- Há spoilers. Leiam, aqui, as críticas dos demais episódios da série e, aqui, de todo nosso material sobre Star Trek.
É difícil dar play em Fly Me to the Moon sem o sabor desagradável deixado por Watcher, mas o quinto episódio da série consegue ser mais consistente e encaixado do que a abominação da semana passada, ainda que o capítulo que marca a metade da segunda temporada de Picard continue apresentando indícios ruins para um ano que começou de maneira promissora. O grande problema parece ser a falta de direcionamento, com determinadas tramas acontecendo de forma aleatória e sem a construção de uma narrativa coesa, sem falar de toda a superficialidade dramática do roteiro.
A historinha de Ríos sendo deportado, por exemplo, termina de modo rápido e anticlimático, sem qualquer tipo de criatividade visual (uma arminha que para um ônibus… sério?) ou impacto na narrativa macro, mas principalmente com um desfecho que demonstra falta de propósito. Qual foi o ponto de toda essa trama? Certamente não tivemos um tom aventureiro e muito menos reflexivo com as críticas do episódio anterior sendo praticamente esquecidas, então o roteiro da série parece caminhar num recorte arbitrário de temas sem uma diretriz dramática ou analítica. Nada parece recompensador para o espectador, seja em termos dramatúrgicos, seja em termos de diversão visual para uma obra que se vende como um ficção científica de viagem no tempo, mas que é sempre explorada de maneira estagnada.
Também vejo esses problemas no uso de Picard nos últimos três episódios, um personagem que a condução da história parecia querer explorar de maneira profunda em suas referências shakespearianas, encenações introspectivas e flashbacks da infância, mas que agora é mantido como um narrador da sua própria história, indo de cômodo a cômodo para conversar com faces familiares sobre o que está acontecendo, sem realmente fazer parte do que está acontecendo. Até acho interessante o envolvimento de uma ascendente de Picard como personificação do macguffin que muda a linha temporal, mantendo a narrativa mais pessoal para o protagonista com o constante uso da sua linhagem e amigos como parte essencial do enredo, mas a execução da obra está sempre explicando e não criando situações para descobrirmos elementos de maneira orgânica e dinamizadas no decorrer da missão. É o velho cacoete de obras que contam e não mostram.
A única trama de constante qualidade é o flerte tóxico entre Jurati e a Rainha Borg, terminando com a antagonista se tornando co-piloto mental da personagem. Acho a exploração da solidão da doutora um tantinho expositiva também, mas há comoção no arco de Jurati, contando com ótima atuação de Alison Pill e uma certa camada faustiana que adoro em derrocadas ao inferno. Outro ponto positivo do episódio está na participação ativa de Q, nos dando mais elementos para discutir suas motivações e estranho comportamento. A maneira que o texto encontrou para fazer isso, trazendo uma versão ancestral de Noonian e Altan Inigo Soong com o geneticista chamado Adam (Brent Spiner), cuja filha, Kore (Isa Briones), é a cara de Dahj e Soji Asha, parece uma escolha forçada para trazer os atores do ano anterior, além de estofar mais subtramas numa narrativa já sem direcionamento, mas o resultado é até interessante, tanto com a exploração de Q quanto com a participação do novo Soong.
Fly Me to the Moon é um episódio minimamente razoável, mas sem dúvidas é uma melhoria do descarrilho que foi a experiência de Watcher. Menos críticas sociais mal elaboradas, menos diálogos vergonhosos e menos situações de aventura sem criatividade ajudam a recuperar um pouco de respeito entre o espectador e a série. Mas tudo ainda soa como uma decepção considerando o primeiro episódio da segunda temporada. Jurati e sua diabinha de pescoço, e também Q, dão um pouco de esperança para a segunda leva de episódios, mas a maioria dos erros se mantêm. Tudo parece encaixado, porém, então veremos como os roteiristas usam suas cartas nos capítulo finais.
Star Trek: Picard – 2X05: Fly Me to the Moon (EUA, 31 de março de 2022)
Desenvolvimento: Kirsten Beyer, Akiva Goldsman, Michael Chabon, Alex Kurtzman (baseado em personagens criados por Gene Roddenberry)
Direção: Jonathan Frakes
Roteiro: Terry Matalas
Elenco: Patrick Stewart, Alison Pill, Evan Evagora, Michelle Hurd, Santiago Cabrera, Isa Briones, Jeri Ryan, Orla Brady, Annie Wersching, John de Lancie, Brent Spiner
Duração: 57 min.