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Crítica | Star Wars – Dooku: Jedi Lost

por Giba Hoffmann
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Espaço: Serenno, Coruscant, Karazak, Asusto, Hakotei
Tempo: ~22 a.B.Y / Guerras Clônicas (sequências de enquadramento); ~90—30  a.B.Y. (flashbacks)

Em meio ao show de atrocidades de Ataque dos Clones, a introdução do vilanesco (e desafortunadamente nomeado) Conde Dooku acabou cumprindo mais o papel de “dar uma cara” para a facção separatista nas Guerras Clônicas, bem como um oponente para a estreia de Yoda em uma cena de ação com sabres de luz (sacrilégio para alguns, ponto alto do filme para outros). Executado sem cerimônia logo ao início do filme seguinte, o personagem acabou de certa maneira seguindo o destino de Darth Maul, cumprindo apenas um papel de “vilão poste” em sua passagem pelos filmes e sendo explorado sobretudo através dos materiais do Universo Expandido.

De forma um tanto inesperada, eis que o vilão agora volta à cena em meio às recentes explorações canônicas dos elementos da trilogia prequel. Dooku: Jedi Lost, primeiro audiodrama original de Star Wars em pelo menos duas décadas, conta um pouco das origens do famigerado Darth Tyrannus, contextualizando melhor um intrigante período da saga que permanece ainda relativamente pouco explorado.

Partindo de um enquadramento em meio ao período das Guerras Clônicas, acompanhamos a perspectiva da aprendiz de Dooku, Asajj Ventress, que como parte de seu treinamento nas artes da Força Sombria busca compreender melhor a natureza e as motivações de seu mestre. Revirando diários pessoais e stalkeando todos os registros holográficos do velhote Efetuando uma pesquisa histórica cuidadosa, Ventress reconstrói a trajetória pessoal de Dooku desde seu ingresso na Ordem Jedi até sua ascensão como poderoso oponente da República.

Nesse caminho, a história acaba respondendo várias perguntas que nós provavelmente nunca fizemos a respeito do vilão. Como pode um Jedi ser parte da nobreza e herdar poder político, se via de regra os ingressantes da Ordem são retirados de suas famílias e rompem quaisquer laços externos logo na infância? Qual foi a ordem dos eventos e motivações que levou à encomenda do exército de clones por Sifo-Dyas (outro nome desventurado), e qual sua ligação com Dooku e Darth Sidious no esquema das Guerras Clônicas? O que raios, afinal de contas, defende e acredita Dooku politicamente enquanto indivíduo, para além da filiação às armações de seu mestre Sith? Afinal de contas, diferentemente do caráter de “pau mandado” do Zabrak que o antecedeu, o cara foi um Mestre Jedi com décadas de experiência, parte do Conselho e tudo mais…

Perdidas em meio às sinapses queimadas com as cenas da lua de mel antecipada de Anakin e Padmé, essas questões na verdade delineiam um vilão bem mais intrigante do que o que foi visto em tela, com potencial para uma participação tão complexa e importante nos eventos da galáxia quanto o favorito dos fãs, Palpatine. De forma geral, o esforço se destaca principalmente por mostrar o potencial de conceitos e premissas da “era prequel”, livres dos problemas de execução que sabotaram a infame trilogia de filmes.

As tensões internas da Ordem Jedi, por exemplo, ganham espaço para se desenvolverem contra o pano de fundo de toda uma longa história de vida na qual acompanhamos o prodigioso herdeiro de uma dinastia de donos de terra lidando não apenas com uma crise identitária, mas também com facetas diversas do dilema “poder versus justiça”. Ao contrário do que ocorreu com Anakin nas telonas, a queda de Dooku para o lado sombrio evita a toada bidimensional e adolescente de uma genérica “renúncia ao sistema”, e traz uma construção suficientemente nuançada de como intenções originalmente justas podem acabar resultando em tirania.

