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Crítica | Star Trek: Discovery – 3X12: There is a Tide…

por Ritter Fan
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  • Há spoilers. Leiam, aqui, as críticas dos demais episódios da série e, aqui, de todo nosso material sobre Star Trek.

O maior defeito de There is a Tide…, um supreendentemente eficiente episódio que combina de maneira exemplar ação com desenvolvimento narrativo, é que a complexa Osyraa que vemos aqui é muito distante da genérica Osyraa introduzida fisicamente no fraco The Sanctuary. Ou seja, é um problema que deságua neste episódio, mas que não nasceu aqui, mas sim na forma rasteira e atabalhoada com que a supostamente grande líder da Corrente Esmeralda foi apresentada.

Afinal, o que vimos antes foi uma vilã qualquer, absolutamente fungível e completamente esquecível, cuja única qualidade maior é ser vivida por Janet Kidder, sobrinha de Margot Kidder, a Lois Lane dos filmes clássicos do Superman. O que vemos agora é uma ameaça muito mais interessante, com excelentes camadas de profundidade que, porém, não são construídas antes, o que resulta em explicações infinitas em sua negociação com o Almirante Charles Vance. Não que o diálogo entre eles seja ruim, não é isso, mas ele poderia ter sido mais curto e mais direto se Osyraa tivesse ganhado contexto antes como a grande estrategista e negociadora que mostrar ser.

Mas, se esquecermos isso por um momento, é fascinante ver como nossas expectativas são estilhaçadas em There is a Tide…, penúltimo episódio da temporada. Não só a Discovery é capturada como o objetivo de tornar possível o encontro entre líderes, como a argumentação de Osyraa carrega uma lógica inafastável: se a Federação não consegue replicar o motor de esporos (uma novidade, pois, até onde me consta, isso não havia sido afirmado antes) e ele é a única alternativa viável para tornar as viagens interestelares possíveis novamente, uma união com a Corrente e seus cientistas podem democratizar o acesso à tecnologia exclusiva da nave vinda de mil anos no passado. Suas demandas e suas concessões são amplas e a troca de ideias entre Osyraa e Vance é frutífera a ponto de o almirante parecer convencido das vantagens de uma aliança.

Claro que o único ponto de choque e que põe tudo a perder é algo extremamente humano, ou seja, nossa inerente incapacidade de nos responsabilizarmos pelo passado. Osyraa mostra-se disposta a olhar para frente somente, algo que em tese é de fato a melhor maneira de se encarar um acordo entre duas entidades muito diferentes entre si, mas ela se recusa terminantemente a sofrer as consequências pelos terríveis atos que ela pessoalmente cometeu ao longo de décadas, mesmo com a promessa de Vance – que me pareceu realmente genuína – de que ele a defenderia a cada passo de forma a mitigar sua eventual pena. O roteiro de Kenneth Lin, com isso, consegue transformar o que poderia ser um interminável blá, blá, blá em um diálogo construtivo, cheio de substância e que nos faz refletir, volta e meia utilizando-se do alívio cômico que é a onipresença do detector de mentiras holográfico em forma humana.

Enquanto as discussões diplomáticas acontecem, a ação na Discovery não deixa nada a dever aos melhores momentos de pancadaria na série. Começando pela “invasão” de Michael e Book, passando pela rebelião dos prisioneiros liderados por Tilly, continuando com a missão stealth de Michael na nave e culminando com o assassinato a sangue-frio de Ryn por uma Osyraa contrariada depois de não conseguir o que queria, tudo funciona de maneira mais do que eficiente principalmente graças à cuidadosa direção de Jonathan Frakes que retorna à temporada pela terceira vez. A decupagem é sóbria e com uma cadência invejável que distribui corretamente as sequências de ação entre os vários núcleos, abrindo espaço para praticamente todos os personagens, mesmo os figurantes (a cena do Código Morse foi uma sacada muito boa) e sem destacar Michael exacerbadamente, mesmo ela sendo a protagonista.

Mesmo as sequências em que vemos Aurellio (Kenneth Mitchell), o cientista e protegido de Osyraa, conversando com seu prisioneiro Stamets funcionam corretamente, apesar de elas também sofrerem do mesmo tipo de problema que mencionei no começo em relação à vilã. O personagem – que muito claramente trairá Osyraa – foi somente introduzido em There is a Tide…, enquanto que ele, por sua importância aparente para a Corrente Esmeralda como um todo e para Osyraa em particular, deveria ter ganhado destaque antes, juntamente com uma mais eficiente construção da própria vilã. Em outras palavras, mais um problema que não é nativo do episódio, mas sim o legado de escolhas equivocadas dos showrunners que preferiram dedicar um completamente desnecessário episódio duplo a Philippa Georgiou no lugar de nos mostrar mais sobre a organização “de comércio” em questão.

No segundo episódio da trilogia que encerrará a temporada, Star Trek: Discovery mostra que está conseguindo corrigir seu rumo, mesmo sofrendo um pouco pelo desequilíbrio da temporada como um todo. Resta, agora, esperar que o final da temporada venha confirmar essa impressão positiva.

Star Trek: Discovery – 3X12: There is a Tide… (EUA, 31 de dezembro de 2020)
Showrunners: Alex Kurtzman, Michelle Paradise
Direção: Jonathan Frakes
Roteiro: Kenneth Lin
Elenco: Sonequa Martin-Green, Doug Jones, Anthony Rapp, Mary Wiseman, David Ajala, Wilson Cruz, Rachael Ancheril, Michelle Yeoh, Tig Notaro, Emily Coutts, Blu del Barrio, Oded Fehr, Janet Kidder, Noah Averbach-Katz, Kenneth Mitchell, Jake Weber
Duração: 49 min.

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