar os entornos mal trabalhados de uma narrativa. A mestre Vernestra, com seu sabre chicote (puro show off) investigando Khofar, (com trilha sonora tocando melodias de Dagobah) que alimenta o mistério sobre o passado do mestre Sol, junto com o tom infantil e lúdico do droid Pip e do Bazil, são ao menos entornos diferentes sobre política e inocência, algo bem Star Wars que não perde a ilusão. E claro, cortosis e o capacete de Qimir, sem dúvida, é um toque bom de ilusão para o final da série.
The Acolyte – 1X06: Ensinar/Corromper (The Acolyte – 1X06: Teach/Corrupt – EUA, 02 de julho de 2024)
Criação: Leslye Headland
Direção: Hanelle M. Culpepper
Roteiro: Leslye Headland, Jocelyn Bioh
Elenco: Amandla Stenberg, Lee Jung-jae, Charlie Barnett, Dafne Keen, Manny Jacinto, Rebecca Henderson, Harry Trevaldwyn
Duração: 39 min