Te Espero no Fim da Jornada é um filme taiwanês repleto de lirismo e emoções genuínas. A diretora Angel Ihan Teng (Teng I-Han) investe, de maneira intimista, na trajetória de um escritor de Hong Kong cuja vida foi profundamente marcada pelas belas recordações de uma troca de cartas com um jovem leitor; mas que hoje é atormentado por uma falsa acusação de plágio e dilacerado por uma desilusão existencial que o leva a cogitar o suicídio. Sua viagem a Taipei marca o início de uma mudança completa, quando ele se encontra com um jovem gângster (talvez vivendo à margem das atividades criminosas), que o ajuda a se livrar de alguns assaltantes e acaba sendo o seu guia turístico, prometendo levá-lo à misteriosa baía das baleias azuis, abrindo a costura dramática de toda a fita.
O roteiro entrelaça, de maneira sutil, desejos, memórias e projetos a uma realidade crítica para os dois protagonistas. O escritor, interpretado por Terrance Lau Chun-him, sente-se oprimido pelos prazos, pelos compromissos editoriais e, agora, pela acusação de plágio. Sua fuga para Taipei é também uma “despedida da vida”, pois ele pretende se matar. Já o gângster, interpretado de maneira magnética por Fandy Fan, lida com questões de outra ordem, procurando ganhar algum dinheiro e, ao que tudo indica, se afastar das atividades criminosas mais intensas. Seu contato com o escritor também marca, para ele, uma mudança no rumo da vida, e em toda a primeira parte do filme a diretora irá representar esse contato de maneira visualmente impactante, com uma elogiável fotografia noturna e uma montagem ágil e inteligente, capaz de interessar o espectador pelo desenrolar do que parece ser um romance entre os dois.
Essa é uma das partes mais coesas da obra, com cenas cheias de ternura e sugestões de uma atração entre os personagens, algo que nunca é mostrado efetivamente (em parte, por questões culturais) e que acabou dando ao filme a pecha de criar um “falso romance gay”. Se levarmos em consideração as explicações que nos são fornecidas no penúltimo ato da obra, veremos que essas “figas homoeróticas” fazem sentido, tanto pela diferença de idade entre os personagens, quanto pela relação já antiga entre eles, embora só um soubesse a verdade. Quando a dupla começa a viagem até a baía das baleias azuis, vemos o que parece ser um caminho de amadurecimento, aprendizado, troca de experiências e fortalecimento de um sentimento que, inevitavelmente, terminará em romance. Os atores sabem trabalhar muito bem cada uma dessas nuances, e as cenas com o cachorro, na cachoeira, são o grande destaque desse bloco dramático e do estabelecimento de sua conexão.
O que faz o filme cair muito de qualidade é a atmosfera que toma conta do enredo quando o escritor retorna para Hong Kong. A obra já vinha apresentando uma abordagem confusa na sequência do festival das luzes, pois tudo indicava que eles estariam juntos no evento. E mesmo que depois tenhamos uma explicação, em flashback, para o que de fato aconteceu ali (um acontecimento muito triste e violento), a construção de todo o bloco abre muito espaço para dúvidas e confusão em relação ao andamento da história. Nada se compara, porém, com o que vem depois. Tudo o que se passa em Hong Kong é cansativo, dirigido de maneira burocrática, com uma fotografia quase turva, fria e impessoal. É claro que tudo isso tem um sentido estético, a fim de mostrar o estado emocional do escritor. Mas o tom do filme muda tanto, o foco do texto se altera de tal maneira e toda a dinâmica na qual investimos emoções é tão alterada, que a palavra mais simpática que consigo pensar para definir este bloco é “descarte”.
No último ato, a direção adiciona uma camada de fantasia e cura psicológica ao longa, trazendo uma nova viagem do escritor. Seu dilema, agora, não é mais de ameaça à própria vida. Ele encontrou alguém que o fez querer viver. Mas a existência sem alguém para amar pode ser solitária demais. A ausência de seu interesse amoroso ganha novos ares no texto, pois é confirmado que o gângster era o garoto que, pouco mais de uma década antes, comunicava-se com ele por carta. Ainda temos algumas cenas que imitam a horrenda montagem videoclipe que dominou as lembranças em Hong Kong, mas, aos poucos, a direção assume um caminho mais coeso e volta a exibir o lirismo que fez parte do início da projeção. Uma interpretação mais cínica desse final poderia ver na busca do escritor uma maneira pouco saudável (emocionalmente) de lidar com o luto. Acontece que sua intenção não é substituir o amor que se foi. Ele sabe que suas atitudes são simbólicas. Ele segue uma narrativa fantasiosa para criar um marco emotivo e definir, para ele mesmo, uma nova era de sua existência. E nessa esteira de fantasia, narrativa ficcional e desejo, o Universo parece dar um grande presente ao escritor, fazendo-o encontrar-se com outra pessoa… alguém com a mesma essência que ele buscava.
As surpresas dos encontros que temos durante a vida é algo que o roteiro de Te Espero no Fim da Jornada nos apresenta desde suas cenas iniciais. Cada indivíduo que passa por nós é um milagre em potencial. Um amor possível. Ou uma decepção que se encaminha. O mundo à nossa volta encarna uma variedade de futuros que não conhecemos, mas que, talvez depois de um “oi”, ou mesmo por puro acaso, pode representar novos caminhos; uma cura; uma nova vida. O escritor entendeu que seu faz-de-conta literário preparou o seu terreno emocional para três coisas: dar adeus a quem partiu, entender o seu desejo mais íntimo, e abraçar, com energia e afeto, a nova vida que se apresentava para ele.
Te Espero no Fim da Jornada (我在這裡等你 / Wo zai zhe li deng ni / A Balloon’s Landing) — Taiwan, 2024
Direção: Angel Ihan Teng (Teng I-Han)
Roteiro: Teng I-Han, MoMo Wu, Seven Leung
Elenco: Terrance Lau Chun-Him, Fandy Fan, Chan Tzu-hsuan, Allison Lin, Rachel Kan, Michael Tao, Spark Chen, Chih-Fan Cheng, Renee Ho, Lin Yu, Che-Wen Tsai, Mu-Yao Lu, Yu Teng Hsu, Soon Chang, Fivewood, Kenneth Cheung Moon-Yuen, Pang Ngan-Ling
Duração: 100 min.