- Há spoilers. Leiam, aqui, as críticas dos demais episódios da série.
Diferente dos dois episódios anteriores, Destino, terceiro episódio de The Acolyte, não quer ser objetivo em entregar mistérios e sim fomentar ainda mais dúvidas dramáticas a partir da mitologia de Star Wars. Num episódio recheado de símbolos, dualismos e elipses, a série apresenta o passado das irmãs gêmeas Mae e Osha no planeta Brendok, criadas por bruxas que tem uma interpretação específica da Força, diferente dos Jedi. Com um ritmo ainda objetivo, numa montagem bem simples que mal se percebe o episódio passar, mas com propósito de cadenciar o mistério por trás dos quatro Jedi e o incêndio que destrói a irmandade que cultua o Fio do destino; há, assim, finalmente, uma mistura excelente de desenvolvimento de universo da série (ritmo próprio, personagens, linguagem visual, etc) com as bases de Star Wars – sejam visuais ou mitológicos.
Por mais que a franquia abra possibilidade para formatos e dinâmicas narrativas diferentes, tem algo em Star Wars que permanece em todas as obras, independente da qualidade. Nos dois primeiros episódios, traços cinematográficos, ou até de drama sobre a Força, perderam-se em prol do foco único e captar o público de maneira emergente de cara. Se até o filme de Han Solo, ou a série Boba Fett, apresentam dramas sonoros, como se a Força aparecesse na trilha sonora, ou em algum resolução heroica, onde estava a fagulha disso em The Acolyte? Uma frase de Osha “eu acredito nos Jedi”, ou a empatia do Mestre Sol, pareciam objetos coloridos pequenos numa grande narrativa cinza de apresentar mistério e acabá-los.
Logo, Destino, de maneira bem direta, começa mostrando Mae e Osha usando a Força com a natureza, com uma fotografia mais calma para registrar tudo isso, mas sem perder o motivo de voltar ao passado: abrir forte o leque de possibilidades sobre quem é bem e quem é mal nessa onda de assassinatos dos Jedi na Alta República. Leslye Headland, showrunner da série, foi bem enfática em suas entrevistas sobre esse caminho ambíguo, ou relativista, que ela queria tratar com a Força, deslocando o maniqueísmo mais concreto que temos nos filmes. Apesar disso parecer ser novo, isso se aproxima do trato de Rian Johnson no Episódio 8 com Rey e Kylo Ren, em aumentar a matiz das cores entre o azul e o vermelho, criando um espaço a ser explorado entre o lado luminoso e escuro da força.
Dessa forma, não há dúvida que é Star Wars, seja com o tema do episódio, seja com o trato visual. O que é mais Star Wars que uma boa rima visual de Mestre Sol salvando Osha criança de um precipício, assim como fez no episódio 1 dela adulta? E por mais que essas qualidades apontadas do episódio pareçam purismo de um fã que aqui escreve, na verdade são necessidades que a série necessita para desenvolver o que ela mostrou na sua introdução: o ponto de vista dos Sith e a dúvida sobre a índole dos Jedi. Para que isso seja bem trabalhado dramaticamente na narrativa da série, episódios como Destino nos empurram para dúvidas e mistérios profundos sobre o que os personagens fizeram “naquele verão” em Brendok. Sem essa base Star Wars bem firmada seria só uma série de suspense de assassinatos, sem se conectar ou produzir nos espectadores reflexões sobre a franquia.
Exemplo de reflexões: você já duvidou tanto assim de um Jedi ser maligno? Se eles podem ser tão ruins, porque Osha queria tanto ser Jedi? Será que esse método de recrutar crianças tão cedo não é opressor? Percebeu como a verdade e a mentira no episódio não se fazem em bem ou em mal diretamente? Essas perguntas fazem parte do período republicano Alta República, que os Jedi estão no processo de decadência por causa da política. O suspense é uma maneira de propor essas perguntas.
Por fim, a apresentação das bruxas, a mãe Aniseya criando crianças na Força, e a árvore de folhas amarelas que Mae termina olhando incrementam num bom roteiro que te faz repensar sobre a Saga. Pode até te deixar perdido se for tentar achar vilões e heróis imediatos, mas junto com um trato visual coerente, Destino quer nos mostrar que para fazer um bom mistério em Star Wars acerca das tramas da Força temos que ficar atentos. Seja na fotografia do episódio – no segundo plano das irmãs brigando enquanto a mãe está treinando-as, ou nas coisas não mostradas – as elipses entre o começo do incêndio e Osha sendo salva; tudo pode ser cobrado da nossa atenção para a resolução do mistério entre as escolhas e o destino da Força.
The Acolyte – 1X03: Destino (The Acolyte – 1X03: Destiny – EUA, 11 de junho de 2024)
Criação: Leslye Headland
Direção: Kogonada
Roteiro: Eileen Shim, Jasmyne Flournoy
Elenco: Jodie Turner-Smith, Lee Jung-jae, Margarita Levieva, Lauren Brady, Leah Brady, Carrie-Anne Moss, Amy Tsang, Dean-Charles Chapman, Joonas Suotamo, Saskia Allen, Abigail Thorn, Deborah Rosan, Tabitha Alege
Duração: 44 min.