- Há spoilers. Leia, aqui, as críticas dos demais episódios e, aqui, de todo nosso material sobre Star Trek.
O episódio que encerra Star Trek: Lower Decks é tão somente um lembre de que a série simplesmente tinha ainda muito para oferecer aos espectadores, podendo muito facilmente ficar no ar por no mínimo mais duas temporadas, ainda que, pelo seu formato e por ser animação, fosse perfeitamente possível que ela continuasse indefinidamente. Mas não se pode ter tudo na vida e é pelo menos uma felicidade constatar que Mike McMahan, que não exatamente tinha The New Next Generation planejado como o capítulo final, fez da quinta temporada o melhor ano da série e a levou a um término digno que encerra a história macro e funciona como homenagem à franquia como um todo e a Lower Decks em especial, tirando a Cerritos oficialmente do pano de fundo da Frota Estelar e trazendo-a para a frente de combate de forma que ela, como último gesto, possam salvar o universo de seu próprio e caótico jeito.
E caos é a palavra de ordem aqui, algo que uma das marcas da série, mas que não é trabalhado da maneira absolutamente irretocável que pudemos ver no episódio anterior. Fissure Quest foi capaz de introduzir e desenvolver versões novas de personagens clássicos e de lidar com uma narrativa complexa sem qualquer soluço, ainda que, naturalmente, exigindo atenção do espectador e, como às vezes é inevitável, uma boa dose de conhecimento da mitologia da franquia para tudo realmente funcionar como deveria. Em The New Next Generation, o caos não é tratado com a mesma maestria e a missão de fechamento da fissura espacial enviada por William Boimler da Realidade Quântica 582.76 para a realidade da série na esperança de que sua contrapartida original e seus respectivos colegas conseguissem lidar com a ameaça destruidora ganha um componente Klingon que nunca realmente parece encontrar seu ritmo, mais atrapalhando do que oferecendo situações que compensem sua existência (e, por mais divertido que seja aprendermos que os Klingons estranhos de Discovery aparentemente vieram de uma interferência quântica nos Klingons “normais”, isso não é suficiente).
De toda forma, se fizermos esforço para deixar os Klingons de lado, a missão em si funciona bem e a principal razão para isso é que o que vemos acontecer é um verdadeiro esforço coletivos de todos da Cerritos – de oficiais a alferes – para que seja possível atravessar o Campo de Possibilidade Schrödinger (genial, não?) que cerca a fissura, o que significa retrofitar em tempo recordo o escudo da nave com as novas configurações enviadas pela Frota Estelar para evitar que a energia afete os tripulantes, ficando restrita à nave em si que muda constantemente de forma, adotando diversas versões das naves de toda a franquia. É assim que a invencionice doida funciona para, de um lado, criar oportunidades de homenagear Star Trek como um todo e, especialmente na figura de Rutherford, ignorar as diversas e pomposas transformações, algumas delas comemoradas efusivamente, para então deixar evidente que é da Cerritos que eles todos realmente precisam.
Rutherford sacrifica sua “ciborguidade” em prol da Cerritos, Mariner mostra seu pensamento rápido que salva todo mundo, Tendi e T’Lyn entram em absoluta sintonia e, finalmente, Boimler se encontra não ao adotar a persona de sua contrapartida de outra dimensão, mas ao usá-lo como instrumento para seu próprio amadurecimento. E, com isso, todos ali assumem seus mais do que merecidos lugares de destaque na “nova nova geração” que é formada ao final, com Ransom como capitão da Cerritos, Mariner e Boimler como Primeiros Oficiais e assim por diante, valendo destacar, também, a Capitã Carol Freeman assumindo com felicidade o posto que temeu tanto ao descobrir que sua versão extradimensional havia sido exilada para a Base Espacial 80. Ou seja, McMahan referencia a própria mitologia que crio ao longo desses cinco anos para encerrar circularmente sua série, passando o bastão para uma nova configuração do mesmo grupo e criando toda uma força expedicionária para estudar o multiverso a partir da fissura permanentemente aberta, mas contida que passa a fazer parte da realidade deles.
Fica visível o que o showrunner teve que fazer para retrabalhar o episódio de maneira que ele pudesse ter aquele gosto agridoce de encerramento, algo que ele faz por intermédio do discurso altivo de Mariner que deixa evidente que esse final é, na verdade, um começo e que eles ainda têm muitas aventuras pela frente, algo que eu muito sinceramente espero que aconteça em futuro não muito distante, seja na forma de novas temporadas, como aconteceu mais de uma vez com Futurama, seja na forma de longas animados para o streaming na linha do que South Park vem fazendo. Star Trek: Lower Decks, portanto, despede-se com The New Next Generation, mas a série inegavelmente cavou seu espaço no cânone da franquia não só como a melhor da era moderna como uma das melhores de todas as séries do universo Star Trek até agora. Exagero? O tempo dirá, mas tenho para mim que é exatamente isso. Engage the core!
Star Trek: Lower Decks – 5X10: The New Next Generation (EUA, 19 de dezembro de 2024)
Showrunner: Mike McMahan
Direção: Megan Lloyd
Roteiro: Mike McMahan
Elenco (vozes originais): Tawny Newsome, Jack Quaid, Noël Wells, Eugene Cordero, Dawnn Lewis, Jerry O’Connell, Fred Tatasciore, Gillian Vigman, Gabrielle Ruiz, Paul Scheer
Duração: 34 min.