Já os elementos de debate político estelar, malvistos por muitos fãs da trilogia original, também conseguem evitar o marasmo ao focar um elenco de personagens bem interessantes, que conta tanto com figuras conhecidas (como certos mestres e aprendizes de Dooku) quanto novas. Dentre as novidades, o grande destaque é a Mestre Lene Kostana, uma Jedi com veia de historiadora que caça antigos artefatos Sith pela galáxia e defende que a Ordem Jedi deveria estudar com cuidado o Lado Sombrio ao invés de simplesmente evitá-lo proibitivamente.

A relação de Dooku, seu amigo próximo Sifo-Dyas e a Kostana explora muito bem esse caráter obscurantista dos Jedi, nuançando o lado sombrio da Força não apenas pelo usual aspecto emocional, mas também e principalmente como forma de conhecimento e poder. Como poderiam os mestres Jedi se considerarem realmente sábios se eles renunciam a sequer ter contato com toda uma parcela do que caracteriza a Força? Não é por menos que essa ideia está presente em um dos melhores diálogos da trilogia prequel (não que a concorrência seja muito acirrada), quando Palpatine tenta fisgar Anakin em meio à exibição da ópera. Trata-se de um ângulo super intrigante para se explorar na infindável fonte de inspiração do taoismo espacial dos Jedi.

No geral, gostei bastante do desenvolvimento do nosso protagonista, ainda que a fluência da história acabe tropeçando um pouco nas sequências de enquadramento. Aparentemente na dúvida entre ser uma espécie de audiobook dramatizado ou um audiodrama em capítulos, o roteiro de Cavan Scott recorre a narrações que poderiam facilmente ser dispensadas, embora sirvam bem para interligar os episodios espaçados da vida do Conde. A coisa redunda em alguns exageros caricatos típicos dessas narrações via relatos, do tipo “eu sei que estamos no meio de um campo de batalha e prestes a ser soterrados, mas deixa eu te contar essa história do meu passado, é realmente urgente”. Nada que atrapalhe o que, no núcleo, se propõe obviamente como um rompante divertido de fanservice para os apreciadores dessa era de Star Wars.

Os diferentes flashbacks funcionam como adendos episódicos que vão montando o mosaico de relações e motivações pessoais centrais para se compreender o abandono da Ordem por parte de Dooku. Há poucas adições gratuitas e (relativamente) pouco apelo ao fanservice, o que ajuda a dar ares mais convicentes para uma proposta do tipo. O enredo de Scott, veterano de produções da Big Finish, demonstra uma ótima compreensão daquilo que melhor funciona ou não no formato. Como resultado, o ouvinte se mantém interessado ao longo dos diferentes capítulos com facilidade. Os diálogos soam autênticos e constroem bem o elenco de personagens, e as cenas de ação transportam a imaginação diretamente para as boas sequências típicas desse universo.

Uma das vantagens do universo de Star Wars para essa midia é a facilidade com a qual os efeitos sonoros rapidamente disparam memórias visuais, resultando em uma ambientação rápida e eficiente. As interpretações, no entanto, acabam sendo um elo um tanto fraco. A renderização de Orlagh Cassidy evoca facilmente a vilã televisiva Ventress, assim como Marc Thompson se garante como Yoda com sua melhor imitação de Frank Oz. No entanto, a atuação de Euan Morton não soa nada semelhante ao que se esperaria de um jovem Christopher Lee, o que acaba destoando um pouco e custando para se acostumar.

Dentre as recentes investidas do novo cânone disneyiano de Star Wars, que se mostra agora mais inclinado a explorar a era da trilogia prequel, o audiodrama original Dooku: Jedi Lost se destaca não apenas pelo formato não usual, mas também como uma opção bem roteirizada que explora com originalidade um pouco do potencial aparentemente infinito da galáxia muito, muito distante em envolver com histórias interessantes.

Dooku: Jedi Lost (EUA – 2019)
Direção:
 Cavan Scott
Roteiro: Cavan Scott
Elenco: Orlagh Cassidy, Euan Morton, Marc Thompson, Pete Bradbury, Jonathan Davis, Neil Hellegers, Sean Kenin, January LaVoy, Saskia Maarleveld, Carol Monda, Robert Petkoff, Rebecca Soler
Duração: 380 min.

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