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Crítica | Star Trek: Discovery – 4X02: Anomaly

Lidando com a dor.

por Ritter Fan
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  • Há spoilers. Leiam, aqui, as críticas dos demais episódios da série e, aqui, de todo nosso material sobre Star Trek.

Depois da trágica e inesperada destruição de Kwejian, era mais do que natural que o episódio seguinte tivesse como mote central o processamento da dor sentida por Book e Anomaly faz isso muito bem graças a um belo trabalho dramático de David Ajala, além do raro pareamento de seu personagem com Stamets, que cria uma boa dinâmica para um capítulo que é essencialmente uma daquelas clássicas histórias “de ponte” de Star Trek, ou seja, uma narrativa que ocorre em um lugar só, o coração da nave principal, aqui adicionado, também, da ponte de uma segunda nave – a de Book – que sai para investigar a anomalia magnética do título. Ainda que, no final das contas, não aprendamos muito sobre a tal onda destruidora, a não ser o fato de ela aparentemente mudar de direção ao bel-prazer, o episódio acerta ao não se perder em tramas paralelas, pelo menos não completamente.

Como toda “história de ponte”, o que vemos são eventos celestes que “sacodem” a nave, arremessando os tripulantes para todo canto (estamos mais no futuro do que o futuro normal da franquia e mesmo assim eles ainda não adotaram cintos de segurança, vai entender, he, he, he…), fazem os escudos e o sistema de propulsão – ou qualquer outra coisa – pararem de funcionar, jogam destroços (que sempre parecem pedaços de cimento, outra coisa que nunca entenderei…) por todo canto e assim por diante, ou seja, outra terça-feira na vida de uma nave da Frota Estelar. No entanto, é alvissareiro notar o cuidado do roteiro de Anne Cofell Saunders e Glenise Mullins em trabalhar a tripulação de forma a dar espaço para o maior número possível de pessoas, mesmo que o foco seja naturalmente em Michael, Saru e Tilly. É o caso, por exemplo, do destaque dado a Bryce que voluntaria sua ideia de como “surfar” as ondas da anomalia, algo que é inclusive especificamente festejado por todos depois que a coisa acalma.

E o mesmo vale para a interação de Book com Stamets – ou com o holograma de Stamets – em que os dois “lavam a roupa suja” e aliviam a tensão que existia entre eles, ao mesmo tempo em que Book lida com seu trauma recente em um processo que vai desde a insistência em ele mesmo sair na missão até Michael fazendo-o retornar à realidade quando ele está pronto a se entregar ao inevitável. O roteiro lida com a dor de Book de maneira funcional e não apenas contemplativa, usando-a como gatilho narrativo para a própria missão do episódio, que é recolher dados da anomalia dentro da própria anomalia em mais uma sessão de sacolejos espaciais, só que em menor escala.

O linguajar cheio de tecnobaboseiras foi particularmente rico neste episódio ao ponto de ter o condão de realmente confundir e até alienar um pouco o espectador, já que a ameaça cósmica ainda é muito abstrata demais para que seja possível entendê-la de verdade. Aliás, nesse aspecto, não sei muito bem como a coisa vai andar, mas, mesmo gostando de uma anomalia espacial desse tipo, sem necessariamente um vilão por trás, tenho para mim que ela dificilmente sustentará a narrativa de uma temporada inteira. E, se houver um vilão – ou ao menos uma fonte por trás – para explicar o que está acontecendo e servir de rosto para ser “atacado”, tenho receio que tudo acabe muito parecido com a temporada anterior, que lida, pelo menos em pinceladas amplas, mais ou menos com a mesma coisa. No entanto, ainda é muito cedo para especular.

No lado de alguns membros da tripulação, apesar de achar, como disse na crítica anterior, que Saru não deveria voltar agora para dar mais valor à sua saída, gostei que seu retorno foi pelo menos sem enrolação alguma. Ele apenas apareceu na Discovery, pediu para ser o imediato de Michael e pronto, estamos conversados, sem enrolações. Mas não posso dizer o mesmo  do drama misterioso de Tilly – ela ficou chateada com a presença de Saru? – que a leva a ter uma conversa com Culber, assim como da abordagem do corpo robótico para Grey Tal reencarnar. Achei desnecessário lidar com isso agora, no meio de toda a pancadaria, mesmo com a conexão mais do que direta com a primeira temporada de Picard (ou, melhor dizendo, com uma decisão questionável que foi feita por lá). Esses desvios, que depois desaguam na sucessão de pequenos epílogos, fizeram o episódio perder a força que tinha só lidando com as pontes das duas naves enfrentando as sacudidas geradas pela anomalia.

Seja como for, Discovery continua firme e forte em sua quarta temporada, mesmo que não no nível do episódio de abertura, o que é normal. Ainda há espaço para a anomalia assassina ser mantida como um mistério a ser desvendado, mas esse artifício tem vida curta e precisa de algo mais para realmente continuar funcionando. Ajuda que as interações humanas estão sendo muito bem trabalhadas, mas é bem possível que, muito em breve, a falta de um antagonista mais claro faça falta.

  • Discovery ficou momentaneamente sem lar no Brasil ao ser retirada do Netflix, mas, ao contrário do anunciado, o Paramount+ logo providenciou a exibição da série lançando os dois primeiros episódios de uma vez só e prometendo lançar um a cada semana como nos EUA daqui em diante.

Star Trek: Discovery – 4X02: Anomaly (EUA, 25 de novembro de 2021)
Showrunners: Alex Kurtzman, Michelle Paradise
Direção: Olatunde Osunsanmi
Roteiro: Anne Cofell Saunders, Glenise Mullins
Elenco: Sonequa Martin-Green, Doug Jones, Anthony Rapp, Mary Wiseman, Wilson Cruz, David Ajala, Blu del Barrio, Ian Alexander, Emily Coutts, Oyin Oladejo, Patrick Kwok-Choon, Chelah Horsdal, Oded Fehr, Ronnie Rowe Jr.
Duração: 50 min.

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