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Crítica | Super Crooks – 1ª Temporada

O crime... compensa?

por Kevin Rick
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Baseada na HQ homônima de Mark Millar, e também sendo um spin-off do live-action de Legado de Júpiter, Super Crooks é um produto conceitualmente e tecnicamente perfeito para o consumo audiovisual das massas atuais. Primeiro que a série faz parte do famigerado gênero super-heróico, inserindo-se na proposta violenta e cínica que tem recebido grande demanda desde o sucesso de adaptações como The Boys e, mais recentemente, InvencívelA obra também busca outra multidão de fãs com a animação e narrativa que bebe de elementos japoneses do anime, com a produção da série ficando nas mãos do Estúdio Bones (responsável por Soul Eater, Fullmetal Alchemist, My Hero Academia). Se não fosse o bastante, o show tem uma proposta bem galhofeira e cômica com a narrativa de heist (assalto/roubo), como se estivéssemos assistindo a Onze Homens e Um Segredo com poderes.

Parece uma salada de ideias bem típica de Mark Millar, um escritor de quadrinhos que adora se divertir subvertendo convenções e expectativas do que normalmente vemos em histórias habituais de heróis vs vilões, vide Kick-Ass, Kingsman e Legado de Júpiter para dar exemplos mais famosos do seu Millarworld. No entanto, também acho que Millar é um roteirista que preza mais pela provocação violenta do que necessariamente desenvolver algum tipo de profundidade satírica e dramática, como vemos na tiração de sarro crítica de The Boys ao mito do herói ou no coming-of-age perturbador de Mark Grayson em Invencível. Mesmo curtindo muitas obras da bibliografia do autor, é negativamente notável quantas ideias sólidas de Millar em seus trabalhos autorais se transformam em uma execução genérica e agressiva para vermos ação e sangue em tela, como nos fraquíssimos Empress, Reborn, O Procurado, Kick-Ass: Volume 2 e MPH.

A adaptação de Super Crooks pelo roteirista Dai Satō segue um caminho similar. O primeiro episódio nos apresenta ao protagonista Johnny Bolt, um jovem que vive com uma mãe intolerável e é humilhado na escola. O garoto sonha em ser um super-herói para poder sair de casa. Um dia, milagrosamente, Johnny ganha poderes de eletricidade, decidindo virar um vigilante encapuzado. No entanto, seu primeiro ato de heroísmo sai completamente errado, enveredando o personagem para a trajetória do crime. Essa história de origem dá início ao enredo principal no segundo episódio, sobre um bando de ladrões sobre-humanos tentando realizar um último assalto para que possam se aposentar da vida do crime, da qual um Johnny adulto e salafrário faz parte.

Curioso como o primeiro episódio destoa bastante de como é a experiência geral do anime, mas é, de longe, meu capítulo favorito desta 1ª temporada. Fiquei surpreso quando me deparei com 30 minutos contando uma história trágica sobre um aspirante a herói sendo destroçado por um infeliz acidente. Mesmo seguindo uma linha narrativa bem previsível e clichê, o texto consegue envolver o espectador a ter empatia pelo protagonista e seu sonho de heroísmo, assim como ser impactado pela situação catastrófica que muda sua trajetória moral. É possível notar um absurdo cômico na maneira como o primeiro ato de heroísmo de Bolt escalona para o ridículo, mas há indícios de um arco dramático, culpa e remorso, e até, quem sabe, dentro das minhas esperanças mais loucas, um estudo de personagem sobre Bolt se tornando um vilão pela circunstância.

E, bem, nada disso acontece. Assim que o segundo episódio começa, a narrativa se preocupa apenas com o tom descompromissado e cômico de supervilões idiotas e da trama impossível de assalto. Não tenho problema com a proposta lúdica e simplória da obra, mas a forma como a série sempre estabelece bons conceitos, como esse do primeiro episódio, o romance entre Bolt e Kasey preso em um loop de erros ruins do protagonista e até alguns momentos satíricos com heróis corruptos, que acabam sendo descartados pelo roteiro desinteressado por drama, desenvolvimento de personagens ou qualquer tipo de substância para ser honesto. É muito frustrante.

Resumindo, a animação joga vários elementos na narrativa, mas raramente compensa seus temas. Dessa forma, fica realmente difícil se importar com o protagonista ou qualquer outro membro coadjuvante no desenvolvimento superficial da série. Alguns personagens são até agradáveis de assistir dentro de seus arquétipos, mas a série pouco investe em momentos de dinâmica entre a gangue para nos identificarmos ou pelo menos simpatizarmos pela interação do grupo. Falta um carisma e um charme para os Super Crooks e seus assaltos. O fato de que o texto sofre bastante com piadas bobas e diálogos expositivos não ajuda nesse quesito. Notem como a animação passa mais tempo explicando o planejamento do que mostrando ele em prática, inclusive com a maioria dos roubos terminando em batalhas sanguinolentas que vão ficando mais sem graças à medida que a violência de cabeças explodindo e membros arrancados se torna banal.

Também tenho sérios problemas com a montagem e a estrutura da série, sempre trabalhando vários flashfowards como paradas bruscas para reiniciar o enredo em um futuro próximo. Isso fere o fluxo da história como um todo, pois parece sempre estar empurrando a narrativa com a barriga, já que a equipe criativa não soube dar um tempo de execução realmente dinâmico para uma série que deveria ser sobre assaltos. Considerando que os personagens são genéricos e há pouco intuito dramático para além das situações do roubo, é bastante estranho que estruturalmente a série está mais preocupada em abandonar a ação crescente de uma circunstância para começar tudo de novo, com novos planejamentos, mudanças de personagens e saltos temporais para explicar mais segredos. Isso deixa o tempo escasso para dinâmicas de grupo e realmente fere qualquer sentimento de clímax.

Em contrapartida, se tem algo que deixa Super Crooks levemente passável é a belíssima animação. O estúdio Bones entende muito bem a premissa divertida. O show tem uma estética que caracterizaria como “verão”, saturado de cores vibrantes e quentes, além de conter uma vibe sensual e retrô – junto da ótima trilha sonora ora jazzística, ora eletrônica. É uma imersão visual realmente surpreendente. Além disso, mesmo revirando os olhos para todo o gore desnecessário, as melhores partes da série vêm na execução dos assaltos, nas batalhas e no conjunto da ação. A animação é impressionantemente variada em suas longas set-pieces e na inventiva maneira que trabalha os poderes genéricos dos personagens.

Super Crooks poderia até ser enquadrada no estilo sem substância. No entanto, mesmo sendo frustrante como a série deixa de almejar pelo lado dramático em vários momentos que poderia fazer isso – com o abandono do que acontece no primeiro episódio como maior exemplo -, do segundo capítulo pra frente, a animação, na maior parte do tempo, não tenta ser mais do que uma experiência momentânea de ladrões super-poderosos se dando mal. Mas é justamente nessa proposta que a série sofre em proporcionar a diversão que o visual imprime, pois não tem o ritmo temporal, a dinâmica dos assaltos, os bons diálogos do grupo e os personagens carismáticos para ser narrativamente tão charmosa quanto parece (e quer) ser. Uma pena.

Super Crooks – 1ª Temporada | EUA, 26 de novembro de 2021
Direção: Motonobu Hori
Roteiro: Dai Satō (baseado na obra de Mark Millar)
Elenco: Kenjiro Tsuda, Maaya Sakamoto, Hiroshi Yanaka, Yasuji Kimura, Pierre Taki, Junichi Suwabe, Hisao Egawa, Eiji Takemoto, Subaru Kimura, Tetsu Inada, Wataru Hatano, Kenn
Duração: 390 min. (13 episódios)

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